sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009
Carnaval da desglobalização
Separei para esses dias carnavalescos postagem sobre o texto publicado ontem na The Economist, “Globalisation - Turning their backs on the world”, uma peça rara de alegoria e prestidigitação. Todo o artigo é fundamentado com um único objetivo: provar que a globalização fez bem ao mundo e que, apesar da trapalhada em que mergulhamos, ela continua apontando o melhor caminho. O seu ponto de partido tem mérito altamente discutível (para dizer o mínimo...): “ajudar os países mais pobres a desenvolver-se tem sido um benefício-meta da globalização”. Isso é dito com base nos dados que mostram os países mais pobres, nos últimos anos, crescendo mais rápido do que os mais ricos. “A diferença entre o crescimento real nos mercados emergentes e nos países ricos foi ampliado de zero, em 1991, para cerca de 5 pontos, em 2007 – e, segundo o FMI, deve manter-se em 5,3 pontos em 2008 e 2009”, diz a revista. Ora, para começar, não existe isso de “ajudar” os países mais pobres. Os mais ricos precisavam de novos e melhores mercados, novas fontes de lucros, e a globalização foi a solução. Depois é ridículo apresentar esse recente crescimento maior entre os países mais pobres como um “benefício”. Qualquer crescimento para quem vive abaixo da linha de pobreza torna-se um acontecimento fabuloso, quase miraculoso. A revista conceitua globalização como “a integração global dos movimentos de bens, capital e empregos”. Mostra como cada um desses alicerces foi abalado pela crise atual, mas faz questão de sublinhar que a culpa de tudo está na recessão, não na globalização. Engraçado? Muitíssimo, mas tem sentido. O que se busca com isso é provar que o problema está no neoliberalismo, não na globalização. O que se pretende agora é uma globalização de novo tipo para reoxigenar o capitalismo, ou seja, a Social-Democracia Global (SDG) de que fala Walden Bello, economista filipino, autor de Deglobalisation, Ideas for a New World Economy. “Dada a necessidade de legitimação global para promover seus interesses em um mundo cujo equilíbrio de poder está se deslocando para o Sul, pode ser mais atrativo para as elites ocidentais optar por uma mistura da social-democracia europeia e do liberalismo New Deal que poderíamos chamar de Social-Democracia Global (SDG)”, escreve Walden Bello. Para ele, um dos principais nomes da SDG é o atual primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, que propôs o que chamou de “capitalismo fundado na aliança entre o mercado e as instituições estatais, capaz de reproduzir em escala global o que (para Gordon Brown) teria feito Franklin Delano Roosevelt em escala econômica nacional, a saber: garantir os lucros gerados pelo mercado e, ao mesmo tempo, domar seus excessos”. Walden Bello apresenta alguns destaques das posições defendidas pelos partidários da SDG, entre eles: “a globalização é essencialmente benéfica para o mundo; os neoliberais é que arruinaram a sua gestão, por isso é urgente salvar e resgatar a globalização, arrancando-a das mãos neoliberais” (algo assim). O que podemos concluir desse artigo da revista The Economist (e de outros textos e propostas pululando por aí) é que as chamadas forças progressistas ou de esquerda devem se preparar muito bem para o novo embate pós-crise que começa a desfilar. São as próximas décads que estão em jogo. E não podemos permitir que tudo acabe outra vez em quarta-feira de cinzas... (A imagem acima é uma carnavalização que fiz sobre a excelente ilustração de Claudio Munoz para The Economist)