domingo, 29 de abril de 2012

O marketing da baixaria, um mal sem fim da política




Em 98, logo após a campanha vitoriosa de Garotinho para governador do estado do Rio de Janeiro, escrevi um “Diário de Campanha” (que você pode ler na íntegra, clicando na foto da capa, aqui ao lado), e um de seus capítulos foi sobre “O Marketing da Baixaria”. Meu alvo principal era a campanha do terror que Cesar Maia desenvolveu na época, principalmente contra Brizola e Garotinho. Começo dizendo: “A baixaria, infelizmente, está incorporada às campanhas políticas. De tal maneira, que virou regra”.
Marketing, como diz Al Ries, é guerra de percepções, e o marketing político não é diferente. Talvez até seja mais intenso. O problema é que há uma linha de pensamento entre políticos e marqueteiros políticos que acredita que construir uma percepção negativa do adversário é mais importante do que construir (ou fortalecer) a sua própria imagem positiva. Nessa campanha de 98, foi assim. Cesar Maia tinha grandes realizações para mostrar, sua administração como prefeito era bem avaliada – mas o complexo de escorpião falou mais alto e ele preferiu atacar Brizola e associá-lo com o adversário Garotinho.
“César diz que Brizola criou a Fetranscoca”, noticiava o jornal Extra. Ou “Cesar quer a cabeça de Marcello” (jornal O Dia). Ou “César fará vídeo-denúncia” (JB). Nada disso adiantou. Ou melhor, funcionou ao contrário: Cesar Maia acabou personificando todo o noticiário negativo, sua imagem virou sinônimo de trevas. É verdade que em 92 tinha dado certo. Ele conseguiu associar Benedita aos arrastões que, misteriosamente, surgiram na praia e foram bem documentados. Apropriou-se também de uma história de um filho da Benedita que teria comprado um diploma escolar (só muitos anos depois a Benedita teve conhecimento da história verdadeira e completa). Mas a situação era outra. A campanha petista era extremamente ingênua, ainda despreparada para um enfrentamento mais pesado, e tinha feito a bobagem de levantar a bandeira da honestidade. Lembro até a história de um irmão do Cesar Maia que teria ido à produtora petista disposto a “revelar os podres de Cesar Maia”, mas a Coordenação não achou correto divulgar, porque não existiam provas concretas. Se fosse o contrário, bem provavelmente o depoimento teria ido ao ar, dentro da lógica de que “em campanha política a única coisa que não se pode fazer é perder”.
Quando vejo os ataques de baixo nível que Garotinho faz agora contra o Sérgio Cabral, lembro de todos esses momentos, e me impressiono. Ou talvez nem tanto. Afinal, esse tipo de ataque é típico do desespero. Garotinho e Cesar Maia – hoje, aliados – estão sem alternativas, com imagem em queda, não veem outro caminho que não seja o de desqualificar o principal adversário regional. Procuraram pegar carona no escândalo de Cachoeira (que obviamente deve ser noticiado e investigado) para tentar envolver Sérgio Cabral (de certa forma, até contribuindo para desvio do foco principal) e para isso divulgaram cenas que – independentes do que realmente representam – podem causar grande imagem negativa. O maior prejudicado, no entanto, é o eleitor, que fica perdido nesse tiroteio da guerra de percepções. Talvez seja o caso de recuperar a reportagem da Tribuna de 22 de julho de 1998 que manchetava: “Garotinho pede a César para elevar o nível da campanha”.


Benedita 70

Recebi cópia da carta que Dilma enviou a Benedita, dando parabéns pelo aniversário de 70 anos. "Ela desafiou uma realidade dura e venceu: negra e pobre, enfrentou preconceitos e quebrou todas as barreiras que a vida lhe impôs", diz Dilma. Fico igualmente feliz pelas vitórias de Benedita, e feliz por também ter contribuído para algumas delas. Parabéns, Benedita.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Dessa vez, nem a sogra salvou Dicró


Fiz vários trabalhos com o Dicró, para Sonoleve, Governo do Estado e campanhas políticas. Era realmente uma figura que tinha mil e uma histórias sobre a sogra. Chegava lá na agência e dizia: "Gadelha, você tem que me contratar pra Criação. Sou melhor do que todo esse pessoal que você tem aí. Pode demitir todo mundo que faço o trabalho deles". Sempre bem humorado, alto astral. Tão alto que decolou de vez... Fará falta.
(Se não me engano, a mulher com cara de sogra que aparece no final do comercial estava na praia, viu o Dicró e resolveu participar das filmagens...)

sábado, 7 de abril de 2012

Inflação: o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil?


Na quinta-feira, dia 5, o Prêmio Nobel de Economia Paul Krugman publicou um artigo, Not Enough Inflation (traduzido hoje na Folha com o título de “Mais inflação, por favor”, reproduzido mais abaixo), que certamente deixou nossos analistas econômicos de plantão com o estômago embrulhado. Afinal, ele diz com todas as letras que o Fed (Banco Central de lá) deve “preocupar-se com a oferta de empregos e também com a estabilidade dos preços”. Aliás, vai além: “A direita quer que o Fed se mantenha obsessivo com a inflação, quando a verdade é que estaríamos melhor se, em vez disso, ele se preocupasse mais com o desemprego”. Isso nos lembra muito do desvario que tomou conta de nossos “analistas de mercado” quando o nosso Banco Central, em agosto do ano passado, decidiu reduzir os juros para 12% ano. Foi um Deus nos acuda, todos dizendo que era irresponsabilidade, que a inflação ia voltar, etc, etc. Este Blog fez questão de sair em defesa do Banco Central e esclarecer, como Paul Krugman, que a sua função não se restringe a garantir inflação baixa, de forma submissa ao cassino financeiro. O Banco Central acima de tudo tem que ter responsabilidade social – e às vezes isso pode significar criar estímulos a mais empregos, mesmo que represente inflação. Krugman  reconhece que “uma política mais agressiva para lutar contra o desemprego talvez levasse a inflação acima dos 2%”, mas ressalta que “se a taxa tivesse uma alta maior, para 3% ou 4%, seria terrível? Pelo contrário, iria ajudar a economia”, e se o Fed desistisse de combater o desemprego seria o mesmo que “violar seu próprio estatuto”. Na nossa postagem do dia 2 de setembro passado (A autonomia do Banco Central está em “cheque” ; ver também Paul Krugman e os bancos centrais, do dia 10 de setembro de 2011), igualmente afirmamos que “não existe sistema financeiro forte e eficiente sem princípios sociais”. Será que isso tudo quer dizer, como diria o ministro da ditadura, Juracy Magalhães, que o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil? Nessa questão do papel dos bancos centrais, estamos de acordo. Mas, aqui entre nós, se apesar do desemprego o Fed aumentasse um pouco os seus juros e valorizasse mais o dólar, nossas exportações agradeceriam...
Mais inflação, por favor
Paul Krugman
O Fed tem mandato duplo: se preocupar com a estabilidade dos preços e também os empregos
Há alguns dias, Alan Greenspan, o ex-presidente do Federal Reserve (o banco central americano), fez um discurso em defesa de seu sucessor. Ataques de republicanos a Ben Bernanke, ele disse, são "completamente inapropriados e destrutivos".
Mas por que os ataques são tão devastadores? Afinal de contas, ninguém na América deveria ser imune a críticas, muito menos aqueles -como os diretores do Fed- que têm o poder de fazer nossas vidas melhores ou piores.
Não. O real motivo dos ataques a Bernanke serem tão negativos é que eles são um esforço para induzir o Fed a tomar a decisão errada. Quem critica a política da instituição quer que ela sufoque a recuperação, ao invés de acelerá-la.
A direita quer que o Fed se mantenha obsessivo com a inflação, quando a verdade é que estaríamos melhor se, em vez disso, ele se preocupasse mais com o desemprego.
Na realidade, um pouco mais de inflação não seria uma má ideia.
O Fed tem, segundo a lei, um mandato duplo: preocupar-se com a oferta de empregos e também com a estabilidade dos preços.
E uma política mais agressiva para lutar contra o desemprego talvez levasse a inflação acima dos 2%.
Mas lembre-se das obrigações do Fed: se ele se recusar a aceitar os riscos no campo da inflação, mesmo com a desastrosa performance do emprego, seria o mesmo que violar seu próprio estatuto.
E, mais que isso, se a taxa tivesse uma alta maior, para 3% ou 4%, seria terrível? Pelo contrário, iria ajudar a economia.
A maioria do setor privado continua a ser prejudicada pelo excesso de dívida acumulada durante o período da bolha imobiliária. Esse débito é, sem dúvida, o principal fator a impedi-lo de investir e, por consequência, perpetua a crise.
Uma taxa modesta de inflação poderia, no entanto, reduzir essa ameaça -fazendo com que a dívida assuma seu real valor- e ajudar a promover a melhora de que o setor privado necessita.
Ao mesmo tempo, outras áreas do setor privado acumularam grandes quantias; uma inflação moderada faria esse montante estagnado menos atraente, agindo como um estímulo ao investimento.
Em resumo, longe de temer que medidas contra o desemprego levem a uma escalada da inflação, o Fed deveria desejar essa previsão.
Esse raciocínio me leva de volta às criticas republicanas e seu efeito negativo na política.
Realmente, Bernanke gosta de insistir que ele e seus colegas não são afetados pela política. Mas essa afirmação não é coerente com o comportamento do Fed -ou, às vezes, com a falta de medidas tomadas pela entidade.
Como muitos analistas têm notado, a própria previsão do Fed indica que, enquanto as coisas têm melhorado um pouco, ainda são esperados inflação baixa e desemprego alto nos próximos anos.
A mais recente reunião desse órgão mostrou que o Fed está inclinado a não tomar providências, a não ser esperar que as coisas se direcionem para o pior caminho.
Então, o que está acontecendo? Creio que os membros do Fed, admitam eles ou não, estão se sentindo intimidados -e são os trabalhadores americanos que estão pagando o preço por essa timidez.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Dilma, Ibope e a classe média, segundo Merval


Na sua coluna de hoje no Globo, “Dilma agrega apoios”, Merval Pereira faz uma análise bem correta sobre os resultados da pesquisa CNI/Ibope de ontem, que aponta aprovação de Dilma com 77%, novo recorde. Diz ele que esse Ibope “pode ser explicado por uma conjunção de apoios, pois ela mantém a hegemonia na Região Nordeste (82%) e entre os cidadãos que ganham entre um e dois salários (59%), mas conseguiu ser igualmente bem avaliada entre os eleitores com renda familiar superior a dez salários mínimos (60% de ótimo e bom) e na Região Sudeste (75%) (grifo nosso). Em seguida conclui: “Isso quer dizer que a maneira de governar de Dilma tem agradado à classe média, sem perder o apoio das classes mais populares”.
Perfeito. O que me espanta é a demora que a mídia mais conservadora, bem representada por Merval, teve para compreender isso tudo. O primeiro grande nome da oposição a perceber o que estava ocorrendo foi Fernando Henrique, demonstrando sua preocupação no artigo “O Papel da Oposição”, pré-divulgado no dia 12 de abril do ano passado. Na época, escrevi aqui no Blog (FHC: finalmente o grão-tucano mostra bom-senso), aplaudindo a sua perspicácia: “Isso significará que Fernando Henrique, além de reconhecer as realizações de Lula, já percebeu o estrago que Dilma está fazendo no seu eleitorado preferencial. A capacidade que ela tem tido de agradar a classe média (e a mídia) mostrou-se complementar ao que Lula fez e está deixando a oposição em polvorosa. Fernando Henrique ainda terá a ‘ousadia’ de sugerir que a oposição deve buscar a classe média ‘em lugares onde os partidos praticamente não existem, como as redes sociais da internet’”.  Dois dias depois, quando ele finalmente publicou seu artigo pré-divulgado(!), escrevi (“Povão” ou “Classe Média”: em defesa de Fernando Henrique): “Fora do poder e na entressafra eleitoral, a oposição tucana, de perfil mais elitizado, tem mesmo que tentar se manter forte e unida através do discurso classe média, principalmente diante da 'ameaça Dilma', que conquista brilhantemente largas fatias não só da classe média, como da classe mídia... FHC ainda demonstra mais um momento de lucidez ao aconselhar o partido 'a priorizar as novas classes médias, gente mais jovem e ainda não ligada a partido nenhum e suscetível de ouvir a mensagem da socialdemocracia'”.
No dia 19 de agosto de 2011, escrevi (A herança mal dita de Lula):  "Apesar de toda a campanha contra, Lula conseguiu eleger Dilma para sucedê-lo. Inicialmente, ela era tratada como marionete, burocrata, politicamente despreparada para o cargo. Ninguém foi capaz de dar valor a seu trabalho na Casa Civil, e pré-anunciavam uma administração fracassada. Espertamente, Dilma tratou de passar a mão na cabeça da classe média mal amada – e deu certo. Deu certo até demais".
Em outras palavras: esse Ibope da Dilma já estava previsto antes de sua eleição. Só não viu quem não acreditava no que via.