quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Geopolitik, skitstövel!


Saiu finalmente a decisão sobre os nossos caças. Os suecos com seu Grispen NG (nova Geração) subiram aos céus. Ou melhor, os Estados Unidos e, principalmente, a França conseguiram naufragar. Na época do Governo Lula, a escolha óbvia era comprar da França, apesar do preço mais alto. Cheguei a escrever (Pourquoi “France”? It’s the geopolitics, stupid! , 10 de setembro de 2009) que o acordo Brasil-França não se situa simplesmente nesse terreno do “toma lá, dá cá” do mundo dos negócios. O mundo inteiro movimenta suas peças no novo tabuleiro das disputas energéticas e dessa vez, ao contrário do que ocorreu em outras oportunidades, o Brasil decidiu assumir (e tem condições para isso) papel de peso nesse cenário”. E citando Luiz Alberto Moniz Bandeira em “A importância geopolítica da América do Sul na estratégia dos Estados Unidos”: “uma Segunda Guerra Fria foi deflagrada e envolve a América do Sul, onde a penetração dos Estados Unidos constitui um fator de instabilidade e inquietação”. Ou como diz o Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, o Brasil é o "único rival possível à influência hegemônica dos Estados Unidos" na América do Sul, devido às suas dimensões geográficas, demográficas e econômicas e à sua posição geopolítica e estratégica, ao longo de grande parte do Atlântico Sul, defrontando a África Ocidental. A França significava, naquele momento, a possibilidade de um aliado de peso dentro do jogo geopolítico. Mas a França perdeu prestígio com a crise do Euro e vacilou ao posicionar-se contra o Brasil na eleição do Roberto Azevedo para a OMC. Os Estados Unidos, com uma boa compensação comercial, até poderiam, quem sabe, entrar no páreo. Mas a impossibilidade de transferência de know-how e os grampos da Dilma lançaram definitivamente essa hipótese no vácuo.
Os Grispen suecos, além da maior autonomia no novo cenário geopolítico, parecem que são mesmo os melhores, tecnicamente falando. Sempre foram os preferidos da Aeronáutica. São realmente uma nova geração de caças. Têm um bom preço. E transferem tecnologia. O Brasil finalmente poderá voar mais alto.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Lindberg pisou na estrela




A jogada do candidato a candidato a Governador do Rio pelo PT parecia uma verdadeira pintura. Escalava o Baixinho para Vice, deslocava a equipe petista para fora do campo peemedebista, aproveitava que a torcida organizada anda criticando o desempenho de Cabral, desviava do Pezão – e aí era só correr pro abraço. Para completar a pintura parecia que só faltava convocar os astros do momento, Campos e Marina. Mas esse foi aquele drible a mais, porque não combinou o lance com a principal estrela da equipe. Aí, a bola murchou, a torcida vaiou, o resto da equipe começou a reclamar do estrelismo – e agora o atleta do voto corre o risco de ficar de fora na próxima partida.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Rede de intrigas – afinal, que plano é esse?


Esse Plano de Sustentabilidade de Marina mostrou-se uma sucessão de intrigas e trapalhadas, tornando-se quase insustentável. A jogada final de aliança com o PSB do C foi muito boa, apesar da pressão do desespero. O maior beneficiado, evidentemente, foi Eduardo Campos, que deu um chega pra lá no seu principal adversário (Aécio Neves), ganhou prestígio e melhores condições para atrair o grande capital e a classe média conservadora do Sudeste. Outro que se deu bem foi o PMDB, que ganhou voz mais forte dentro da aliança com o PT. Poderá falar mais grosso tanto na distribuição de ministérios quanto nas disputas regionais. O PSDB, não precisa nem falar, foi o maior prejudicado, caiu de plano e agora corre o sério risco de inviabilizar-se completamente, depois de 2014. Marina, que estava prestes a entrar em 2014 com uma mão na frente e outra atrás, ganhou sobrevida. Firma-se como principal nome da oposição conservadora e poderá até mesmo ser a cabeça da chapa de Campos. Cesar Maia já chegou a dizer que ela seria bom nome para o governo do Rio, mas isso é difícil. As pesquisas vão ajudar a saber se esse será um Plano de C ou um Plano de M.Ainda acho que o Plano D, de Dilma, deve dar certo logo no primeiro turno.

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Pergunta que não quer calar: afinal, qual era o Plano de Syrkis? Por que as cobras e lagartos que andou soltando? Alguém leva a sério os seus disparates? Por mais que o meio político já conheça bem o seu estilo, foram surpreendentes suas declarações sobre Marina. “Populista”, “evangélica de direita”, “caótica”, etc, etc. Mal viu ruírem suas esperanças de candidatura pelo Rede Sustentabilidade, Syrkis saiu atirando no prato que comeu. Pior: no prato que ele ajudou a fazer e do qual era um dos mais fervorosos defensores. A Marina não me agrada, é conservadora, aparentemente bem despreparada para cargo executivo, mas atacá-la como ele fez ficou no plano da traição, apenas uma facada pelas costas.
Mas o Plano de Marina serve principalmente como demonstração da necessidade de uma reforma política séria. Não dá para continuar convivendo com essa enxurrada de partidos frutos do oportunismo e das pinimbas regionais. Ou pior: na maioria das vezes são frutos de jogadas comerciais. Lembro do telefonema que recebi (2004) de um empresário recém-apaixonado por “política eleitoral”. Ele queria saber os preços de veiculação de comerciais nas emissoras de TV do Rio. Dei uma ligeira noção e perguntei o que ele pretendia. Resposta: “É que estou querendo comprar um partido político”. Esse desistiu do “negócio” e da política, mas acredito que a maioria continua negociando partidos para ganhar dinheiro com os tempos de TV e os apoios. Lembro também que há cerca de um ano presenciei por acaso parte de uma reunião onde já se discutia a criação de um partido alternativo para Marina – seria o verdadeiro Plano de M?

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Decisão política infringente


Na última quinta-feira, 10, talvez surpreso com o placar de 4 a 2 favorável à manutenção dos embargos infringentes, o colunista do Globo e imortal da ABL, Merval Pereira, escreveu um artigo com o título de “Decisão política”, que abre assim: “Acusado pelos petistas e por seus seguidores de ter agido como um tribunal de exceção, que teria condenado os mensaleiros em um processo político, o Supremo Tribunal Federal (STF), com sua nova composição, caminha para tomar hoje uma decisão que tem um viés claramente político, mas a favor dos mesmos condenados, pondo assim em xeque a credibilidade da Corte. Grifei esses trechos porque me pareceu haver certa surpresa em Merval com relação a decisões políticas do STF. Antes de tudo, é bom esclarecer que a composição do STF é absolutamente política. Por mais que pesem as qualidades estritamente profissionais/jurídicas de seus ministros, a sua escolha é feita por um Presidente da República que pertence a um partido político e foi eleito pelo povo brasileiro através de voto livre e secreto e é aprovada por um Senado igualmente eleito por voto livre e secreto. O Supremo tem atribuições de tribunal de última instância, mas sua atribuição fundamental é a interpretação e proteção da Constituição – concebida por representantes eleitos pelo povo. Não há motivo para espanto, portanto, com o peso político nas decisões do STF. É claro que isso não significa alinhamento partidário automático (os indicados por presidentes petistas são 8...), mas demonstra que o ambiente político tem grande peso nas decisões supremas. Não existe uma objetividade absoluta, e o resultado parcial de 5 a 5 na questão dos infringentes não deixa dúvidas. Os dois lados já expuseram exaustivamente as suas “razões” e já usaram e abusaram do jogo político (Marco Aurélio esticando sua fala para evitar que Celso de Mello votasse na quinta-feira e ficasse sujeito a mais pressões é um exemplo típico). A decisão final terá uma “razão” unicamente política.  Assim, seja qual for o resultado do desempate da próxima quarta-feira, ele será infringente.

O curioso é que o voto de Minerva ficou a cargo do único ministro que não foi escolhido por um presidente eleito em eleição direta: Celso de Mello foi escolhido por Sarney...
Marco Aurélio foi escolhido por Collor, Gilmar por Fernando Henrique e todos os outros por Lula ou Dilma.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

AS PESQUISAS, SOB A "VISÃO" DE CÉSAR MAIA


No seu Ex-Blog de hoje, César Maia resolve fazer uma análise dos resultados do Datafolha para as eleições presidenciais de 2014. Diz ele: “Este Ex-Blog escolheu entre as alternativas presidenciais oferecidas ao eleitor pelo Datafolha (07-09/08) aquela que num mesmo grupo reúne José Serra e Aécio Neves. Com isso, somados a Marina e Eduardo Campos, formam um grupo que hoje não votaria em Dilma. São 32% em Dilma e 53% nos demais.”
Pretende com isso demonstrar que Dilma perde para a soma dos outros candidatos e que, portanto, não seria reeleita. Na verdade, César Maia erra duas vezes. Primeiro, porque, se a eleição fosse em turno único, hoje Dilma venceria com 32%, contra 23% de Marina, 14% de Serra, 10% de Aécio e 6% de Campos. Como é em dois turnos, o Datafolha obviamente faz a simulação de segundo turno e demonstra claramente a distorção das lentes de César Maia: Dilma 46% X 41% Marina, Dilma 52% X 31% Serra, Dilma 53% X 29% Aécio, Dilma 55% X 23% Eduardo Campos.
César finaliza seu texto com mais uma de suas visões desfocadas: “Dilma manteve-se em 16% na resposta espontânea (...), repetindo a última pesquisa. Isso é um sinal que o crescimento na induzida é mero efeito de superexposição depois do abalo que sofreu pós-manifestações nas ruas”. Pergunto: por que a superexposição não contribuiria na espontânea? Além disso, ele “esqueceu” de dizer que na espontânea Aécio caiu de 4% pra 3%, Marina foi de 2% pra 3%, Serra permaneceu em 2% e Campos foi de 1% pra 0%. Esqueceu o mais importante: Na espontânea, Lula pulou de 6% pra 11%.
César Maia precisa passar por boa re-visão de seus (pré)conceitos...

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Fim de Papo


O Papa é Pop.
O Papa Passou e deixou sua imagem Pop. Pop de Populista. E não está errado, não. Confirmou tudo o que este Blog tem dito: sua viagem teve como objetivo de marketing combater o crescimento dos evangélicos pentecostais, o maior adversário da Igreja Católica por essas bandas. Na sua mensagem aos bispos, ele deixou bem claro que o importante é a conquista da periferia, a luta pelos miseráveis, desesperançados, que se agarram na primeira tábua da salvação que encontram, por mais tosca que pareça. E determinou que os bispos abandonem suas posturas principescas para se contaminarem de povo – exatamente como fazem os pentecostais. É algo que a Igreja Católica já soube fazer muito bem, mas acabou se perdendo no tempo e no espaço. Mesmo a Teoria da Libertação talvez tenha dificuldade para levar avante essa tarefa junto à massa desorganizada, o trapo humano, o lumpen e o quase-lumpen.

As manifestações estão no papo?
No passado, as manifestações garantiram futuro. O povo na rua, o jovem, a sociedade indo à luta por seus anseios e suas necessidades, o desejo de um futuro melhor – tudo isso é motivo de orgulho e motivação para novas e maiores manifestações. Mas o passado recente de nossas manifestações trouxe também um balde de água fria. Foi tudo magnífico até a chegada do vandalismo. Aí virou papo furado, os jovens começaram a debandar e os que ficaram tornaram-se involuntariamente ambiente de segurança indispensável para o vandalismo, a bandidagem. Os vândalos propriamente ditos não passam de meia dúzia de três. Sozinhos, seriam facilmente identificados e neutralizados (aliás, já devem estar identificados). Foram inteligentes ao usar o disfarce proporcionado por reivindicações populares (que muitas vezes eram justas). Souberam concentrar os ataques em dois ou três pontos associados principalmente a momentos ou personagens políticos. Aliaram-se aos chamados Black Blocs. Aproveitaram-se da Copa e até do Papa. Mas, e agora? Os governos sairão da defensiva em que se colocaram por causa dos grandes eventos e terão que reagir, usar a inteligência, identificar todos os vândalos, separar o joio do trigo e garantir o espaço mais do que justo das manifestações autênticas (mesmo que nem sempre seja possível atendê-las inteiramente). Tudo sem paparico. As manifestações terão mais futuro à medida que os vândalos se percam no passado.

Papo eleitoral.
Adoro bola de cristal. Desde que tenham pesquisas por trás, perfis bem definidos, muita informação, histórico bem avançado de todos os atores e cenários – enfim, um papo aqui, papo acolá, e imaginação com pé no chão. Vou usar minha bola de cristal para tentar prever três resultados eleitorais.
  • Dilma (PT) vence, talvez no primeiro turno. Eu me baseio no poder da máquina e na inconsistência dos nomes da oposição. A máquina governamental, bem usada, bem azeitada, é capaz de mover montanhas. E apesar dos pequenos reveses da economia, da relação com os aliados e do clamor das ruas, a máquina federal ainda conta com uma força-reserva monumental, graças à sua política social (isso sem contar a força-Lula...). A oposição, fraca, ajuda muito. Marina (?), até hoje, tem um partido indefinido. Variou da crença evangélica ao PT, passou pelo PV e chega hoje a uma Rede da Solidariedade que ainda não encontrou gancho para se sustentar. Tá difícil. Aécio (PSDB) é o mais frágil dos tucanos. Não tem a antipatia atávica de Serra (PSDB), mas também não tem o mesmo preparo nem o mesmo maquiavelismo. Tem um lado simpático, jovem, moderno, mas pesa contra ele o lado irresponsável, “garotão”. Eduardo Campos (PSB) continua ciscando. Já esteve melhor na fita, mas o Nordeste disse não à sua candidatura. A tendência agora, acredito, é de algum modo apoiar Dilma.
  • Alckmin (PSDB) vence em São Paulo, será reeleito Governador. Apesar de sua política de insegurança assustadora, ainda pode contar com a ação da máquina no Interior. Os petistas Mercadante, Marta e Padilha não avançaram bastante e Haddad até agora não ajudou em nada. Os outros não têm nem papo.
  • Pezão (PMDB) vence no Rio, passará de Vice para Governador. Talvez seja a previsão mais polêmica, mas é bom lembrar que, hoje, os principais nomes (além do Pezão, temos Lindberg, do PT, talvez Garotinho, do PR, e Cesar Maia, do DEM) estão praticamente em empate técnico, com a vantagem para Pezão de ser o menos conhecido e de poder contar com a máquina estadual e a com a política de segurança que mais deu certo até agora. Não estou contando ainda com Miro Teixeira, do PDT, porque não levo muita fé na sua candidatura. Também não considero que Freixo, do PSOL, corra o risco de se candidatar agora. Nem acho que os tucanos tenham algum nome viável. Pezão conta também com a alta rejeição dos outros três e não se contamina com a rejeição (talvez temporária) de Sérgio Cabral. Seu estilo pé no chão, realizador, alheio aos holofotes passou a ser grande virtude para o momento. O PT ainda vive a dúvida de apoiar ou não apoiar a candidatura peemedebista, porque pensa no fortalecimento da aliança nacional. Mas é difícil frear a ânsia do petismo local para tentar a sorte com um nome eleitoralmente melhor, por isso é quase irreversível a candidatura de Lindberg. Aliás, em 2006, isso já aconteceu, e o PT, com Vladimir, teve 7,7% dos votos contra 41, 4% de Sérgio Cabral. No dia seguinte, o grupo de Cabral reuniu-se para discutir se apoiaria Lula ou Alckmin. Foi coisa rápida. Cabral e Pezão apoiavam Lula e logo telefonaram para comunicar a decisão. Se Lindberg for mesmo candidato, certamente terá mais votos do que Vladimir - mas apenas isso.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

"Bem-aventurados vós, os marqueteiros, porque vós sois a recuperação da Igreja Católica"


Não quero luxo nem lixo
Meu sonho é ser imortal 

(Rita Lee / Roberto de Carvalho)

Faz pouco mais de quatro meses que Francisco foi escolhido Papa. Sua entronização foi no dia 17 de março e no mesmo dia fiz um post sobre esse grande acontecimento. Escrevi que por trás dessa escolha, um Papa sul-americano, estava “a luta contra o avanço dos evangélicos, basicamente os pentecostais e neopentecostais” que, “com uma estratégia de marketing bem mais agressiva”, arrebanhavam “fatias cada vez mais expressivas das estatísticas católicas (principalmente nas áreas urbanas, com suas franjas lumpen)”. Parecia que um cabôco divinhadô tinha baixado em mim. De lá pra cá o Papa Francisco, franciscano por natureza, não fez outra coisa a não ser revolucionar o marketing católico. Sua linguagem mais direta, popular, tem agradado a todos. Foi para o corpo a corpo com os fiéis, eliminou as mordomias e simplificou as vestes, ignorou os luxos paroquiais, o papa-móvel blindado  e inflamou a juventude católica. Sua vinda ao Brasil encaixa-se perfeitamente nessa estratégia de marketing de combate aos evangélicos (pentecostais e neopentecostais) usando um contato mais direto com as faixas mais pobres, com o objetivo de recuperar os fiéis perdidos. A situação católica atingiu níveis críticos, como comprova a pesquisa Datafolha publicada ontem. Segundo o Censo 2010 (que reproduzi no meu post), o Brasil (o maior país católico do mundo) ainda contava com 64,6% de católicos. Hoje, segundo a pesquisa, são apenas 57% (eram 83% em 91!). Perderam espaço exatamente para os evangélicos pentecostais e neopentecostais, que eram 5,6% em 91, 13,3% em 2000 e agora aparecem com 19%. A disputa deve se acirrar, inclusive (ou principalmente) na área política. A lógica da Teologia da Libertação deve voltar a crescer, a luta pelo poder será intensa. Quem viver rezará.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Virou zona, acabou


O movimento dos 20 centavos parece chegar ao final. Exatamente ontem, quando colocou nas ruas um número fenomenal de simpatizantes, deu sinais de que está nos estertores. O jovem que estava pondo pra fora o seu grito de rebeldia e exibia a proposta de um mundo renovado, percebido através das redes sociais, parece chegar ao seu limite. O vandalismo falou mais forte, tomou conta das ruas. Os jovens estão intimidados, mas não estão derrotados. Lançaram um alerta fundamental: as transformações têm que avançar. O Governo tem que abrir o olho e evitar com todas as forças o lenga-lenga das relações políticas do atraso. O governo perdeu muito. Mas a oposição e a mídia perderam mais. Apostaram na derrota do Governo Dilma e do PT. Mas também foram surpreendidos pelos vândalos e amarelaram. Os tucanos acreditaram ter chegado a vez de ganhar votos, mas ficaram acuados. O não-partido de Marina, que poderia ter sido o maior dos beneficiários, encolheu. O PT, que tinha muitos dos seus quadros acomodados nas poltronas do poder, percebeu que precisa de sangue novo. Não pode apenas se vangloriar com o que fez – tem que fazer mais. E os nossos jovens, eternos guardiães da ousadia, podem estar aprendendo a mais importante das lições: onde não há organização não há vida. Acabou chorare. Mas não acabou a força desse novo tempo.

terça-feira, 18 de junho de 2013

As ruas pedem passagem


O Toledo, grande figura, publicitário da MPM, contava que lá pela década de 50 ou 60, não lembro, o Partido decidia, por exemplo, fazer uma ação junto aos bondes. Eles chegavam lá na Marechal Floriano (Rio), subiam em um dos bondes, afastavam o motorneiro, assumiam o comando e iniciavam um discurso para os passageiros. Logo, logo, a gente notava - dizia Toledo - que os “passageiros” eram na quase totalidade companheiros do Partido... Era um daqueles momentos em que o “subjetivo” não sintonizava com as “condições objetivas”. Mesmo assim, ações como essa eram importantíssimas na formação política dos jovens. Essas manifestações de rua fortaleceram o movimento estudantil, contribuíram para elevar o nível de consciência da população e foram fundamentais para a resistência à ditadura. Participei da primeira manifestação de rua depois da consolidação da ditadura militar, em 65, contra a invasão de Santo Domingo. Mais tarde, no meu primeiro dia de Faculdade (FNFi, no Rio), o nosso “trote”, digamos assim, foi de protestos, polícia, pancadaria, gás lacrimogêneo. A resistência democrática apanhou, foi torturada, mas o Brasil venceu.
O PT nasceu com o apoio das ruas. Com um ingrediente a mais, fundamental – a organização operária do ABC paulista. O PT soube unir nas suas manifestações de rua a classe operária e a classe média democrática, a sua receita para chegar ao poder. E ao chegar ao poder conseguiu imprimir um avanço social impensável 10 anos atrás. O PT sabe como nenhum outro partido sentir o cheiro das ruas. Mas, no poder, qualquer um corre o risco do “efeito vitrine”, por melhor que seja. E o “faro” fica prejudicado pela realidade de um ambiente político ainda tão atrasado. O Governo do PT, um partido de rua e de luta, demorou a perceber a importância que um apelo de 20 centavos pode ter. Claro que nessas manifestações tem muitos oportunistas, provocadores, aproveitadores da oposição conservadora, vândalos, e coisas assim. Mas há também uma nova geração que está às margens do mundo político e que quer se manifestar. São jovens que não conhecem as ruas como os mais velhos conheceram, mas que são habitués das amplas avenidas da internet – ou, como diz Paul Virilio (“Velocidade e Política”), das autoestradas informacionais e cibernéticas.
Não foram apenas os tempos que mudaram – o tempo mudou. Estar antenado é estar no mínimo nessa nova velocidade. O Governo do PT (o partido melhor preparado para conduzir o país) precisa se antenar ainda mais. Precisa desse novo modo de pensar para poder mudar a política, fortalecer a democracia e avançar nas conquistas sociais. Não podemos correr o risco de outra marcha à ré. Ou de perder tempo por causa de um sinal fechado. O tempo “ruge”. As novas ruas avançam.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

César Maia e o boato do Bolsa Família



Muito bom o texto de César Maia no seu Ex-Blog de hoje sobre o Boato do Bolsa Família. Como bom tardeano, ele fala com propriedade do fluxo que nessa semana passada apavorou a população beneficiária desse importante programa social. Só não concordo muito quando ele diz que esse "é um caso que mostra que aqueles que imaginavam que a mobilização via redes (indignados...) era uma exclusividade da classe média veem agora que não". Acho que ele esqueceu da campanha da Marina em 2010, que deu um show de Orkut com grande sucesso na classe C, basicamente entre os evangélicos. Diz Caio Túlio Costa em seu artigo O Papel da Internet na Conquista dos Votos de Marina Silva: "a atuação de Marina Silva na internet representou o maior diferencial na campanha presidencial". Mais adiante: "Examinando melhor essa audiência, percebia-se que o Orkut tinha uma grande quantidade de integrantes da chamada classe C – emergente – muito maior que qualquer outra rede social. Marina Silva sempre apostou muito na comunidade evangélica, da qual faz parte. Definiu-se então que o Orkut seria usado para levar a mensagem da candidata aos evangélicos. A principal comunidade de Marina Silva no Orkut registrou 58.859 integrantes até setembro. Se multiplicarmos por 231, que é a quantidade média de amigos que os brasileiros têm no Orkut, isso dá 13,6 milhões de pessoas".
Veja o texto de César Maia.

BRASIL: O PRIMEIRO CASO DE FORTE MULTIPLICADOR E MOBILIZAÇÃO PELAS REDES SOCIAIS!

1. O pânico e a mobilização relativos ao caso Bolsa Família/CEF, além de serem investigados pela Polícia Federal, para identificar eventual promotor, devem estimular pesquisadores de opinião pública a estudar o processo que levou a mensagens –provavelmente deflagradas para smartphones- terem produzido essa enorme mobilização.
2. Se foi assim, esse é o primeiro caso no Brasil de um multiplicador via redes sociais ter produzido tamanho efeito. Um caso novo (talvez no mundo), pois o público atingido de baixa renda não é o característico das redes sociais. Em outros casos, como na África do Norte, na Europa e EUA, a dinâmica desses processos se deu em torno da classe média.
3. O fato de a CEF ter liberado pagamento de bolsa família de dois meses, com um mês adiantado, certamente deu credibilidade à onda que veio logo em seguida, pois mudou a regra do jogo. Dessa forma, se teve dois tipos de multiplicador: um vertical e outro horizontal. O vertical seria a distribuição de mensagens a partir de pontos via –imagina-se- telemarketing. Provavelmente esta distribuição só ocorreu porque teve como lastro o adiantamento pela CEF no dia anterior, dando credibilidade ao início da onda.
4. O multiplicador horizontal é o que deve despertar o maior foco dos pesquisadores. Uma vez deflagrado o processo verticalmente –e dado que o uso de smartphones, incluindo, claro, os celulares mais simples, que são de uso generalizado no Brasil- os pontos alcançados se encarregaram de multiplicar solidariamente para seus pares cadastrados no bolsa-família. Como o bolsa-família tem concentração espacial entre comunidades de baixa renda, da mesma forma, o boca a boca, aumentou o multiplicador.
5. O notável é o fato da onda, via redes, ter chegado em 24 horas a 13 Estados e centenas e centenas de municípios, sem quaisquer proximidades com as fontes de deflagração, e atingido à população de baixa renda. Esse é um caso que mostra que aqueles que imaginavam que a mobilização via redes (indignados...) era uma exclusividade da classe média veem agora que não.
6. Claro que os assuntos deflagradores podem não ser os mesmos, mas o meio sim. Em nível político essa é uma informação importante. Os setores de baixa renda são também alcançáveis pelas redes sociais, só que por assuntos específicos e meios de amplo uso.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Boato, uma ciência política



No livro “Política é Ciência”, de César Maia, podemos ler esse seu depoimento sobre um diálogo com seu assessor durante a campanha de 96, quando ele apoiava Conde contra Sérgio Cabral para Prefeito do Rio: “Pega o celular, liga para o fulano, manda colocar umas 150 pessoas em botequins tomando cafezinho e dizendo: ‘Eu soube que o Sérgio Cabral vai renunciar. Diz esta frase que é boa’. Dali a três dias alguém veio me dizer: ‘O Serginho vai renunciar...’” Em seguida o jornalista Luís Erlanger comenta: “É o princípio do boato”. E César acrescenta: “Os fluxos tardeanos não são nada mais do que o boato ou a verdade. Vai contaminando”. O rodapé do livro, que foi lançado em 98, faz questão de explicar: “Fluxo tardeano é um conceito sobre a formação da opinião pública, desenvolvido pelo filósofo francês Gabriel Tarde, no início do século”.
Isso tudo é verdade. Esses fluxos de que tanto fala César Maia fazem parte da vida política, sejam boateiros ou verdadeiros. Por isso, não me venha a oposição fazer ar de surpresa ou de indignação, porque esse boato recente envolvendo o Programa Bolsa Família é obviamente uma peça oposicionista, mesmo que tenha surgido espontaneamente (coisa que duvido muito). Por isso, acredito que a Maria do Rosário tenha agido com precisão ao denunciar esse “partido”, o CNO, que tem atuado com força nos períodos pré-eleitorais. O CNO (Central de Notícias da Oposição) é o “partido” que mais cresce nesse período e é importante que se esteja atento contra suas investidas. Chiliques à parte, infelizmente é assim que a coisa funciona. Cientificamente...

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Avanço geopolítico: Brasil expande ação naval na África


O site da BBC trouxe ontem uma reportagem bem interessante sobre o investimento da Marinha brasileira em capacidade de patrulhamento e na expansão de suas operações do outro lado do oceano, em águas africanas. A reportagem frisa que o objetivo “é proteger riquezas marítimas como as reservas do pré-sal e combater crescentes ameaças de pirataria e narcotráfico no Atlântico Sul”. E acrescenta que “as ações ocorrem ainda num contexto em que forças americanas, britânicas e francesas demonstram crescente interesse pelo Atlântico Sul”. Em um post que fiz em 2009 sobre geopolítica (Pourquoi “France”? It’s the geopolitics, stupid!), destaquei que “com a descoberta do pré-sal em nossas águas, veio à tona outro fantasma, a Quarta Frota Americana, que voltaria a circular por nossa costa. Alguns dizem que foi apenas coincidência, mas é difícil acreditar. Seja como for, o importante é compreender que o Brasil não pode se acomodar em um papel secundário no jogo de forças que se está montando”.
O Brasil tem duas grandes fronteiras que precisam ser permanentemente protegidas por serem alvos de crescente cobiça internacional, a “Amazônia verde” de um lado e a “Amazônia azul" do outro. Leia aqui a reportagem da BBC e, se tiver meia hora sobrando, recomenda a entrevista do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães feita em 2009, que encontrei divida em três partes: primeira, segunda e terceira.

terça-feira, 7 de maio de 2013

Os limites de poder dos Três Poderes



Virou moda endeusar o Judiciário, de forma insistente, como se ele devesse se transformar em poder absoluto no Brasil. Isso não é gratuito, faz parte de uma luta política intensa onde os grupos derrotados procuram reequilibrar o jogo a partir da redistribuição de poder entre os Três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas esse tipo de visão é antidemocrático, rompe um equilíbrio fundamental. As críticas devem ser feitas, sim, a qualquer um dos Poderes, sem que isso nem de longe signifique substituir um pelo outro. Como escreve Luiz Carlos Bresser-Pereira, em seu artigo de ontem, na Folha, “As democracias se caracterizam pelo equilíbrio de Poderes, mas isso não significa que os três tenham a mesma importância. O Legislativo é o Poder democrático por excelência, e cabe a ele a palavra final em todas as questões, através das emendas. Entretanto, o que vemos no Brasil é o Judiciário - Poder burocrático por excelência - tentar assumir essa posição, o que é inaceitável do ponto de vista da democracia” (ver texto completo logo abaixo). O pior é que o chamado “quarto poder”, a mídia, costuma entrar pesado nesse jogo e, em nome da defesa da democracia, agride todos os princípios democráticos. Que o nosso Legislativo é muito fraco, ninguém duvida. Que a corrupção frequentemente ameaça transformar nossos Poderes em “podreres”, também ninguém duvida - mas, infelizmente, não conheço nenhuma democracia representativa que tenha resolvido esse problema. O que não podermos é “salvar” a democracia virando-a pelo avesso. Ao STF, por exemplo, cabe basicamente interpretar a Constituição, que foi feita pelo Legislativo (no nosso caso, uma Assembleia Constituinte eleita pelo povo brasileiro) e que deve ser cumprida e garantida pelo Executivo. Um ministro do Supremo não pode transbordar seus poderes como um golpista qualquer. Não é assim, atropelando a democracia, que se pode, digamos, melhorar um Legislativo trôpego. Todo poder tem seu limite.

Qual Poder é preciso defender?
Luiz Carlos Bresser-Pereira

As democracias se caracterizam pelo equilíbrio de Poderes, mas isso não significa que os três tenham a mesma importância. O Legislativo é o Poder democrático por excelência, e cabe a ele a palavra final em todas as questões, através das emendas. Entretanto, o que vemos no Brasil é o Judiciário - Poder burocrático por excelência - tentar assumir essa posição, o que é inaceitável do ponto de vista da democracia.
O equilíbrio de Poderes, ou "checks and balances", é a tese através da qual filósofos liberais do século 18 buscaram limitar o Executivo, o monarca absoluto. Mas, além disso, é uma tese que visou limitar o Parlamento - reflexo da oposição do liberalismo à democracia no século 19 a partir do argumento de evitar a "ditadura da maioria".
Há tempos esse argumento, que servia para a burguesia rejeitar o sufrágio universal, mostrou-se equivocado. A maioria alcançada em alguns momentos por sociais-democratas que representavam os trabalhadores jamais buscou exercer a ditadura quando ganhou eleições.
Mas o medo da democracia continua a assombrar liberais, que, apesar da crítica ao Estado e à sua burocracia, sempre buscam transferir poderes; do Executivo para agências burocráticas supostamente "independentes"; e do Legislativo para o Supremo Tribunal Federal.
Ao julgar a constitucionalidade das leis e interpretar os dispositivos da Constituição que não são claros, o Poder Judiciário exerce um papel que lhe é próprio. Mas o que estamos vendo é algum dos ministros usarem o "clima favorável" criado por um liberalismo antidemocrático ainda dominante para se impor sobre o Parlamento. Vimos dois movimentos recentes nessa direção.
Primeiro, o Supremo não hesitou em interferir na ordem em que os projetos de lei são votados, exigindo que venham primeiro as medidas provisórias. Agora, um ministro concedeu liminar para impedir que continue a ser discutido no Senado projeto de lei que inibe a criação de partidos políticos. Usou como justificativa o fato de que o projeto estaria sendo aprovado "de afogadilho".
O Brasil tem um bom Judiciário, um Poder meritocrático formado por magistrados de elite. Já o Congresso está permanentemente nas manchetes, porque é constituído de um número grande e heterogêneo de parlamentares e reflete qualidades e defeitos da sociedade brasileira.
Mas não é razoável que, por essa diferença de constituição, a sociedade se deixe convencer por um liberalismo que manifesta preferência pelo Poder Judiciário e desgosto com a política e a democracia.
O Congresso aprovou na Comissão de Justiça da Câmara emenda constitucional que exige maioria de quatro quintos para o Supremo declarar leis inconstitucionais - algo discutível, mas razoável. Creio ser justo que esteja clara para o Supremo a inconstitucionalidade de uma lei já duramente discutida.
Receio que alguns ministros do Supremo estejam se inspirando na Suprema Corte dos Estados Unidos, mas lá seus membros não têm alternativa, já que a Constituição se tornou uma espécie de tabu, e o Congresso perdeu capacidade prática de emendá-la. No Brasil não é assim. Devemos saudar as tentativas para contornar a crise entre os dois Poderes, mas sem perder de vista que, se há um que precisa ser defendido (e sempre criticado), este é o Legislativo. Os outros dois não estão ameaçados.


Luiz Carlos Bresser-Pereira é professor emérito da Fundação Getúlio Vargas, onde ensina economia, teoria política e teoria social. É presidente do Centro de Economia Política e editor da "Revista de Economia Política" desde 2001. Foi ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia (governos FHC).

Israel – arma de destruição em massa?


O recente ataque de Israel à Síria me parece que vai além do bloqueio a envios de armas para o Hesbolá, a milícia xiita-libanesa, de 2 mil a 4 mil homens, que em 2006 deu um chega pra lá no exército israelense (Leia O mundo se surpreende com a organização do Hesbolá na guerra contra Israel). Israel, se quisesse, poderia ter feito esse ataque há mais tempo, mas não gostaria de mexer em vespeiro. Talvez o papel de Israel seja o de estimular pretextos para uma intervenção internacional na Síria. Equivalente ao pretexto das armas de destruição em massa que Bush usou para invadir o Iraque. Xiitas, alauítas, sunitas e laicos da Síria que se preparem: podem estar chegando os boinas de todas as cores – talvez até mesmo os da Rússia. Quem sobreviver verá?

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Ex-ministra americana acha que Suprema Corte errou na decisão sobre as eleições de 2000


Declaração da aposentada da Suprema Corte da Justiça Sandra Day O’Connor sobre a decisão tomada a favor da legalidade dos votos da Flórida que decidiram a eleição de Bush contra Al Gore, em 2000: “Talvez a gente devesse ter dito ‘Estamos fora, e tchau’. As autoridades da Flórida não fizeram um bom trabalho e meio que bagunçaram tudo” (“Maybe the court should have said, ‘We’re not going to take it, goodbye’. It turned out the election authorities in Florida hadn’t done a real good job there and kind of messed it up.”). Essa declaração foi feita ao Chicago Tribune e reproduzida pelo Washington Post. É bom lembrar que a decisão a favor de Bush no Supremo foi apertada, 5x4. Tudo girava em torno das recontagens de votos, que acabou sendo feita em uma parcela reduzida das cédulas. (Parece que o que é bom para os Estados Unidos não é bom para a Venezuela. Apesar disso, Chávez reconheceu o governo Bush...)
Talvez fosse o caso do nosso STF escutar Sandra Day O’Connor, antes de tomar suas decisões tão discutíveis.

Capriles virou chavista?


Interessante esse artigo de Rubens Ricupero hoje na Folha. Fala da importância eleitoral que têm as conquistas sociais na América Latina de hoje e dá uma informação muito boa: o oposicionista Capriles, na Venezuela, cresceu nas pesquisas depois de adotar o discurso chavista.
Mudar mas não tanto
Rubens Ricupero
O vencedor da eleição para suceder a Hugo Chávez foi o próprio Hugo Chávez, conforme observou um analista americano. Isto é, não só a apertada vitória de Maduro se deve ao voto de simpatia decorrente da morte do líder venezuelano. Também no sentido de que a campanha do opositor Capriles foi em boa parte pautada pela agenda chavista.
Capriles deu à sua equipe o nome de Simon Bolívar, enxertou em seus discursos frases e símbolos chavistas, declarou que seu modelo é o presidente Lula! Mais importante, prometeu manter todas as missões sociais de Chávez (30 e tantas) e acrescentar outras, anunciou aumentos significativos para salários e aposentadorias. Estreitou assim de dez pontos para menos de dois a margem de derrota em relação a outubro de 2012.
Esses fatos geralmente ignorados na maioria dos relatos jornalísticos sugerem que, em países pobres e marcados por desigualdade, o eleitor tende a conservar as conquistas sociais e limita o desejo de mudança à margem: corrigir excessos, retificar desvios.
Isso vale até para a Argentina. Lá, segundo me dizem, aspira-se por uma espécie de Cristina Kirchner melhorada, sem a corrupção e o espírito de "vendetta". No caso argentino, haveria razão adicional. O profundo trauma de 2001 vacinou os argentinos contra as soluções extremas como a convertibilidade de Cavallo-Menem. Ninguém crê que tenha chance uma plataforma de negação total e mudança radical, um "tiro para matar o tigre" como o confisco da poupança de Collor. As pessoas querem melhorar, mas devagar, sem balançar o coreto.
Se isso ocorre em dois países nos quais o agravamento da crise econômica e política já leva milhares de pessoas às ruas, o que dizer do Brasil, onde o processo de desgaste é mais recente e a sensação de bem-estar prevalece para a maioria? Aqui também tudo indica que o apetite por mudança não ultrapassa a proposta expressa na sentença "é possível fazer mais".
Terá sido muito diferente o espírito da "Carta ao Povo Brasileiro" de 2002 e a campanha vitoriosa de Lula em garantir que os contratos seriam honrados e a estabilidade preservada?
Na América Latina, os governos de desempenho econômico melhor que o social e sem reeleição (Peru, Chile, México) têm sido derrotados pelos opositores, que conservam, no entanto, a orientação econômica. Já os sociais e desastrados economicamente (Chávez, os Kirchner) ganham as eleições, mas aprofundam as políticas econômicas disfuncionais. Dessa maneira, o êxito eleitoral acaba sendo em longo prazo o bilhete para o desastre definitivo.
O Brasil se parece cada vez mais à Venezuela e à Argentina. A afirmação choca porque estamos longe de falsificar a inflação ou perseguir a imprensa. Contudo, nos indicadores econômicos básicos --inflação e, sobretudo, acelerada deterioração das contas externas e da dívida bruta-- vamos pelo mesmo caminho.
O atraso na crise e a demora na percepção pública favorecem as chances eleitorais do governo. A dúvida maior, portanto, é se após 2014 o país mudará para sustentar as conquistas sociais ou arriscará perder mais uma década de crescimento.

domingo, 28 de abril de 2013

EUROPA CONTRA A TROIKA!



Os ativistas do movimento europeu Que se Lixe a Troika (criado há um ano em Portugal) decidiram mobilizar o continente contra a política de austeridade imposta pelo capital financeiro através da troika composta pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), BCE (Banco Central Europeu) e CE (Comunidade Europeia). Reunidos esta semana em Lisboa, escolheram a data de 1º de junho para mobilização em todas as ruas de todas as cidades de todos os países. Vejam o manifesto na íntegra (copiado do Correio do Brasil, com pequenas adaptações para o português brasileiro):

A Europa está sob violento ataque do capital financeiro que se faz representar pela troika (FMI, BCE, CE) e pelos sucessivos governos que aplicam as políticas concertadas com essas entidades desprezando as pessoas. Sabemos que essa ofensiva aposta em vergar os povos, tornando-os escravos da dívida e da austeridade. Atravessa a Europa e também deve ser derrotada pela luta internacional.
Cada um de nós, em cada país, em cada cidade, em cada casa, com as suas especificidades, sente na pele as medidas que aniquilam direitos conquistados ao longo de décadas, medidas que agravam o desemprego, que privatizam tudo o que possa ser rentável e condicionam a soberania dos países sob a propaganda da “ajuda externa”. É urgente que unamos as nossas forças para melhor combatermos esse ataque.
O apelo que lançamos para uma manifestação internacional descentralizada circulou entre dezenas de movimentos na Espanha, França, Itália, Grécia, Chipre, Irlanda, Inglaterra, Escócia, Alemanha, Eslovênia… Na reunião de ontem, 26 de Abril, em Lisboa, estiveram presentes companheiros e companheiras de vários países da Europa, que discutiram em conjunto essa proposta.
Assim, chegamos ao consenso, a nível internacional, de que sairemos à rua no próximo dia 1º de junho: POVOS UNIDOS CONTRA A TROIKA!
Este é o início de um processo que se quer descentralizado, inclusivo e participante. Queremos construí-lo coletivamente, juntando as nossas forças. A partir de hoje a data de 1º de Junho será divulgada em escala europeia e todos e todas estão convidados a juntarem-se num protesto internacional contra a troika e contra a austeridade… a favor de que sejam os povos a decidirem as suas vidas.
Apelamos a todos os cidadãos e cidadãs, com e sem partido, com e sem emprego, com e sem esperança, apelamos a que se juntem a nós. A todas as organizações políticas, movimentos cívicos, sindicatos, partidos, coletividades, grupos informais, apelamos a que se juntem a nós.
Queremos continuar a alargar os nossos contatos tanto nacionais como internacionais, porque estamos conscientes de que será o somatório das nossas vozes que poderá travar a nova onda de austeridade que está sendo preparada. Os povos da Europa têm demonstrado em vários momentos que não estão disponíveis para mais sacrifícios em nome de um futuro que nunca chegará. Por isso pensamos que é chegada a hora de uma grande demonstração da capacidade desses povos de se coordenarem na luta e na recusa dessas políticas.
De Norte a Sul da Europa, tomemos as ruas contra a austeridade!

Movimento QUE SE LIXE A TROIKA

sexta-feira, 26 de abril de 2013

No programa eleitoral do Eduardo Campos o pior foi o Eduardo Campos

Contradições do discurso pessebista apontadas pela Folha (clique na imagem para ampliar)

Interessante esse programa do Eduardo Campos veiculado ontem em cadeia nacional. Interessante em primeiro lugar pelo desequilíbrio. A produção, por exemplo, está bem correta, mas às vezes faz umas imagens ridículas, como uns closes do nariz do Eduardo Campos, usados obviamente para edição de falas.
A conceituação é bem esperta. Começa, corretamente, dirigindo-se à classe média, digamos, mais festiva, lembrando a união da sociedade contra a ditadura – e o PSB procura se denominar como “herdeiros da esquerda democrática”. Mais adiante, o programa muda o foco, passa a dirigir-se, mais espertamente ainda, à nova classe média (daí o slogan “passo adiante”). Aqui mostra que seguiu o conselho de Fernando Henrique dado em abril de 2011 ao próprio partido, ainda sob o impacto da derrota diante de Dilma, para “priorizar as novas classes médias, gente mais jovem e ainda não ligada a partido nenhum e suscetível de ouvir a mensagem da socialdemocracia”.  Nessa época, comentei aqui esse artigo de FHC (O Papel da Oposição): “Ele está apostando nas parcelas da nova classe média que vão procurar se adequar a novos valores, esquecer que um dia já foram povão”.
O programa tem algumas barbaridades, como a fala de Rollemberg, que procura assumir os louros da conquista dos trabalhadores e trabalhadoras domésticas – uma proposta da deputada petista Benedita da Silva. Ou ainda as várias contradições, como as apontadas pela Folha: critica a política federal para a educação, mas no governo de Eduardo Campos a rede escolar estadual tem avaliações inferiores à da média nacional; o PSB se diz defensor de alianças, mas em 2012 rompeu aliança com o PT para lançar candidato próprio à prefeitura de Recife; é contra o nepotismo, mas o governo pernambucano conta com parentes do governador.  E por aí vai. Mas o que mais me surpreendeu negativamente foi o desempenho de Eduardo Campos. Na verdade, já tinha notado que ele é fraco, mas que isso poderia ser corrigido. Não foi, e ele ficou horrível. Não passa verdade na sua cara. Tem sempre um sorriso falso estampado, olhos meio esbugalhados, um conjunto nada convincente. Acentua algumas frases, com um desenho esquisito da boca. O Aécio, por exemplo, nessas inserções recentes, apareceu muito melhor que ele. Gostei da sua frase final: “É hora de fazer o Brasil crescer para, juntos, ganharmos 2013”. Além de servir para driblar a lei eleitoral, ela traz uma verdade para o próprio PSB: aliado de Dilma, obviamente ganha 2013; separado, vai perder feio em 2014.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

O homem de uma cara




Ninguém se iluda: Eduardo Campos não tem duas caras. Tem uma cara só – da oposição, cada vez mais conservadora. Esse papo de “base aliada crítica” é puro oportunismo. Oportunismo bem feito, diga-se de passagem. Quer fazer oposição sem perder as benesses do poder. Quer mostrar para o “mercado” e para a classe média conservadora do “sul maravilha” que bate no governo Dilma, ao mesmo tempo em que tenta vender ao povo nordestino a imagem de que sempre esteve ao lado de Lula. Tentar mostrar duas caras é o melhor que pode fazer para crescer nas pesquisas. Mas a verdade é que essa moeda tem uma face só – e isso o povo inteiro já sabe.
Mais um bom artigo de Janio de Freitas, hoje, na Folha.

ALIADO E OPOSITOR
Janio de Freitas

 Aspirante à sucessão presidencial e governador pernambucano, Eduardo Campos apresentará hoje na TV, se não mudar na última hora o programa gravado, sua lista do que considera os erros desastrosos de Dilma Rousseff. Pelos quais, no entanto, ele é corresponsável.
Se o PSB, conduzido por Eduardo Campos, se fez sócio dos êxitos do governo federal, não tem como fugir da condição de sócio do que sejam os erros e insucessos do governo em que tem até ministério e integra a "base aliada" no Congresso. Não há conversa farsesca que anule essa obviedade.
Eduardo Campos não faz crítica, como diz. Poderia e talvez devesse fazê-la se, como caberia mesmo a um aliado, examinasse a natureza do erro, como e por que ocorre. A mera atribuição de erro ou insucesso não é crítica, é oposição. "O Brasil caminha para a crise", como já disse Eduardo Campos a empresários do Sul, é uma advertência grave demais, sobretudo partindo do governador de Estado com a importância de Pernambuco, para que passe sem a exposição de embasamento sério, seja convincente ou não.
Do joguinho de aliado e opositor, de sugar proveito dos dois lados, o que resulta é simples: embuste como aliado e embuste como oposição, ou, vá lá, "crítico".
A mesma evidência ressalta deste ridículo: "Nós não temos um projeto de poder, nós temos um projeto de país". Até em nome do pudor alheio, se não puder ser do próprio, quem deixa lá o seu governo e sai pelo país em óbvia pré-campanha pelo poder - na qual ainda não ofereceu nem uma só ideia nova para o país - deve apresentar um engodo melhorzinho.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

O vice-versa de Serra e Campos




Esse novo partido, o MD, nascido da fusão do PPS e do PMN - mas com focinho tucano -, é o elo da aliança de José Serra (PSDB) e Eduardo Campos (PSB). Com 13 deputados federais, 58 estaduais, 147 prefeitos, 2.527 vereadores e a permissão para atrair insatisfeitos com outras siglas, o MD poderá servir, em primeiro lugar, como instrumento de chantagem de Serra contra o PSDB. Ameaçando mudar de partido, ele teria mais cacife para ser escolhido candidato ou a Presidente ou a Governador de São Paulo pelos tucanos. Difícil, muito difícil, praticamente impossível.
Por outro lado, o MD poderia ser o partido alternativo para Serra candidatar-se tanto a Presidente quanto a Governador de São Paulo. Difícil? Nem tanto. Principalmente contando-se com uma aliança com o PSB de Eduardo Campos. Em São Paulo seria praticamente natural. Para a Presidência, poderia ser em um hipotético segundo turno.
2018 é mais uma face dessa aliança. Ou desaliança, já que Serra e Campos poderão se chocar na disputa pela liderança das oposições. Ou não. Poderiam fortalecer ainda mais a aliança para um segundo turno ou, quem sabe, poderiam um ser vice do outro. Será? Quase impossível.
Há muitos vices e muitas versões nesse vaivém partidário. A face verdadeira dessa questão é a economia. A oposição inteira aposta no fracasso da política econômica de Dilma. É uma aposta baseada principalmente em desejo (é sintomático que os investidores locais tenham apostado em alta maior para a taxa Selic, enquanto os estrangeiros apostavam em menor, como ocorreu nessa última alta). Com a aprovação recorde que vive Dilma, basta a economia se manter como está para que ela vença as eleições de 2014 no primeiro turno. Com o cenário de um crescimento razoável, inflação sob controle e aumento da oferta de emprego, à oposição só resta treinar para 2018. Sem chances de vice-versa.