domingo, 24 de fevereiro de 2013

2Q14: como se posicionará Eduardo Campos?




No Globo de hoje, o professor e pesquisador do IESP-UERJ (Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ), Marcus Figueiredo, escreve um excelente artigo sobre a sucessão presidencial em 2014 (ver abaixo na íntegra). Coloca o PT e o PSDB na condição de mais uma vez serem “cavalos” ganhadores e destaca Eduardo Campos, PSB, e Marina Silva como “fortes coadjuvantes, capazes de forçar um segundo turno”. É por aí mesmo, mas quero fazer algumas considerações.
Primeiro, que o PSDB já não é há muito tempo essa “barbada” toda. Com as derrotas de Serra (principalmente em São Paulo), o governo medíocre de Alckmin, a implosão do PFL/DEM (que lhe tirou o nordeste) e a crise mundial do neoliberalismo, os tucanos lutam para serem um “azarão” viável.
Segundo, que o partido de Marina ainda vai ter que “marinar” muito para pegar gosto.
Terceiro, que ainda existe uma crise de posicionamento do PSB de Eduardo Campos. Filho (ou neto...) da esquerda, não conseguiu manter uma identidade muito clara nesse campo. Inicialmente, faltou-lhe a base operária, a igreja e as organizações que fizeram o PT. Depois, quando poderia tornar-se o herdeiro dos votos pefelistas no nordeste (27% do eleitorado nacional), foi ultrapassado pelo furacão Lula. Como ainda é um partido pequeno no sudeste (43% do eleitorado nacional), o PSB viu no enfraquecimento do PSDB a sua oportunidade de conquistar o eleitorado da classe média conservadora, que se sente um pouco órfão, mas continua poderoso. A dúvida do momento é se Eduardo Campos deve ou não manter a indefinição por mais algum tempo e aliar-se ou a tucanos ou petistas. Na minha opinião, ele deverá apostar no esfacelamento do PSDB e assumir de vez o seu perfil de centro/centro-direita, principalmente no sudeste e no sul (15% do eleitorado nacional). Portanto, muito provavelmente terá candidatura própria. Seu maior risco passa a ser exatamente onde é mais forte, o nordeste. Um confronto direto com Lula poderá significar grande derrota nessa região (afinal, como acentua Marcus Figueiredo, “foi a maciça ascensão social que ganhou, estúpido!”) e aí ele poderá se acabar antes de ver o sertão virar mar. Eduardo Campos já concluiu que a virtude corre pelo meio. Só falta bater o martelo pelo melhor meio.

Foi dada a partida para 2014
Marcus Figueiredo
A semana que passou foi pródiga. Como se tivessem combinado, Dilma Rousseff, Aécio Neves, Eduardo Campos e Marina Silva apresentaram-se para disputar a próxima eleição presidencial. Com isso, dois fortes ex-candidatos tornaram-se fortíssimos “eleitores”: Lula e Serra.
O cenário que se deslumbra põe PT e PSDB, novamente, na condição, como se diz, de “cavalos” ganhadores nessa nova corrida. Eduardo Campos, PSB, e Marina Silva, a criar o seu partido, seriam fortes coadjuvantes, capazes de forçar um segundo turno. Este cenário será, mais uma vez, uma disputa ferrenha entre direita e esquerda. Isto ficou claro na festa petista de dez anos de poder e no discurso tucano no senado. O passo seguinte será o da construção de alianças. O PT já está coligado com o PMDB, o maior partido, porém sem garantias de apoio total, vale dizer, inclusive, nas bases municipais. Sendo uma federação de lideranças regionais com fortes interesses locais a possibilidade de “cristianização” parcial da Dilma pode ganhar corpo.
O resultado da eleição de 2012 nos grandes colégios eleitorais é um excelente indicador do que teremos pela frente. De um lado, as forças pró-PT, caso do PDT em Porto Alegre e Curitiba; Fernando Haddad em São Paulo; Eduardo Paes e Sérgio Cabral no Rio; e outras capitais menores. De outro, as pró-tucanas: Márcio Lacerda (PSB) em Belo Horizonte (não garantida), ACM Neto (DEM) em Salvador e Arthur Virgílio (PSDB) em Manaus. O desequilíbrio deste confronto vem com o PSB no nordeste, com suas vitórias em Recife e Fortaleza, daí a ascensão de Eduardo Campos.
Não há mais dúvida que Eduardo Campos tornou-se o pivô da eleição presidencial de 2014. Para onde ele for teremos resultados diferentes, no primeiro e/ou no segundo turno. Como na política tudo é possível, podemos arriscar falando do futuro longínquo.
Se Campos apoiar Dilma, saindo para o Senado, a eleição virará plebiscitária com fortíssima probabilidade de vitória do PT, mesmo com a economia ainda acanhada, pois o que fez Dilma ganhar foi a extraordinária mudança promovida pelo PT, “foi a maciça ascensão social que ganhou, estúpido!” Se Eduardo Campos apoiar Aécio, como seu vice, teremos um segundo turno que será definido no “photochart”, qualquer que seja a situação econômica. Como diria Nenê Prancha, filósofo do futebol de praia, “esse menino em qualquer posição desequilibra o jogo”.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

PT e PSDB fizeram acordo de cavalheiros – e o PMDB se beneficia




Houve acordo no mínimo tácito entre petistas e tucanos sobre as linhas dos discursos feitos anteontem. Aos tucanos, em frangalhos, interessava serem classificados como a alternativa ao PT. Querem chegar às próximas eleições com alguma autonomia de voo, e o fato de serem escolhidos como principais adversários do partido mais forte fez com que batessem asas de alegria. Ao PT, era conveniente valorizar um adversário sem muito futuro, mais fácil de derrotar e que garantisse mais brilho à sua estrela. Por trás dos panos, o arrulhar da pomba do PSB. Tanto petistas quanto tucanos querem evitar que Eduardo Campos alce (epa!) voo, o que é bem justo. Para o PT foi mais fácil. O partido está de bem com a vida e teve uma boa oportunidade de mostrar sua unidade e de que está mais do que disposto a enfrentar os ataques incessantes da mídia. Seus discursos foram coerentes, entusiasmados e trouxeram boa comparação com os tucanos. Do lado tucano, representado pelo cambaleante Aécio, o gorjeio foi mais fraco, mas serviu para garantir fôlego junto à mídia. Quem ficou na moita, prestando atenção a tudo que estava no ar, foram os peemedebistas, fortalecendo-se ainda mais para 2014. Não é que eles pretendam abandonar o barco petista – longe disso! –, mas viram seu cacife aumentar para as eleições regionais – governos, senado, câmara e assembleias. Certamente continuarão como vice. Mas ganharão muito mais por isso.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Sinal dos tempos: a Igreja Católica vai acabar




Não sou contra as religiões, por princípio. Elas têm importante função de dar certa racionalidade ao irracional. Mas às vezes elas se tornam mais irracionais do que as irracionalidades que fazem parte de sua origem. Vejam a Igreja Católica, esse gigante medieval que não sabe mais o que fazer para sobreviver aos novos tempos. Conseguiu sobreviver à Reforma, mas dificilmente conseguirá aos tempos da internet. Ratzinger, um sobrevivente da Escuridão, arregou e saiu atirando. Os que vão sucedê-lo terão o desafio hercúleo de dar sobrevida a essa entidade trapalhona que procura ditar o destino a mais de um bilhão de seguidores em todo o planeta. Como explicar que o objeto luminoso que cruzou ontem os céus da Rússia não é produto da ira divina, mas apenas um entre milhares de objetos que chegam diariamente a nosso planeta? Como explicar que o homossexual pode ser tão católico quanto o hétero? Como aceitar que os pobres católicos das periferias de cada país, de cada cidade, possam ter tanta relevância quantos os engalanados de Roma? Nesse mundo da instantaneidade e da universalização da informação, a igreja que nasceu com a pretensão da universalidade (católico, na sua origem grega, significa universal) tem dificuldade em se manter de pé diante dos terabytes de informação nova. Evidentemente há boas cabeças pensantes tentando evitar o que parece inevitável, como a desse teólogo brasileiro, Mário França, que tem entrevista hoje no Globo. Leitura agradável. Aproveito para pôr também o link (enviado pelo Blog do Mello) de entrevista antiga de Leonardo Boff feita para a Caros Amigos em 98.

A Igreja muda ou acaba’, diz teólogo brasileiro
Mário França crê que o modelo atual da Santa Sé trai a origem da fé católica
Transição. Bento XVI caminha após sua audiência no Vaticano na quarta-feira: seu sucessor vai herdar uma série de desafios e problemas que o Papa atual não conseguiu resolver, desde escândalos na Igreja a disputas internas por poder na Cúria de Roma 
Por onze anos, Mário França, 76, fez parte da Comissão Teológica do Vaticano, onde conquistou o respeito do então cardeal Joseph Ratzinger. Hoje, professor da PUC-Rio e autor de obras sobre a teologia, defende uma nova Igreja, longe da hierarquia e das ortodoxias de Roma, e com espaço para gays e padres casados. 
O GLOBO: Como a Igreja vai sobreviver ?
Mário França: Chegou um momento em que a Igreja, só com os oficiais, padres, bispos e Papa, não aguenta mais. Esta estrutura foi uma traição à Igreja primitiva, em que todo mundo participava e tinha direitos iguais de participação. Todos são iguais, não tem homem, mulher, judeu, gentio ou escravo e senhor. Depois a Igreja erigiu uma estrutura monárquica, um pouco copiada de Roma. Foi consequência da chegada dos príncipes, que começaram a nomear parentes para tomar conta das muitas propriedades da Igreja. Era preciso estruturar ou tudo ia ficar na mão de famílias poderosas, nobres. Para evitar isso, o laicado foi afastado do poder da Igreja - o laicado não era o povão, eram estes príncipes que estavam cada vez incomodando mais. Passou o tempo e a Igreja ficou identificada por seus bispos, padres etc. É errado, né? Todo cristão, todo católico, tem o direito de formar um grupo, com o qual a hierarquia não pode se meter. A Igreja do futuro vai ser predominantemente leiga ou então não vai aguentar.
O Grupo de diversidade católica, que reúne gays, é um exemplo do que o senhor está dizendo?
Mário França: Exatamente. É um grupo de pessoas que são assim. A Igreja não pode excluir, tem de atender todo mundo. É uma maneira de a Igreja mostrar sua abertura. A consciência histórica é lenta. Teve um tempo que os missionários se perguntavam se tinham que batizar ou não os negros da África, por que não sabiam se eram animais ou gente. Muita coisa que achamos normal hoje, daqui a 50 anos será considerada intolerável. Os laicos vão obrigar a Igreja a criar um espaço de debate público, que não existe. A qualquer problema, corre-se para o bispo.
Mas as mudanças têm sido lentíssimas.
Mário França: Não se mexe da noite para o dia com 1,2 bilhão de pessoas. Não se podem criar traumas, as pessoas têm mentalidades muito diversas e, como diz o Rubens César Fernandes, do Viva Rio, o importante é que a gente mantenha todo esse pessoal dentro da Arca de Noé. Os sociólogos dizem que tudo pode mudar, menos o religioso, porque o ser humano tem necessidade de segurar alguma coisa. A gente percebe que isto não tem sentido. O sagrado também é construído através de uma linguagem e de práticas.
Esta posição está afastando muita gente.
Mário França: É, há paróquias que viraram agências de fornecer sacramento, isto está condenado. Tem de ter o sentido missionário. É o que se está tentando fazer agora. Mas é lento. Quando eu fui da Comissão Teológica do Vaticano, não tinha nenhuma mulher, agora já tem quatro. Não há dúvidas de que o fim do celibato já deveria ter acontecido, Paulo VI era a favor disso - mas uma coisa destas vai mudar a estrutura.
A questão da contracepção também está mais do que na hora de ser enfrentada.
Mário França: São questões morais que têm se ser mudadas, mas é uma coisa lenta. No papado de João Paulo VI, o cardeal de Bruxelas disse: na minha arquidiocese é permitido camisinha - ele estava com um problema seríssimo de explosão de Aids entre trabalhadores imigrados. Resolveu assumir e disse: aqui é preciso usar camisinha. O Vaticano não disse uma palavra.
A Igreja não vem conseguindo acompanhar as mudanças sociais?
Mário França: São rapidíssimas. Na PUC, a mudança de uma geração para a outra se dava em 20 anos, depois passou para 10, agora com dois ou três anos, você já vê aluno do quarto ano que não consegue entender o calouro. É uma sucessão vertiginosa que não conseguimos mais acompanhar, que provoca um curto-circuito na cultura.
Quem é o mais progressista entre os candidatos a Papa?
Mário França: Os cardeais terão de fazer um perfil de uma pessoa que entenda o mundo e saiba enfrentar esses desafios todos. Tem de ter boa formação pastoral e intelectual, capaz de se cercar de pessoas competentes. Tem um candidato de Honduras, Luis Alfonso Santos, que é uma pessoa muito possível de dar um bom Papa. Sabe línguas, é sensível, mora no país mais pobre da América Central: é uma pessoa que marca pela inteligência. Tem Luiz Antonio Tagle, um filipino progressista também, mas ele é muito novo. Tem 55 anos. Mas eu duvido que queiram colocar um cardeal de 50 anos, pois ele ficaria 30 anos. A turma não quer isso não. Cardeal Ravasi, encarregado da Cultura, também é muito aberto.
Resumindo: o senhor diz que a Igreja tem de mudar?
Mário França: Já está mudando. Ou muda ou acaba. É um momento sério da sociedade, faltam líderes. Onde estão os Churchill, De Gaulle, Adenauer? Não tem mais, está faltando líder. Na Igreja também, e os problemas são muito grandes. As religiões têm um papel muito forte no mundo de hoje, e a Igreja tem de ser uma 
reserva ética, apesar dos mal feitos da cúpula.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

O pouso tucano



Em 5 de novembro de 2010, fiz aqui no Blog o post "Cid apoia Aécio: qual é a do PSB?", que reproduzo mais abaixo. Falava sobre a aproximação entre tucanos e pessebistas, na época representados principalmente pelos irmãos Gomes. Hoje a história se repete, dessa vez com o governador Eduardo Campos, de Pernambuco, encabeçando os pessebistas e com uma grande vantagem sob suas asas - a desintegração tucana. Eduardo Campos hoje é um nome mais forte do que Aécio e representa, sozinho, a força nordestina (que vai tentar tirar um pouco de Lula) mais a classe média conservadora do Sul-maravilha que busca um novo ninho para seus tucanos. Claro que Eduardo Campos conhece suas limitações. Seu partido ainda é pequeno e dificilmente terá condições de vencer a aliança Lula-Dilma-PMDB em 2014. Mas ele pretende crescer no Congresso, tentar mais governos estaduais e aposta no desgaste petista-peemedebista nas eleições seguintes. Vai procurar ser a força nova da política brasileira. Embora saiba que só poderá levantar voo se contar com as asas das forças mais atrasadas...

Cid apoia Aécio: qual é a do PSB?
Este Blog já falou, ainda no ano passado, se não me engano, sobre a aproximação entre o tucano Aécio e o pessebista Ciro Gomes. Seria a possibilidade de um eixo de força política, ligando Minas e o Nordeste e formando o núcleo de uma nova oposição de centro-direita. A fala de Cid Gomes, Governador do Ceará, apoiando Aécio para a Presidência do Senado pode ser o primeiro salto nessa direção. Mas pode também restringir-se a uma questão de voos internos do partido, marcando a rinha entre Eduardo Campos, Governador de Pernambuco, e os irmãos Gomes. Ou ainda pode ser apenas um pouco de chantagem para que o partido se aninhe melhor sob as asas do Governo Dilma. Mais provavelmente, significa um pouco de tudo isso. Seja como for, daqui pra frente, o PSB será outro. O partido saiu bastante fortalecido dessa eleição e vai bater asas em todas as direções na busca de mais espaço nos céus da política. Isso até que alguém resolva cortar suas asinhas de tucano...

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Marco Aurélio Mello está errado!


No seu artigo de domingo, dia 10, na Folha, o ministro Marco Aurélio Mello começa com a frase “A ordem natural das coisas possui força insuplantável, norteando a vida em sociedade”. Eu não quis nem saber o que vem depois. Está errado. Não existe “ordem natural das coisas” em questões jurídicas, políticas ou sociais. O que existe é uma ”ordem interpretativa das coisas”. O Supremo existe para interpretar a Constituição. E às vezes interpreta “juridicamente”, às vezes (quase sempre) interpreta politicamente ou por questões pessoais, às vezes sei lá por qual motivo. Não me venha agora dizer que existe uma “ordem natural das coisas”. Papo furado. Não entendo como um Ministro do STF é capaz de dizer algo assim.