segunda-feira, 27 de maio de 2013

César Maia e o boato do Bolsa Família



Muito bom o texto de César Maia no seu Ex-Blog de hoje sobre o Boato do Bolsa Família. Como bom tardeano, ele fala com propriedade do fluxo que nessa semana passada apavorou a população beneficiária desse importante programa social. Só não concordo muito quando ele diz que esse "é um caso que mostra que aqueles que imaginavam que a mobilização via redes (indignados...) era uma exclusividade da classe média veem agora que não". Acho que ele esqueceu da campanha da Marina em 2010, que deu um show de Orkut com grande sucesso na classe C, basicamente entre os evangélicos. Diz Caio Túlio Costa em seu artigo O Papel da Internet na Conquista dos Votos de Marina Silva: "a atuação de Marina Silva na internet representou o maior diferencial na campanha presidencial". Mais adiante: "Examinando melhor essa audiência, percebia-se que o Orkut tinha uma grande quantidade de integrantes da chamada classe C – emergente – muito maior que qualquer outra rede social. Marina Silva sempre apostou muito na comunidade evangélica, da qual faz parte. Definiu-se então que o Orkut seria usado para levar a mensagem da candidata aos evangélicos. A principal comunidade de Marina Silva no Orkut registrou 58.859 integrantes até setembro. Se multiplicarmos por 231, que é a quantidade média de amigos que os brasileiros têm no Orkut, isso dá 13,6 milhões de pessoas".
Veja o texto de César Maia.

BRASIL: O PRIMEIRO CASO DE FORTE MULTIPLICADOR E MOBILIZAÇÃO PELAS REDES SOCIAIS!

1. O pânico e a mobilização relativos ao caso Bolsa Família/CEF, além de serem investigados pela Polícia Federal, para identificar eventual promotor, devem estimular pesquisadores de opinião pública a estudar o processo que levou a mensagens –provavelmente deflagradas para smartphones- terem produzido essa enorme mobilização.
2. Se foi assim, esse é o primeiro caso no Brasil de um multiplicador via redes sociais ter produzido tamanho efeito. Um caso novo (talvez no mundo), pois o público atingido de baixa renda não é o característico das redes sociais. Em outros casos, como na África do Norte, na Europa e EUA, a dinâmica desses processos se deu em torno da classe média.
3. O fato de a CEF ter liberado pagamento de bolsa família de dois meses, com um mês adiantado, certamente deu credibilidade à onda que veio logo em seguida, pois mudou a regra do jogo. Dessa forma, se teve dois tipos de multiplicador: um vertical e outro horizontal. O vertical seria a distribuição de mensagens a partir de pontos via –imagina-se- telemarketing. Provavelmente esta distribuição só ocorreu porque teve como lastro o adiantamento pela CEF no dia anterior, dando credibilidade ao início da onda.
4. O multiplicador horizontal é o que deve despertar o maior foco dos pesquisadores. Uma vez deflagrado o processo verticalmente –e dado que o uso de smartphones, incluindo, claro, os celulares mais simples, que são de uso generalizado no Brasil- os pontos alcançados se encarregaram de multiplicar solidariamente para seus pares cadastrados no bolsa-família. Como o bolsa-família tem concentração espacial entre comunidades de baixa renda, da mesma forma, o boca a boca, aumentou o multiplicador.
5. O notável é o fato da onda, via redes, ter chegado em 24 horas a 13 Estados e centenas e centenas de municípios, sem quaisquer proximidades com as fontes de deflagração, e atingido à população de baixa renda. Esse é um caso que mostra que aqueles que imaginavam que a mobilização via redes (indignados...) era uma exclusividade da classe média veem agora que não.
6. Claro que os assuntos deflagradores podem não ser os mesmos, mas o meio sim. Em nível político essa é uma informação importante. Os setores de baixa renda são também alcançáveis pelas redes sociais, só que por assuntos específicos e meios de amplo uso.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Boato, uma ciência política



No livro “Política é Ciência”, de César Maia, podemos ler esse seu depoimento sobre um diálogo com seu assessor durante a campanha de 96, quando ele apoiava Conde contra Sérgio Cabral para Prefeito do Rio: “Pega o celular, liga para o fulano, manda colocar umas 150 pessoas em botequins tomando cafezinho e dizendo: ‘Eu soube que o Sérgio Cabral vai renunciar. Diz esta frase que é boa’. Dali a três dias alguém veio me dizer: ‘O Serginho vai renunciar...’” Em seguida o jornalista Luís Erlanger comenta: “É o princípio do boato”. E César acrescenta: “Os fluxos tardeanos não são nada mais do que o boato ou a verdade. Vai contaminando”. O rodapé do livro, que foi lançado em 98, faz questão de explicar: “Fluxo tardeano é um conceito sobre a formação da opinião pública, desenvolvido pelo filósofo francês Gabriel Tarde, no início do século”.
Isso tudo é verdade. Esses fluxos de que tanto fala César Maia fazem parte da vida política, sejam boateiros ou verdadeiros. Por isso, não me venha a oposição fazer ar de surpresa ou de indignação, porque esse boato recente envolvendo o Programa Bolsa Família é obviamente uma peça oposicionista, mesmo que tenha surgido espontaneamente (coisa que duvido muito). Por isso, acredito que a Maria do Rosário tenha agido com precisão ao denunciar esse “partido”, o CNO, que tem atuado com força nos períodos pré-eleitorais. O CNO (Central de Notícias da Oposição) é o “partido” que mais cresce nesse período e é importante que se esteja atento contra suas investidas. Chiliques à parte, infelizmente é assim que a coisa funciona. Cientificamente...

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Avanço geopolítico: Brasil expande ação naval na África


O site da BBC trouxe ontem uma reportagem bem interessante sobre o investimento da Marinha brasileira em capacidade de patrulhamento e na expansão de suas operações do outro lado do oceano, em águas africanas. A reportagem frisa que o objetivo “é proteger riquezas marítimas como as reservas do pré-sal e combater crescentes ameaças de pirataria e narcotráfico no Atlântico Sul”. E acrescenta que “as ações ocorrem ainda num contexto em que forças americanas, britânicas e francesas demonstram crescente interesse pelo Atlântico Sul”. Em um post que fiz em 2009 sobre geopolítica (Pourquoi “France”? It’s the geopolitics, stupid!), destaquei que “com a descoberta do pré-sal em nossas águas, veio à tona outro fantasma, a Quarta Frota Americana, que voltaria a circular por nossa costa. Alguns dizem que foi apenas coincidência, mas é difícil acreditar. Seja como for, o importante é compreender que o Brasil não pode se acomodar em um papel secundário no jogo de forças que se está montando”.
O Brasil tem duas grandes fronteiras que precisam ser permanentemente protegidas por serem alvos de crescente cobiça internacional, a “Amazônia verde” de um lado e a “Amazônia azul" do outro. Leia aqui a reportagem da BBC e, se tiver meia hora sobrando, recomenda a entrevista do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães feita em 2009, que encontrei divida em três partes: primeira, segunda e terceira.

terça-feira, 7 de maio de 2013

Os limites de poder dos Três Poderes



Virou moda endeusar o Judiciário, de forma insistente, como se ele devesse se transformar em poder absoluto no Brasil. Isso não é gratuito, faz parte de uma luta política intensa onde os grupos derrotados procuram reequilibrar o jogo a partir da redistribuição de poder entre os Três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas esse tipo de visão é antidemocrático, rompe um equilíbrio fundamental. As críticas devem ser feitas, sim, a qualquer um dos Poderes, sem que isso nem de longe signifique substituir um pelo outro. Como escreve Luiz Carlos Bresser-Pereira, em seu artigo de ontem, na Folha, “As democracias se caracterizam pelo equilíbrio de Poderes, mas isso não significa que os três tenham a mesma importância. O Legislativo é o Poder democrático por excelência, e cabe a ele a palavra final em todas as questões, através das emendas. Entretanto, o que vemos no Brasil é o Judiciário - Poder burocrático por excelência - tentar assumir essa posição, o que é inaceitável do ponto de vista da democracia” (ver texto completo logo abaixo). O pior é que o chamado “quarto poder”, a mídia, costuma entrar pesado nesse jogo e, em nome da defesa da democracia, agride todos os princípios democráticos. Que o nosso Legislativo é muito fraco, ninguém duvida. Que a corrupção frequentemente ameaça transformar nossos Poderes em “podreres”, também ninguém duvida - mas, infelizmente, não conheço nenhuma democracia representativa que tenha resolvido esse problema. O que não podermos é “salvar” a democracia virando-a pelo avesso. Ao STF, por exemplo, cabe basicamente interpretar a Constituição, que foi feita pelo Legislativo (no nosso caso, uma Assembleia Constituinte eleita pelo povo brasileiro) e que deve ser cumprida e garantida pelo Executivo. Um ministro do Supremo não pode transbordar seus poderes como um golpista qualquer. Não é assim, atropelando a democracia, que se pode, digamos, melhorar um Legislativo trôpego. Todo poder tem seu limite.

Qual Poder é preciso defender?
Luiz Carlos Bresser-Pereira

As democracias se caracterizam pelo equilíbrio de Poderes, mas isso não significa que os três tenham a mesma importância. O Legislativo é o Poder democrático por excelência, e cabe a ele a palavra final em todas as questões, através das emendas. Entretanto, o que vemos no Brasil é o Judiciário - Poder burocrático por excelência - tentar assumir essa posição, o que é inaceitável do ponto de vista da democracia.
O equilíbrio de Poderes, ou "checks and balances", é a tese através da qual filósofos liberais do século 18 buscaram limitar o Executivo, o monarca absoluto. Mas, além disso, é uma tese que visou limitar o Parlamento - reflexo da oposição do liberalismo à democracia no século 19 a partir do argumento de evitar a "ditadura da maioria".
Há tempos esse argumento, que servia para a burguesia rejeitar o sufrágio universal, mostrou-se equivocado. A maioria alcançada em alguns momentos por sociais-democratas que representavam os trabalhadores jamais buscou exercer a ditadura quando ganhou eleições.
Mas o medo da democracia continua a assombrar liberais, que, apesar da crítica ao Estado e à sua burocracia, sempre buscam transferir poderes; do Executivo para agências burocráticas supostamente "independentes"; e do Legislativo para o Supremo Tribunal Federal.
Ao julgar a constitucionalidade das leis e interpretar os dispositivos da Constituição que não são claros, o Poder Judiciário exerce um papel que lhe é próprio. Mas o que estamos vendo é algum dos ministros usarem o "clima favorável" criado por um liberalismo antidemocrático ainda dominante para se impor sobre o Parlamento. Vimos dois movimentos recentes nessa direção.
Primeiro, o Supremo não hesitou em interferir na ordem em que os projetos de lei são votados, exigindo que venham primeiro as medidas provisórias. Agora, um ministro concedeu liminar para impedir que continue a ser discutido no Senado projeto de lei que inibe a criação de partidos políticos. Usou como justificativa o fato de que o projeto estaria sendo aprovado "de afogadilho".
O Brasil tem um bom Judiciário, um Poder meritocrático formado por magistrados de elite. Já o Congresso está permanentemente nas manchetes, porque é constituído de um número grande e heterogêneo de parlamentares e reflete qualidades e defeitos da sociedade brasileira.
Mas não é razoável que, por essa diferença de constituição, a sociedade se deixe convencer por um liberalismo que manifesta preferência pelo Poder Judiciário e desgosto com a política e a democracia.
O Congresso aprovou na Comissão de Justiça da Câmara emenda constitucional que exige maioria de quatro quintos para o Supremo declarar leis inconstitucionais - algo discutível, mas razoável. Creio ser justo que esteja clara para o Supremo a inconstitucionalidade de uma lei já duramente discutida.
Receio que alguns ministros do Supremo estejam se inspirando na Suprema Corte dos Estados Unidos, mas lá seus membros não têm alternativa, já que a Constituição se tornou uma espécie de tabu, e o Congresso perdeu capacidade prática de emendá-la. No Brasil não é assim. Devemos saudar as tentativas para contornar a crise entre os dois Poderes, mas sem perder de vista que, se há um que precisa ser defendido (e sempre criticado), este é o Legislativo. Os outros dois não estão ameaçados.


Luiz Carlos Bresser-Pereira é professor emérito da Fundação Getúlio Vargas, onde ensina economia, teoria política e teoria social. É presidente do Centro de Economia Política e editor da "Revista de Economia Política" desde 2001. Foi ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia (governos FHC).

Israel – arma de destruição em massa?


O recente ataque de Israel à Síria me parece que vai além do bloqueio a envios de armas para o Hesbolá, a milícia xiita-libanesa, de 2 mil a 4 mil homens, que em 2006 deu um chega pra lá no exército israelense (Leia O mundo se surpreende com a organização do Hesbolá na guerra contra Israel). Israel, se quisesse, poderia ter feito esse ataque há mais tempo, mas não gostaria de mexer em vespeiro. Talvez o papel de Israel seja o de estimular pretextos para uma intervenção internacional na Síria. Equivalente ao pretexto das armas de destruição em massa que Bush usou para invadir o Iraque. Xiitas, alauítas, sunitas e laicos da Síria que se preparem: podem estar chegando os boinas de todas as cores – talvez até mesmo os da Rússia. Quem sobreviver verá?