segunda-feira, 20 de abril de 2009

Edson Vidigal e " A Reciclagem dos Coronéis"

Edson Vidigal, acho que já falei aqui, foi meu contemporâneo de Veja, em São Paulo. Depois ele voltou para o Maranhão. Mas não foi com isso que ele ganhou projeção nacional. Vidigal tornou-se Presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e depois, na última eleição, foi candidato - derrotado - a Governador do Maranhão. No segundo turno apoiou Jackson Lago e, evidentemente, está revoltado com a decisão do TSE que tirou Jackson e colocou Roseana Sarney no seu lugar. Vidigal (que no passado também foi Assessor de Comunicação do então Governador José Sarney) enviou o seguinte texto:
A Reciclagem dos Coronéis
A índole democrática da Constituição da República será sempre uma mera percepção acadêmica para fins diversos, inclusive propagandísticos, se o Judiciário pelo equívoco de alguns Juízes recusa vigência a princípios fundamentais como, por exemplo, o de que todo poder emana do Povo que o exerce por meios de representantes eleitos. No caso de cargos providos mediante eleição, como o de Governadores e Vices, cuja legitimidade só pode ser aceita mediante o voto da maioria absoluta dos eleitores, e para isso há que haver tantos turnos de votação quantos forem necessários, vem a Justiça Eleitoral, mais precisamente o Tribunal Superior Eleitoral, em caso de cassação de eleitos, entregando cargos de Governadores e Vices a pessoas que não foram eleitas.
O Estado de Direito Democrático reconquistado no Brasil após décadas de lutas contra o regime militar, que parecia infinito, talvez eterno em sua arrogância, está sendo minado em suas bases pela soberba intelectual de alguns Juízes que parecem não estar entendendo o verdadeiro sentido de cláusulas fundamentais da Constituição da República. O Presidente do TSE, Ministro Carlos Britto, ele próprio um intelectual da academia jurídica sergipana, de onde ascendeu vitorioso e respeitado a uma poltrona no Supremo Tribunal Federal, perora com a segurança de um trilho sobre dormentes de ferrovia, garantindo que o princípio constitucional da legitimidade se resgata com a entrega do diploma de eleito ao segundo colocado, ou seja ao perdedor. A Justiça Eleitoral está reciclando a política dos coronéis. Mais que uma constatação é uma denúncia grave, esta que você lerá, a seguir, no artigo de Fernando Barros e Silva, na Folha de São Paulo, de hoje, sob o título Indústria do Golpismo:
"Ninguém pode, de boa-fé, ser contrário à punição daqueles governantes que corrompem o processo eleitoral. Compra de votos, uso indevido da máquina pública, abuso do poder econômico - são todos comportamentos passíveis de sanções, até mesmo da cassação do mandato, medida que se banalizou, mas de trivial não tem nada. Este é o primeiro ponto.
Segundo: ninguém compromissado com a democracia pode aceitar que a cassação de alguém tenha como consequência a sua substituição por quem foi vencido nas urnas. O segundo colocado não é o próximo da fila, mas o que foi rejeitado pelo voto popular. Não é o reserva do time, é o adversário derrotado. É preciso desvincular o castigo ao corrupto do prêmio ao perdedor.
Não tem sido essa, porém, a interpretação da justiça eleitoral. Suas decisões recentes parecem dar curso a uma nova indústria do golpismo no país, agora com amparo legal. Ainda mal começamos a perceber as consequências políticas desse protagonismo. Há dois meses, José Maranhão (PMDB), derrotado em 2006 por Cássio Cunha Lima (PSDB), assumiu o governo da Paraíba. Agora, Roseana Sarney (PMDB) vem ocupar o cargo de Jackson Lago (PDT) no Maranhão. Falta a esses dois governantes o oxigênio da democracia: legitimidade popular.
Há outros seis governadores na mira do TSE. Se a moda pega, corremos o risco de regredir para um quadro realmente sinistro: quase um terço das unidades da Federação nas mãos de quem foi derrotado nas urnas em 2006. Não por acaso os governantes sub judice vêm de Estados periféricos, onde a disputa pelo poder se trava muitas vezes entre famílias rivais e o aparelho burocrático vive refém do arbítrio, sujeitado ao pessoalismo mais bruta. O caso do Maranhão, a capitania hereditária dos Sarney e seus agregados, é exemplar e joga luz sobre um problema que o ultrapassa. A justiça eleitoral está patrocinando a reciclagem da política dos coronéis."