quinta-feira, 5 de maio de 2011

Obama - Marco Zero ou Nota Zero?



(No vídeo acima, trecho da excelente entrevista de Chalmers Johnson para Jorge Pontual, do Milênio, em junho de 2010)
Ok, Obama acaba de transformar-se em herói americano, líder ousado e inteligente. Com isso, ganhou pontos valiosos nos índices de aprovação popular, deu um grande passo rumo à reeleição. Mas os pontos que ele ganhou em casa perdeu em dobro fora de casa. Não há como justificar a invasão de um país soberano, ainda mais para eliminar seja quem for. Não há como justificar o assassinato de uma pessoa indefesa. Não como justificar a tortura. Não há como justificar o sequestro do corpo e o encobertamento de provas. Assim como não há como justificar a invasão do Iraque e a carnificina na Líbia. Os Estados Unidos protegem-se, mas lançam a humanidade de volta à lei da selva. Os cartazes de “vivo ou morto” do seu faroeste não podem ser fixados nos quatro cantos do mundo. Na matança de “seus terroristas”, dão um show de arrogância. Não é assim é que teremos um mundo melhor, mais seguro, livre do terrorismo. Obama corre o risco de ganhar a reeleição, e perder o Paquistão para a China. Corre o risco de voltar a ser ovacionado em casa, e receber chuva de ovos além-fronteiras. Seria o momento certo (se não fosse a eleição de 2012) para compreender, como disse o historiador e ex-CIA Chalmers Johnson, que "uma nação pode ser um império ou uma democracia – mas não pode ser os dois”.  O grande presidente americano precisa aprender que o que é bom para os Estados Unidos não é obrigatoriamente bom para o mundo.

Muito bom o artigo de Ricardo Melo, hoje na Folha:

Licença para matar
Ricardo Melo


Não será do dia para a noite que se terá acesso ao que realmente ocorreu no esconderijo do terrorista Osama bin Laden. Mas até a imprensa americana, que desde a Guerra do Golfo trocou o jornalismo pela "embedagem" ao governo, desconfiou do anúncio hollywoodiano da Casa Branca, versão democrata das "armas de destruição em massa" da era Bush.
Os lances épicos da violenta troca de tiros, da mulher usada como escudo, da resistência feroz deram lugar a um enredo bem mais prosaico. Provavelmente houve uma execução, e ponto. Tal descrição não comporta nenhum juízo de valor.
Bin Laden e quem se engaja no terrorismo e no fanatismo religioso têm consciência que o risco de morrer faz parte do (mau) negócio. O prontuário de crimes do chefe da Al Qaeda apontava para este final.
Mas incomoda, para dizer o menos, aceitar como natural a baboseira de Obama e dos europeus, para os quais a "justiça foi feita".
Como assim? Os EUA invadem um país, fuzilam um inimigo sem julgamento, jogam o corpo do sujeito no mar e estamos conversados. Tudo isso depois de se valerem de "técnicas coercitivas de interrogatório", eufemismo para tortura com afogamentos. E ainda vem a ONU, candidamente, dizer que "é preciso investigar" se o direito internacional foi desrespeitado.
A lógica política da operação Geronimo é a mesma que preside a intervenção seletiva nos conflitos na África e no Oriente Médio. Gaddafi, o ex-amigo, agora é inimigo, então chumbo nele e na família. Já na Síria não é bem assim, tampouco no Iêmen e na Arábia Saudita -azar de quem nasceu rebelde por ali. Mais uma vez, os EUA tratam o planeta como quintal, e usam a ONU de plateia para as "rambolices".
Que Obama, um político comum, comemore o ganho de popularidade às vésperas da batalha pela reeleição, é compreensível. Já o resto do mundo dito civilizado assistir a tudo com tamanha complacência apenas sinaliza o que está por vir.