sábado, 30 de dezembro de 2006

Violência 3: Garotinho e a (in)segurança no Rio

Ataque em Caxias, RJ / Folha
O Ex-Blog de Cesar Maia despediu-se de 2006 atacando seus alvos prediletos: Garotinho, Fernando Henrique e seu PSDB e, indiretamente, o governo Lula. (Surpreendentemente, faz um afago no governador eleito do Rio, Sergio Cabral.) Para atacar Garotinho, ele aproveitou a recente tragédia carioca na área de segurança pública. Cesar Maia começa seu texto anti-Garotinho ironizando Luiz Eduardo Soares, antropólogo e principal formulador da política de segurança do início do governo Garotinho, com quem dividiu a autoria de um livro sobre o tema. César Maia, sem citar o nome, trata Luiz Eduardo como “policiólogo de plantão” (Ele não conta que andou procurando a assessoria de Luiz Eduardo, no início da campanha eleitoral de 98). A pequena análise sobre segurança feita por César Maia tem pontos interessantes, apesar do alto teor de raiva política que ele descarrega sobre Garotinho. Vou destacar um trecho, para comentá-lo:
O que cabe é o novo governo ter sangue frio. Entender o que está ocorrendo. E dar respostas práticas a curto prazo direcionadas a ampliar a percepção de proteção por parte da população. Isso só se consegue aumentando muito o policiamento ostensivo. E imediatamente, de forma a dar fôlego à polícia para se antecipar e reprimir os focos de novos atentados. Isso se faz aumentando a jornada (dos policiais) e substituindo o bico fora pela jornada maior, dentro (da corporação)
1) No início de seu governo, Garotinho me pediu para colar em Luiz Eduardo para apoiá-lo, dentro do marketing de segurança. Fiz muita pesquisa, inclusive uma excelente pesquisa qualitativa com o Instituto Imagem. Já nessa época verificamos a importância da percepção de proteção. Não que a solução dos problemas de segurança se resuma a percepções – mas isso é uma parte importante da solução. A população sabe que a polícia é corrupta e incompetente – mesmo assim exige a ampliação de sua presença nas ruas, quer se sentir protegida. Muitas vezes, essa sensação de segurança da população corresponde a uma sensação de insegurança dos criminosos. (Nem sempre isso é verdade: os carros brancos da polícia podem significar paz para a população, mas não transmitem aos criminosos o temor necessário que transmitem os carros pretos da CORE, como observou o ex-Chefe de Polícia do Rio de Janeiro, Zaqueu Teixeira.) Foi em função disso que criei, junto com Luiz Eduardo e Jairo Coutinho (seu assessor político, na época) o conceito da Nova Polícia (o nome procurava reproduzir a renovação que estava sendo feita nas polícias de várias partes do mundo e o emblema (criado por meu diretor de arte Robson Sousa) procurava reproduzir o velho emblema de Xerife – do inglês antigo shire reeve, uma espécie de líder de segurança de uma comunidade.) As Delegacias Legais também foram uma grande contribuição como percepção de segurança, além, é claro, de significarem modernização, agilidade, fim de delegacias ilegais, etc. Apesar de muitas ações positivas do início de governo, a relação de Garotinho e Luiz Eduardo nunca foi tranqüila. Garotinho jamais confiou em Luiz Eduardo e não lhe deu autonomia suficiente. Não queria que ele crescesse como responsável pela política de segurança e usasse essa marca como candidato a deputado federal pelo PT (partido que Garotinho já via como adversário, apesar de fazer parte da aliança no governo). Os ideais de uma política de segurança moderna, eficiente e responsável que tanto Garotinho quanto Luiz Eduardo tinham (e talvez ainda tenham) naufragou logo de início com o choque entre os dois, com erros de ambos os lados.
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2) O fim do bico dos policiais proporcionado pelo sistema de turnos de 24h x 72h foi outro sonho impossível do governo Garotinho. Esse sistema permite que os policiais usem a folga para fazer um bico, ganhar um dinheiro extra, geralmente atuando em empresas privadas de segurança. Garotinho pretendia instituir o turno de 8 horas diárias e, com isso, acabar com o bico. A renda extra dos policiais poderia ser garantida através do ISP – Instituto de Segurança Pública, que poderia cobrar alguns serviços extras de segurança. Lembro de um exemplo seu: “Acabei de colocar 12 PMs para garantir a segurança do aniversário da filha da Xuxa. Com o ISP, esse serviço poderá ter uma pequena taxa e a renda poderá ser revertida para benefício da corporação”. Claro que o ISP como foi pensado originalmente não deu certo. As empresas de segurança, em sua maior parte, pertencem ou estão ligadas a policiais, delegados e oficiais da PM, e eles obviamente não queriam entregar essa mina para um tal de ISP. Outro fracasso do ISP foi a idéia de representar o começo da unificação das polícias civil e militar – uma estranha dificuldade em todo o território nacional..
Eu sou testemunha de que Garotinho (assim como Luiz Eduardo) pretendia verdadeiramente, se não resolver (o que seria impossível), pelo menos avançar significativamente nas soluções para a área de segurança no Estado do Rio de Janeiro. Houve muita ingenuidade e muito erro político, uma total incompetência para administrar o mundo real do combate à violência. As boas conquistas acabaram sendo rapidamente ofuscadas. A percepção de insegurança aumentou. E o que temos é um final melancólico para dois mandatos de um governo que sonhou e prometeu demais.