Bem interessante esse artigo de Paulo Nogueira Batista Jr. hoje no Globo:
Brasil: bolhas e macacos
Estou nos Estados Unidos, leitor, há mais de dois anos. Uma coisa me impressionou desde o início: a popularidade do Brasil no exterior, em marcado contraste com a nossa frágil e problemática autoimagem.
Essa popularidade continua crescendo. Vai-se formando, quase diria, um entusiasmo internacional pelo Brasil.
A onda pró-Brasil parece configurar uma espécie de bolha. No campo econômico-financeiro já temos sintomas de um movimento de manada. Isso levou o governo a taxar a entrada de capitais — medida que seria considerada herética e impensável há alguns anos.
Quando o Brasil adotou o IOF sobre certos tipos de investimento estrangeiro, um analista de mercado baseado em Nova York observou: “Eles estão lutando contra o mercado inteiro . Todo mundo quer estar no Brasil agora.” Deus nos livre dos entusiasmos do mercado financeiro! Já vimos, repetidas vezes, os estragos que esse tipo de entusiasmo pode produzir.
À euforia, segue-se o colapso.
Quanto maior a primeira, mais catastrófico o segundo. Ou, no popular: quanto mais alto o galho, maior a queda do macaco.
Por outro lado, macaco velho não põe a mão em cumbuca. A decisão de taxar a entrada de fluxos financeiros visa justamente a deter, ainda que em parte, a entrada de capitais de curto prazo, encarecendo a especulação com ativos denominados em reais. O objetivo do governo é dificultar a formação de bolhas especulativas no mercado cambial e na Bolsa de Valores.
Não sei se a medida será bem sucedida.
Ela requer provavelmente medidas complementares e, em especial, uma aplicação rigorosa.
Dizem que a moderna “engenharia financeira” permite contornar qualquer controle ou regulação.
Não há dúvida de que a engenhosidade da turma da bufunfa é grande. São craques em inventar formas de evasão regulatória e fiscal.
Para fazer valer as suas medidas, o governo precisa, por um lado, aplicá-las de forma inteligente e seletiva. Por outro, deve estar preparado para impor punições aos que infringirem as leis e a regulação.
Com algumas punições exemplares, bem aplicadas, os bufunfeiros, engenhosos ou não, se alinharão rapidamente.
Mas era outro o ponto que queria fazer. A onda pró-Brasil é tão grande que até uma medida controvertida como o controle de capitais foi bastante bem recebida no exterior.
Parece que o Brasil não consegue fazer nada de errado! O governo colheu vários elogios ao novo IOF, inclusive do mais importante jornal econômico da Europa, o “Financial Times”, e do codificador do famigerado “ Consenso de Washington”, o economista John Williamson.
Elogios do pai do “Consenso”! Quase pergunto: Onde foi que erramos? Realmente, começo a estranhar um pouco esse sucesso todo. Afinal, não estamos com essa bola toda. O sucesso econômico brasileiro é relativamente recente.
Os nossos indicadores sociais e educacionais são ainda muito ruins. E o próprio sucesso econômico pode conter as raízes de uma crise futura.
Por exemplo: a excessiva valorização do real pode minar de maneira grave a posição externa da economia e o seu potencial de crescimento e diversificação.
Não fosse o eterno risco de recaída no complexo de vira-lata, até recomendaria que vestíssemos as sandálias da humildade.
O mais importante, entretanto, é proteger-se contra a especulação, manter as contas públicas e externas em ordem, aplicando com rigor controles e regulamentos prudenciais.
E lembrar que, como escreveu Kipling, triunfo e desastre são impostores e devem ser tratados da mesma forma.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. é economista e diretor-executivo pelo Brasil e mais oito países no Fundo Monetário Internacional.