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segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Morreu o Décio






Foto de Arnaldo Alves,
publicada no Globo

Quando li o seu Teoria da da Guerrilha Artística, acho que foi em 65 ou 66, no Correio da Manhã, se não me engano, minha cabeça revirou. Fiquei fascinado e ao mesmo tempo sem entender bem aquilo. Em 67, em Brasília, quando conheci o poeta Hugo Mund Jr., falamos muito sobre Décio Pignatari e sobre poesia concreta. Criei meu primeiro poema concreto, “Comunicação”, que publiquei no jornal da Universidade. Depois vieram “Blow up, Blow down”, “Olho por olho” e muitos outros, sempre com Décio e os irmãos Campos como principal referência. Já em São Paulo, em 68/69, quando estava na Veja, a presença da poesia concreta foi muito grande. Fizemos boas matérias mostrando o que havia de concreto no tropicalismo, que chegamos a chamar de movimento tropiconcreto. Lembro de uma vez entrevistando o Décio em seu apartamento nas Perdizes, ele falando da superioridade de Caetano sobre Chico como poeta, comparando Resnais e Godard e também mostrando com orgulho um pedaço de grade velha, enferrujada, que tinha na parede, com destaque, como se fosse uma grande obra de arte. Era um pedaço do túmulo do Mallarmé, que ele arrancou de lembrança durante viagem à Europa. Deve ter decidido devolver ao dono...
Uma perda imensa.

sábado, 24 de setembro de 2011

Cordel Encantado, encantamento de cabo a rabo



“Assim como há gente que tem medo do novo, há gente que tem medo do antigo”, começa Augusto de Campos o seu delicioso “verso reverso controverso”. As autoras de Cordel Encantado, Thelma Guedes e Duca Rachid, mostraram que não têm medo nem do novo nem do antigo. Fizeram um trabalho preciso de valorização do nosso velho e querido Nordeste, reavivaram um dos elos mais marcantes da formação de sua cultura, o mundo medieval, e encantaram o novíssimo mundo, em novela riquíssima “de história, de texto, de direção, de interpretação, de direção de arte, figurino, cenário, produção musical e tudo mais”, como já disse aqui neste Blog (Carcará Encantado), uns quatro meses atrás. No final, apresentado ontem, o realce do maniqueísmo, também herdado da Idade Média, através da Igreja Católica, tão presente no universo nordestino, e que foi personificado principalmente por Jesuíno (“Jesus”) e Timóteo (“Respeita a Deus”). “A maldade sempre vai existir. O que nós nunca podemos esquecer, jamais, é de ter fé e esperança”, filosofa o profeta Miguezim (“Igualzim a Deus”). “O importante é a gente estar sempre junto, não é mesmo?, sabendo que pode contar uns com os outros, e lutando pelo Bem”, completa Jesuíno, em uma quase-ressurreição de Francisco Julião.
A sequência final do casal Jesuíno e Açucena (“Singela e Branca Flor”, em tupi) assistindo exibição de trovadores nordestinos foi excelente. E a frase-homenagem que as autoras escolheram para se despedir não poderia ser melhor:
ESTA OBRA É DEDICADA AOS POETAS POPULARES DO NORDESTE E AOS TROPICALISTAS QUE, A PARTIR DELES, NOS REINVENTARAM”.

domingo, 8 de agosto de 2010

Elegia, Dia dos Pais

Escolhi como presente para mim, nesse Dia dos Pais, essa animação de um dos meus poemas, "ugas(mo" (do livro "Onomatopoemas", 1978), com a música "Elegia", de Péricles Cavalcanti e Augusto de Campos, sobre trecho de poema de John Donne, cantada por Caetano Veloso. Feliz Dia dos Pais.


quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

A mente subdesenvolvida de Nelson Motta

Nelson Motta sempre procurou ter seu nome associado ao que há de mais avançado da cultura. Desde os tempos do Nelsinho que morava na Paissandu (rua do Flamengo, bairro da Zona Sul do Rio), por exemplo, ele esteve junto à nascente “bossa nova” – e escreveu um bom livro que fala disso, “Noites Tropicais”, que ainda não li todo, mas um dia vou ler. Lembro dele também presente no Tuca (teatro da PUC de São Paulo), em 68, defendendo Caetano Veloso das vaias da juventude retrógrada contra “É Proibido Proibir”, entrevistando o poeta concreto Augusto de Campos. Nelson Motta tornou-se praticamente um tropicalista de carteirinha. Participou de grandes lançamentos do mundo musical, foi, enfim, figurinha fácil no melhor do nosso mundo cultural. Apesar de tudo isso, ele outro dia escreveu um artigo (Churrasco e pizza - Não, ministro, a Itália não é nóis”, O Globo, Estadão) que revela uma cabeça típica de subdesenvolvido subserviente, bem atrasado mesmo. A sua crítica à decisão de Tarso Genro de impedir a extradição do italiano Cesare Battisti fundamenta-se principalmente no conceito de que a Itália é um país mais desenvolvido, melhor do que o Brasil, logo, a Itália está certa e o Brasil está errado. Mas Nelson Motta faz ainda pior, demonstra um primarismo histórico de arrepiar. Disse ele: “(A Itália tem) uma tradição democrática e judiciária muito mais sólida do que a nossa, não recorreu ao terrorismo de Estado, a tribunais de exceção, prisões ilegais e torturas, mesmo nos anos de chumbo". Na “tradição democrática e judiciária” italiana ele esqueceu de incluir o fascismo. Ele deveria também ler a Revista Piauí (aparentemente acima de qualquer suspeita no caso) que diz em reportagem sobre Cesare Battisti: “Havia quem argumentasse que, com leis como a dos arrependidos, a Itália dos anos de chumbo não deveria ser considerada um Estado de direito. Também na Piauí podemos ler: “Só então soube que, três meses antes, o irmão mais velho, que trabalhava na colocação de placas em estradas, havia sido atropelado e morrera. A família lhe mandara cartas com a má notícia, mas o procurador-adjunto as confiscara. Nelson Motta finaliza seu artigo dizendo que, “criado na cultura do churrasco sangrento, em cavalgada desabrida pelos pampas da História, como um anti-Garibaldi sem Anita, Tarso Genro deve estar pensando que na Itália tudo acaba em pizza”. Nelson Motta, que conhece pizza muito bem (li um artigo seu delicioso sobre a pizza do Supermercado Zona Sul, no Rio), deveria saber que a Itália com sabor de Berlusconi certamente prefere que tudo acabe em Mussolini.

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Vaias no Globo

As Organizações Globo têm vaiado o Governo Lula a plenos pulmões, de forma até selvagem. Apesar disso, aqui e ali surgem em suas páginas impressas ou eletrônicas momentos de certa serenidade e até de humor. Hoje, na capa do Globo o cartunista Chico resume muito bem a percepção geral sobre a origem das vaias. E Zuenir Ventura faz texto muito bom, que reproduzo na íntegra, salpicado de dois comentários:
“Todas as vaias são boas, inclusive as más”, dizia Nelson Rodrigues, especialista no assunto e um dos autores mais vaiados do país. Nesse sentido, as recebidas por Lula no Maracanã podem vir a lhe fazer bem, ainda que injustas e impróprias para a ocasião. Afinal, não se tratava de um comício, mas de um espetáculo esportivo que só estava acontecendo graças aos recursos (R$ 1,8 bilhão) repassados pelo governo federal. Um mínimo de civilidade recomendaria reconhecer que o presidente, além de convidado protocolar, era um dos donos da festa. Tenho visto na imprensa muitos aplausos às vaias. Cesar Maia, por exemplo, anda tão exultante que até parece ter tido alguma coisa a ver com o sucesso da manifestação que, segundo um vídeo no You Tube, foi treinada pelos convidados do ensaio geral. Mas nem assim dá para concluir, como fez o governador, que houve “armadilha”. Quem consegue orquestrar 80 mil pessoas se não estiverem a fim? (Acredito na possibilidade de orquestração, que funcionaria como um detonador, mobilizando quem estava a fim e quem apenas estava ao lado mas entrou no ritmo.) Digamos que poderia haver um clima. “A grande vaia é mil vezes (...) mais nobre do que a grande apoteose. Os admiradores corrompem”, afirmava ainda Nelson, que quase sempre tem e não tem razão, confirmando sua recusa à unanimidade e seu gosto pelo paradoxo. Ele sabia que nem todas as vaias são boas, pois há as reacionárias, que não servem como julgamento de mérito, como as que ele próprio recebeu na estréia de “Vestido de noiva” e de “Perdoa-me por me traíres”. Ao lado do Maracanã mesmo, no Maracanãzinho, houve uma outra famosa, dada a ninguém menos que Tom Jobim e Chico Buarque pelo clássico “Sabiá”. Ainda no plano das vaias artísticas, houve outra, e essa deixou Nelson indignado. Foi quando Caetano Veloso recebeu apupos, ovos e tomates no III Festival da Canção de 1968, ao tentar cantar “É proibido proibir”. Já no ano anterior ele fora vaiado por uma das mais belas canções da época: “Alegria, alegria”. Com rara coragem, Caetano afrontou uma agressiva histeria com um discurso inesquecível. “Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder?”, gritou, mais alto do que a gritaria geral. (Na platéia, se não me engano, estavam Nelson Motta e Augusto de Campos, indignados com a juventude atrasada. Foi um momento importante, que ajudou a dar impulso ao movimento tropiconcreto, um dos movimentos mais felizes de nossa cultura. Redações mais de vanguarda, como Jornal da Tarde e - quem diria! - Veja, passaram a apoiar o movimento que surgia.) Sobre o quase linchamento promovido pelos jovens “pra frente”, Nelson, o reacionário, escreveu: “A vaia selvagem com que o receberam [a Caetano] já me deu uma certa náusea de ser brasileiro”. Quanto às vaias políticas, são diferentes, e os governantes têm que estar sujeitos a elas. Escrevi lá em cima que os protestos na abertura do Pan poderiam vir a fazer bem a Lula. Talvez já tenham feito, obrigando-o a sair do pedestal, a descer do salto alto. As suas declarações sobre o incidente são de uma humildade que contrasta com a costumeira arrogância de antes. Que ele compreenda também agora que, apesar de injustas, as vaias do Maracanã acabaram fazendo justiça, se não ao conjunto de sua obra, pelo menos a uma parte dela — a que teima em proteger a impunidade.