segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Classe Média X Lula

As eleições passadas demonstraram e as chamadas "crises" recentes confirmam que está se formando um fosso quase intransponível entre Lula e a Classe Média. Obviamente, essa intolerância está sendo estimuladas por grupos oposicionistas e está longe de levar a índices de reprovação ao Governo que sejam superiores aos índices de aprovação popular. Mas é sempre bom para o Governo estar alerta. Garotinho, ex-Governador do Rio de Janeiro, costumava se preocupar com a rejeição que tinha na Classe Média - até que desistiu. Ele dizia: "Sou do Interior, não sou elegante, sou casado, tenho família, tenho 9 filhos, sou evangélico, não bebo, não fumo e não cheiro - a Classe Média nunca vai me aceitar!" Deu no que deu. A Folha de hoje publica análises da última pesquisa Datafolha e reproduzo aqui a entrevista de Leandro Beguoci com José Murilo de Carvalho, "Classe média se divorciou de Lula":
FOLHA - As vaias na abertura do PAN, o movimento "Cansei" e o desgaste com o caos aéreo são sinais são sinais de que acabou a lua-de-mel entre Lula e a classe média?
JOSÉ MURILO DE CARVALHO - A lua de mel com a classe média já tinha acabado desde a última eleição. As vaias são a manifestação pública do divórcio.
FOLHA - Quais são as conseqüências para o governo, a curto e médio prazo, da insatisfação? E para o PT?
CARVALHO - Alguém disse muito bem que já se pode ganhar eleição sem classe média, mas é difícil governar sem ela. A classe média não pode ser conquistada com Bolsa Família nem com aumentos de salário mínimo. E ela é a senhora da opinião pública. Se quiser evitar mais turbulência, o governo terá que aplacá-la de algum modo.
FOLHA - O PT e a CUT traçam paralelo entre movimentos insatisfeitos com Lula e organizações apoiadoras do golpe de 1964. Há quem compare o "Cansei" à "Marcha da Família". O que o sr. acha disso? CARVALHO - Retórica. Dificuldade de aceitar oposição. Dificuldade de entender que há um Brasil importante entre o povão e os banqueiros.
FOLHA - Há alguma chance de o "Cansei" ganhar força a ponto de se tornar um grupo comparável ao MST durante o governo FHC?
CARVALHO - Não. A classe média foi para as ruas em 1964 movida por razões religiosas e políticas, como o anticomunismo, muito fortes, que tinham respaldo popular. Voltou na campanha das Diretas e na do impeachment do presidente Fernando Collor, também com respaldo popular. Agora, esse respaldo é improvável. O apagão ético e o apagão aéreo ajudam a desmoralizar o governo, mas não despertam a reação das classes mais pobres.
FOLHA - O presidente disse que a oposição está brincando com a democracia e que ele sabe, como ninguém, colocar gente nas ruas. Qual o significado das declarações?
CARVALHO - É uma ameaça explícita. É o que [o presidente] Hugo Chávez fez e está fazendo na Venezuela.
FOLHA - Lula também disse que só os pobres poderiam estar bravos, já que os ricos ganharam muito dinheiro com seu governo. Isso é uma forma de "getulismo" escancarado?
CARVALHO - As afirmações do presidente nunca primaram pela coerência. A política econômica tem, sim, favorecido, e muito, o setor financeiro e bastante o povão, mas não a classe média, que está espremida entre o tostão e o milhão. E é ela que está mais descontente.