terça-feira, 25 de julho de 2006
Com o fracasso de Doha, trocaram vidas por bananas – ou melhor deram banana...
O fracasso de Doha pode agradar a quem torce contra a política externa de Lula. Mas a verdade é que significa acima de tudo um desalento para as populações pobres de todo o mundo. Abro espaço aqui para uma análise feita por Hayle Melim Gadelha, que acaba de ter nota 10 em sua monografia sobre o tema para a Faculdade de Administração da UFRJ.
"O liberalismo pouco mudou desde Adam Smith. No discurso, em forma de leis supostamente naturais, promete o impossível: a pujança econômica a todos aqueles que o seguirem. Tratados desiguais, já no século XVIII, possibilitavam à Inglaterra conquistar o mundo e servir de vitrine para sua doutrina de livre concorrência. Na prática, o liberalismo também não mudou – continua inexistente. No mesmo século XVIII, a Inglaterra já proibia a exportação de máquinas e até de técnicos; as Lei dos Cereais e as chamadas Leis dos Pobres serviriam para – vejam só – proteger os altos investimentos feitos no campo durante o bloqueio napoleônico. A história repete-se. O Acordo Constitutivo da OMC e a Declaração de Doha ressaltam a distribuição dos benefícios advindos do liberalismo. Mas os países ricos, que, graças à proteção de suas técnicas mais avançadas, já têm larga vantagem nas relações de troca, não se dispuseram sequer a concorrer livremente com os produtos primários. Pelo menos, no tempo de David Ricardo, trocavam-se panos por vinho. Hoje, não. Gasta-se a escandalosa quantia de 1 trilhão de dólares anuais em subsídios. O fracasso da rodada cujo apelido era Rodada do Desenvolvimento é emblemático.
Se o Brasil quiser um lugar na ordem internacional, está claro que não deve esperar nada do modelo atual. Exercitando o otimismo: se o Brasil e seus parceiros não tivessem fundado o G-20, a maior conquista da política externa de Lula e Amorim, as decisões continuariam tomadas pelo QUAD (EUA, Canadá, EU e Japão) e Doha poderia ter sido um sucesso... para os países ricos. E, como provavelmente teria ocorrido há poucos anos, o Brasil ainda participaria da foto, comemorando um suposto triunfo do (neo?)liberalismo. Fica nítido, portanto, que o caminho agora é uma política de Estado que priorize a integração regional e faça parcerias comerciais com outros grandes estados em desenvolvimento. Na política comercial, como já disse um diplomata brasileiro “há muito mais do que batatas e bananas em jogo. Há a vida das pessoas.”. E como se nota, nenhum país nunca se tornou poderoso nem melhorou a vida das pessoas praticando de fato o liberalismo."