Toda vez que leio manchetes como a que o jornal O Globo publica hoje lembro das palavras de seu colunista Merval Pereira, em defesa da atuação da mídia na última campanha política: “Culpam as reportagens pelos fatos que retrataram”. Vejamos a manchete do Globo: “Educação faz Brasil perder posição no ranking da ONU”. E vamos aos fatos: o Brasil subiu na pontuação do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano feito pela ONU) 2006 passando de 0,788 para 0,792, mas houve uma mudança no critério para calcular os dados de educação, com exclusão dos números dos programas de educação para adultos que existem em 32 países. O objetivo da mudança foi uniformizar os cálculos para todos os países, e levou o Brasil a cair uma posição no ranking, de 68º para 69º lugar. A educação ainda está muito mal, ninguém tem dúvida, e precisa avançar muito. Mas o próprio texto interno da reportagem diz que “a educação ainda é a variável em que o Brasil é mais bem avaliado”. A meu ver, manchete que melhor “retrataria os fatos” seria: “Brasil cresce em desenvolvimento humano, mas mudança de critérios da ONU com relação à educação faz país cair no ranking mundial”. É longa? Sem dúvida, mas retrata melhor os fatos. Ou fazer como o próprio site do PNUD-Brasil (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) que diz: “Brasil melhora IDH, mas cai 1 posição no ranking mundial”. E o fato principal, aliás, pode ser outro: o Relatório de Desenvolvimento Humano elogia o Brasil no combate à desigualdade, chegando a citar o Bolsa-Família . Diz a manchete do site do PNUD-Brasil: “Brasil reduz a desigualdade de renda e sobe no ranking - Relatório do PNUD vê país como exemplo de que problema pode ser combatido; mesmo com avanços, distribuição de renda é a 10ª pior” (antes era a segunda pior). E diz mais: “Apontado até o Relatório de Desenvolvimento Humano 2005 como referência de desigualdade, o Brasil é apresentado no RDH 2006 como exemplo de melhoria na distribuição de renda”. E no RDH 2006 podemos ler “A boa notícia é que a desigualdade extrema não é algo imutável. Nos últimos cinco anos, o Brasil, um dos países mais desiguais do mundo, tem combinado um sólido desempenho econômico com declínio na desigualdade de rendimentos (segundo fontes nacionais, o índice de Gini desceu de 56 em 2001 para 54 em 2004) e na pobreza. O crescimento econômico criou emprego e aumentou os salários reais. E um vasto programa de bem-estar social — a Bolsa Família — fez transferências financeiras para 7 milhões (já são 11 milhões) de famílias que vivem em pobreza extrema ou moderada para apoiar a nutrição, a saúde e a educação, criando benefícios hoje e ativos para o futuro”. Essas palavras precisam ser valorizadas, não para bajular o Governo Lula, mas como estímulo a qualquer trabalho que combata a desigualdade.