segunda-feira, 3 de março de 2008

Eleição americana: Zogby repete este Blog

John Zogby é um dos principais pesquisadores de eleições presidenciais dos Estados Unidos e dono do instituto de pesquisas que leva seu sobrenome. Hoje, na Folha, tem uma entrevista sua exclusiva, feita por telefone ao enviado especial Sérgio Dávila. Ele considera que "Hillary está em séria desvantagem", mas que "tudo pode acontecer". Ele declara também que "o democrata que conseguir tirar latinos e jovens de casa para votar poderá virar a eleição a seu favor" e mais: "é seguro dizer que, nas eleições gerais, a maior parte dos eleitores que hoje vota na senadora migrará para Obama se for o escolhido do partido. O mesmo não pode ser dito na situação oposta". Palavras semelhantes às ditas neste Blog na postagem "Eleição americana: somente Obama pode derrotar McCain", de 7 de fevereiro: "Se Hillary vencer as prévias, o partido perderá o fervor e o vigor que Obama trouxe para as ruas. Esse novo eleitor, vibrante, jovem, multirracial, aguerrido, de todos os matizes, dificilmente terá a mesma disposição para defender Hillary que está tendo na campanha de Obama". A entrevista completa:
ENTREVISTA DA 2ª, COM JOHN ZOGBY, POR SÉRGIO DÁVILA
FOLHA - Baseado no que o sr. levantou até agora, quem vai ser o candidato dos democratas?
ZOGBY - Aprendi a não fazer esse tipo de previsão [risos]. Quando faço, as pessoas me levam muito a sério, o que sempre resulta em problemas para mim. No momento em que conversamos, o mais longe que posso ir é dizer que está claro que Barack Obama tem uma vantagem. E que Hillary Clinton está em séria desvantagem. Mas os eleitores têm desafiado o senso comum na corrida presidencial deste ano, então tudo pode acontecer.
FOLHA - O que leva à próxima pergunta: por que as pesquisas têm ido tão mal nestas eleições?
ZOGBY - Há várias razões, mas a principal é o índice recorde de comparecimento. Há muito eleitor novo comparecendo às urnas, e nem sempre é possível captar essa dinâmica nas pesquisas. Em segundo lugar, há um grande número de pessoas que decide o voto só no dia. Nas prévias de New Hampshire, foram 18% os que decidiram no dia. É muito. A terceira razão tem a ver com o mundo em que vivemos em 2008. Nas outras eleições, as pessoas ouviam o noticiário e, em 48 horas, reagiam a ele. Então talvez houvesse uma mudança na opinião pública. Hoje, as pessoas têm acesso à informação tão rápida e facilmente que é possível que Hillary Clinton apareça com olhos lacrimejantes numa segunda-feira de manhã, as pessoas a vejam à tarde, e isso tenha impacto no jeito que elas votam na terça-feira. [Ao episódio em que Hillary se emocionou antes das prévias e após a derrota em Iowa é atribuída grande parte de sua vitória em New Hampshire. Antes disso, ela aparecia atrás de Obama nas pesquisas eleitorais.]
FOLHA - O sr. não acha que o fenômeno recente dos sites agregadores de pesquisas, como o RealClearPolitics, ajuda essa confusão? Muitos juntam no mesmo saco levantamentos feitos em datas diferentes e com metodologia e universos diferentes, o que gera uma distorção.
ZOGBY - É preciso entender que as pesquisas não são um fenômeno perfeito, temos de ter uma expectativa realista em relação a elas. Na maior parte das vezes, fazemos um bom trabalho e, de vez em quando, não tão bom. Mas não fazemos previsão, não somos adivinhos, só mostramos uma foto que captura um momento específico da corrida. Assim, não vejo grandes problemas nos agregadores de pesquisas, especialmente se usam pesquisas feitas muito próximo do dia da eleição. O problema é quando pegam uma feita hoje e uma há seis semanas e tiram a média.
FOLHA - Suas pesquisas confirmam a impressão de que Obama parece entrar cada vez mais em redutos tradicionais de Hillary, como o universo das mulheres brancas mais velhas e o dos eleitores de baixa renda.
ZOGBY - Sim, mas há outro fenômeno que captamos e que é pouco comentado. É seguro dizer que, nas eleições gerais, a maior parte dos eleitores que hoje vota na senadora migrará para Obama se for o escolhido do partido. O mesmo não pode ser dito na situação oposta.
FOLHA - O senador gosta de dizer que tem a capacidade de transformar Estados historicamente "vermelhos" (republicanos) em "azuis" (democratas) e assim bater McCain. O sr. concorda?
ZOGBY - Não sei se ele tem a capacidade de mudar a cor dos Estados, mas sei que muitos Estados tradicionalmente republicanos terão dificuldade em votar em John McCain, pois ele é muito progressista. Talvez Obama aproveite isso. Isso pode ser verdade especialmente no sul, tradicionalmente republicano, onde a questão racial pode influir também.
FOLHA - Fala-se muito também que o voto latino e o voto jovem podem decidir essas eleições. O que há de verdade nisso?
ZOGBY - Muita, nos dois casos. Só depende do índice de comparecimento nas eleições de novembro desses dois grupos, que é historicamente baixo. E ambos são votos fortemente democratas no momento. Ou seja, o democrata que conseguir tirar latinos e jovens de casa para votar poderá virar a eleição a seu favor. Ele vai precisar muito desse voto, de um comparecimento em massa.
FOLHA - Nas eleições presidenciais de 2004, vários grupos conservadores conseguiram colocar nas cédulas estaduais plebiscitos sobre casamento de mesmo sexo e direito ao aborto como maneira de tirar o eleitor conservador de casa para votar contra. Isso ajudou a dar a vitória a Bush. O sr. vê o mesmo acontecendo nestas eleições em relação à questão dos imigrantes ilegais?
ZOGBY - Se acontecer, os dois grupos de que falamos ganharão ainda mais importância. Uma proposta antiimigração poderá levar a uma retaliação, uma resposta entre os latinos e os jovens, que são mais progressistas -e aí tirará esses dois grupos de casa para votar. Pode vir a ser um tiro pela culatra para os republicanos.
FOLHA - Ao mesmo tempo, segundo pesquisa recente de seu instituto, a maioria dos eleitores norte-americanos vê a imigração ilegal sob uma ótica negativa. Isso não pode influenciar a postura dos candidatos?
ZOGBY - Não creio. Primeiro porque, ironicamente, de todos os pré-candidatos republicanos, os eleitores escolheram o mais progressista em relação ao tema, que é John McCain. Segundo porque sempre achei que a questão da imigração ilegal é "perdedora" por natureza para os conservadores. O candidato que defende uma posição mais dura em relação a ela pode ganhar votos em alguns distritos congressionais fortemente conservadores, mas esse pequeno ganho é nada comparado ao que ele perderá entre o voto latino. E esse voto teve um crescimento não só em número absoluto mas também em energia e mobilização. Lembro-me sempre da reação que os latinos tiveram em 1994 na Califórnia, quando os eleitores tiveram de votar sim ou não à chamada proposta 187, que proibia imigrantes ilegais de ter acesso a serviços públicos como escola e hospitais. A proposta passou com vitória apertada, virou lei, mas foi revogada pela Justiça por inconstitucional. Só que o Partido Republicano na Califórnia ficaria marcado para sempre por ela.
FOLHA - Ainda assim, pesquisas de boca-de-urna feitas nas principais primárias até agora mostram que a preocupação principal do eleitor não é a imigração ilegal, mas a economia, seguida num distante segundo lugar pela Guerra do Iraque. A imigração vem em terceiro.
ZOGBY - É verdade. Mas há um elemento da questão imigratória que se confunde com a economia. É difícil separar, embora haja também um elemento que tem a ver com justiça e tradição. O principal aspecto desse tema, no entanto, não é tanto o número de pessoas que o escolhe como uma questão importante, mas a intensidade entre os que o escolhem. É muito intenso no lado conservador e igualmente no hispânico.
FOLHA - Por fim, em quais pesquisas o sr. confia mais, nas nacionais ou nas locais?
ZOGBY - De modo geral, se você olha ao longo dos anos, há uma estabilidade maior entre o eleitor nacional que entre o eleitor eventual de uma primária.