quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Bye, bye, Serra


Hoje foi tudo de ruim para Serra. Começou com o Datafolha iniciando alinhamento, obrigando a Folha a reconhecer na primeira página que Dilma não estava em queda. Depois teve a reportagem da mesma Folha com o flagrante do papo telefônico entre Serra e Gilmar (que absurdo!). O dia continuou tarde afora, com o TSE mandando 8 a 0 na maluquice dos dois documentos. E a noite foi ainda mais preocupante para Serra com a comparação entre os programas finais. Serra cantarolando foi uma coisa horrorosa, enquanto o de Dilma foi grandioso e emocionante, gran finale.
Agora só falta o debate da Globo. Que deverá ser meio mais ou menos – para desespero de Serra e até de Marina.

“Alô, Gilmar, me arranja uns votos aí...”




É a própria Folha que coloca em manchete: “Após falar com Serra, Mendes para sessão”. A reportagem refere-se ao telefonema que Serra deu ao Ministro Gilmar Mendes no início da tarde de ontem – a mesma tarde em que o Supremo decidia se mantinha ou não a exigência de dois documentos para o o povo poder votar. Tiveram uma boa conversa: “Ao telefone, Serra cumprimentou o interlocutor como ‘meu presidente’. Durante a conversa, caminhou pelo auditório”, diz a Folha. Mais tarde, quando a votação de 7x0 garantia o fim da exigência, Gilmar Mendes parou a sessão, com o argumento de precisar vista do processo. Os dois alegam que não houve o telefonema que a reportagem da Folha testemunhou. Isso comprova apenas o desespero tucano, ciente de que entrou linha cruzada no falatório do segundo turno. Querem compensar a falta de votos em tucanos forçando a falta de eleitores de Dilma no dia 3. Tentaram ganhar na baixaria e agora tentam no tapetão telefônico. Alô, alô, Serra, seu futuro está por um fio!
Reportagem de Moacyr Lopes Junior (que fez a foto), Catia Seabra, Felipe Seligman e Larissa Guimarães

Arthur One

Morreu Arthur Penn. O grande diretor de filmes como  “Bonnie e Clyde”, “The left-handed gun”, “Pequeno Grande Homem” ou “Caçada humana”. Em sua homenagem, esse trecho do excelente Mickey One, com Warren Beatty.


quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Rio Branco e Amorim, referências para o Brasil no mundo

 Excelente texto de João Daniel (que também é do Curso Clio) para a Folha.


Barão do Rio Branco x Celso Amorim
João Daniel Lima de Almeida
Especial para a Folha
Não é trivial que, 98 anos após o falecimento do patrono da diplomacia brasileira --em pleno Carnaval, é bom lembrar-- um chanceler tenha finalmente ultrapassado-o em tempo de permanência no cargo, ainda que de modo não-contínuo.
Ousar comparar os períodos do barão do Rio Branco (1902-12) e de Celso Amorim (1993-4 e 2003-10) há de levantar criticas. Críticas metodológicas, pois os puristas recusam a possibilidade de comparar períodos tão distintos da história nacional, e críticas político-ideológicas, naturais quando se tratam de personalidades vivas e atuantes, ainda mais se ombreadas à ícones, como é o caso do Barão. Ciente dos riscos, assumo a tarefa.
Três foram os principais desafios enfrentados pelo Barão do Rio Branco no período de sua chancelaria ao longo de quatro presidentes (Rodrigues Alves, Afonso Pena, Nilo Peçanha e Hermes da Fonseca): 1) A rivalidade com os argentinos; 2) A defesa contra o imperialismo europeu; e, 3) A resolução dos problemas de limites brasileiros.
O primeiro problema permaneceria mesmo após sua gestão, e muitas das tentativas do Barão em equalizá-lo não deram resultados de curto prazo. Com nosso principal vizinho multiplicaram-se tensões comerciais, de imigração e até militares, como se viu no episódio do reaparelhamento naval do Brasil.
O segundo problema foi significativamente equacionado ao longo de sua gestão. Não desapareceu, mas diminui dramaticamente. O Brasil passa a ser respeitado na Europa e não se repetem episódios como o da ocupação brasileira da Ilha de Trindade pelos ingleses (1895) ou intervenção naval como a que ocorreu durante a revolta da Armada (1893) ou anos depois, na Venezuela (1902). No episódio conhecido como "O Caso Panther", a maior potência militar do mundo, a Alemanha, pediu desculpas ao Brasil por ter desembarcado marinheiros em território nacional sem autorização. O Brasil de Rio Branco não seria tratado como uma colônia européia.
É no triunfo sobre o terceiro problema que repousam os louros e glórias de José Maria da Silva Paranhos Jr. Sucesso é pouco! Se até hoje falamos 1 barão para se referir a mil cruzeiros, se o nome da capital do Acre, da principal avenida do centro do Rio de Janeiro e da prestigiosa escola diplomática brasileira levam seu nome, se o carnaval de 1912 foi interrompido por sua morte, é sobretudo porque, graças a ele, o Brasil é o único pais do mundo que, tendo dimensões continentais, não tem problemas de fronteiras com seus vizinhos. Em menos de 10 anos todas foram negociadas de modo pacífico, sem recurso às armas.
Duas estratégias foram essenciais para estes sucessos: 1) O americanismo e 2) a diplomacia do prestígio. E são essas estratégias que permitem melhor a comparação entre o Barão e Celso Amorim, já que, é claro, nossos objetivos de inserção internacional mudaram em um século.
A construção de uma 'aliança especial' informal com os EUA, à época maior comprador do nosso café, permitiu ao Brasil se beneficiar pragmaticamente nas disputas regionais. A Doutrina Monroe norte-americana garantiria proteção diplomática e, eventualmente militar, contra o imperialismo. A neutralidade norte-americana garantiu que o Barão não tivesse que se preocupar com intervenções estadunidenses em nossas questões de fronteiras. Exemplo paradigmático dessa estratégia foi o caso do Acre, arrendado pelos bolivianos à uma empresa de capital norte-americano (Bolivian Syndicate) foi indenizada pelo Brasil antes que isso pudesse chamar atenção do governo de Washington. Hoje, se o barão estivesse vivo, se aproximaria da China, da Índia, da África do Sul, que ocupam papel análogo de potências emergentes no cenário internacional. A diferença é que, no primeiro caso, havia assimetria clara de poder desfavorável ao Brasil. Hoje o Brasil quer fazer parte do clube de modo igualitário.
Já a "diplomacia do prestígio" ecoa até hoje na boca do nosso novo recordista do século 21. Superamos o "complexo de vira-latas". A melhora da imagem internacional do Brasil à época significou a abertura (ou reabertura, dado que Campos Salles, por economia de recursos havia fechado várias) de novas legações no exterior, além de estimular a criação de legações estrangeiras no Rio de Janeiro. Hoje o foco está na África e Ásia, onde cada nova embaixada (dezenas foram abertas) representa um voto potencial para as pretensões políticas brasileiras em foros multilaterais. A participação do Brasil em conferências internacionais (como a famosa conferência de Haia, na qual Rui Barbosa foi nosso delegado), tendo o Brasil sediado várias delas guarda analogias com as variadas siglas (BRIC, IBAS, ASPA, CASA, etc..) e Gês dos quais o Brasil faz parte hoje. O primeiro cardeal brasileiro (Joaquim Arcoverde) e as amplas reformas urbanas e sanitárias da capital com Pereira Passos e Oswaldo Cruz para "civilizar" o Rio de Janeiro, a vitória no concurso de arquitetura na exposição de Saint Louis com o Palácio Monroe (desmontado no governo Geisel), guardam hoje paralelo importante com a conquista da sede da Copa e das Olimpíadas.
Política externa é política de Estado, não de governo. No Brasil, o Itamaraty é o mais perto que se conseguiu chegar de uma burocracia de tipo weberiano e isso é garantia de continuidades, mais que de rupturas, na história de nossa política exterior. É como guiar um transatlântico, onde correções de rumo devem ser planejadas cuidadosamente com o olhar em cartas e instrumentos cuja trajetória futura é o guia do presente, ao contrário do Jet Ski ou da lancha, escravas da conjuntura e dos metros seguintes. Nesse leme, dez anos é muito tempo e os resultados de longo prazo. Se o barão serviu de paradigma por mais de meio século (seu legado durou, no mínimo, até a PEI em 1961), me parece que o atual modelo de inserção internacional brasileiro veio para ficar e guiará o Brasil no século XXI. Não como "vira-latas" do passado, ou como os rottweillers e Pitt-bulls americanos e soviéticos da guerra-fria, mas como um São Bernardo, grande e pacífico, respeitado por seus méritos e prestígio e não somente por sua força.
João Daniel Lima de Almeida é mestre em Relações Internacionais pela PUC-RJ

Mais uma baixaria burra: quem será o interessado?


Recebi e-mail com o título “Vote no meu sobrinho Crivella. E você estará votando em mim!” Geralmente nem leio esse tipo de mensagem, mas essa era uma novidade, seria do próprio Edir Macedo, líder da Igreja Universal, pedindo voto para Crivella (PRB), candidato à reeleição ao Senado pelo Rio de Janeiro. Fui ver os detalhes da baixaria. “Ele é o meu herdeiro na Universal! A Revista Veja confirma. (...) A Igreja Universal é rica, mas precisa de poder político para ampliar o nosso império! E votando Crivella você ajuda a aumentar meu patrimônio. Ô Gloria (...)  Vamos pedir votos. Aprenda as minhas técnicas de arrecadação de dinheiro!! (...)  Vote Crivella! Vote na Universal!” O texto inclui outras bobagens e conclui: “Espalhe esta mensagem para todos amigos. Vamos acabar com o projeto político da Universal!”
O e-mail vem com o óbvio “noreply”, a partir de site sediado nos Estados Unidos. Quem se interessaria por isso? Aparentemente, os beneficiados mais próximos seriam Cesar Maia (DEM) e Jorge Picciani (PMDB), empatados em terceiro lugar na disputa liderada por Lindberg (PT) e Crivella pelas duas vagas ao Senado. Só não acredito que sejam eles os autores porque a baixaria é muito burra, semelhante às dos tucanos contra Dilma. A mensagem só sensibiliza quem já não vota em Crivella de forma alguma. O eleitorado de Crivella é perfil povão e fiel (sem trocadilho), e dizer que Edir Macedo apoia Crivella só faz reforçar essa fidelidade. Em vez de gastar dinheiro com estruturas americanas para baixaria inútil, os adversários têm que ir pra rua e falar direto com o povo. Aliás, os programas eleitorais dos quatro principais candidatos são muito bons (o do Picciani é o melhor), não precisam dessa burrice

terça-feira, 28 de setembro de 2010

O voto útil entra em campo

Cada dia que passa, fica mais difícil haver segundo turno. Dilma continua na faixa dos 55% ou 56% na simulação de votos válidos, com Serra e Marina empacados na faixa dos 28% e 14%. Ou seja, não aconteceu ainda nada capaz de alterar profundamente o quadro. Acrescente-se a isso o fenômeno típico da véspera da eleição, que é a opção pelo voto útil. Ninguém quer “perder” o voto, e parte do eleitorado, indefinido, vota em quem tem mais chances de vencer. Dilma só tem a ganhar com isso. Mas é preciso estimular o voto útil: clima de vitória nas ruas e nos programas eleitorais que restam, bandeiras, muita agitação positiva, Lula e Dilma com grande emoção (atenção, emoção pra cima!). Depois é só correr pro abraço: a comemoração de domingo será em vários turnos.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

The Independent trata Dilma como "a mulher mais poderosa do mundo" e Serra como "um homem enfadonho de centro"

Essa reportagem (The former guerrilla set to be the world's most powerful woman) saiu no jornal britânico The Independent e foi traduzida no Carta Maior (Jornal inglês diz que Dilma é "uma líder extraordinária"). Excelente.

Ex-guerrilheira prestes a se tornar a mulher mais poderosa do mundo
Hugh O'Shaughnessy - The Independent

A mulher mais poderosa do mundo começará a andar com as próprias pernas no próximo fim de semana. Forte e vigorosa aos 63 anos, essa ex-líder da resistência a uma ditadura militar (que a torturou) se prepara para conquistar o seu lugar como Presidente do Brasil.
Como chefe de estado, a Presidente Dilma Rousseff seria mais poderosa que a Chanceler da Alemanha, Angela Merkel e que a Secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton: seu país enorme de 200 milhões de pessoas está comemorando seu novo tesouro petrolífero. A taxa de crescimento do Brasil, rivalizando com a China, é algo que a Europa e Washington podem apenas invejar.
Sua ampla vitória prevista para a próxima eleição presidencial será comemorada com encantamento por milhões. Marca a demolição final do “estado de segurança nacional”, um arranjo que os governos conservadores, nos EUA e na Europa uma vez tomaram como seu melhor artifício para limitar a democracia e a reforma. Ele sustenta um status quo corrompido que mantém a imensa maioria na pobreza na América Latina, enquanto favorece seus amigos ricos.
A senhora Rousseff, filha de um imigrante búlgaro no Brasil e de sua esposa, professora primária, foi beneficiada por ser, de fato, a primeira ministra do imensamente popular Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ex-líder sindical. Mas com uma história de determinação e sucesso (que inclui ter se curado de um câncer linfático), essa companheira, mãe e avó será mulher por si mesma. As pesquisas mostram que ela construiu uma posição inexpugnável – de mais de 50%, comparado com menos de 30% - sobre o seu rival mais próximo, homem enfadonho de centro, chamado José Serra. Há pouca dúvida de que ela estará instalada no Palácio Presidencial Alvorada de Brasília, em janeiro.
Assim como o Presidente Jose Mujica do Uruguai, vizinho do Brasil, a senhora Rousseff não se constrange com um passado numa guerrilha urbana, que incluiu o combate a generais e um tempo na cadeia como prisioneira política.
Quando menina, na provinciana cidade de Belo Horizonte, ela diz que sonhava respectivamente em se tornar bailarina, bombeira e uma artista de trapézio. As freiras de sua escola levavam suas turmas para as áreas pobres para mostrá-las a grande desigualdade entre a minoria de classe média e a vasta maioria de pobres. Ela lembra que quando um menino pobre de olhos tristes chegou à porta da casa de sua família ela rasgou uma nota de dinheiro pela metade e dividiu com ele, sem saber que metade de uma nota não tinha valor.
Seu pai, Pedro, morreu quando ela tinha 14 anos, mas a essas alturas ele já tinha apresentado a Dilma os romances de Zola e Dostoiévski. Depois disso, ela e seus irmãos tiveram de batalhar duro com sua mãe para alcançar seus objetivos. Aos 16 anos ela estava na POLOP (Política Operária), um grupo organizado por fora do tradicional Partido Comunista Brasileiro que buscava trazer o socialismo para quem pouco sabia a seu respeito.
Os generais tomaram o poder em 1964 e instauraram um reino de terror para defender o que chamavam “segurança nacional”. Ela se juntou aos grupos radicais secretos que não viam nada de errado em pegar em armas para combater um regime militar ilegítimo. Além de agradarem aos ricos e esmagar sindicatos e classes baixas, os generais censuraram a imprensa, proibindo editores de deixarem espaços vazios nos jornais para mostrar onde as notícias tinham sido suprimidas.
A senhora Rousseff terminou na clandestina VAR-Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária Palmares). Nos anos 60 e 70, os membros dessas organizações sequestravam diplomatas estrangeiros para resgatar prisioneiros: um embaixador dos EUA foi trocado por uma dúzia de prisioneiros políticos; um embaixador alemão foi trocado por 40 militantes; um representante suíço, trocado por 70. Eles também balearam torturadores especialistas estrangeiros enviados para treinar os esquadrões da morte dos generais. Embora diga que nunca usou armas, ela chegou a ser capturada e torturada pela polícia secreta na equivalente brasileira de Abu Ghraib, o presídio Tiradentes, em São Paulo. Ela recebeu uma sentença de 25 meses por “subversão” e foi libertada depois de três anos. Hoje ela confessa abertamente ter “querido mudar o mundo”.
Em 1973 ela se mudou para o próspero estado do sul, o Rio Grande do Sul, onde seu segundo marido, um advogado, estava terminando de cumprir sua pena como prisioneiro político (seu primeiro casamento com um jovem militante de esquerda, Claudio Galeno, não sobreviveu às tensões de duas pessoas na correria, em cidades diferentes). Ela voltou à universidade, começou a trabalhar para o governo do estado em 1975, e teve uma filha, Paula.
Em 1986 ela foi nomeada secretária de finanças da cidade de Porto Alegre, a capital do estado, onde seus talentos políticos começaram a florescer. Os anos 1990 foram anos de bons ventos para ela. Em 1993 ela foi nomeada secretária de minas e energia do estado, e impulsionou amplamente o aumento da produção de energia, assegurando que o estado enfrentasse o racionamento de energia de que o resto do país padeceu.
Ela fez mil quilômetros de novas linhas de energia elétrica, novas barragens e estações de energia térmica construídas, enquanto persuadia os cidadãos a desligarem as luzes sempre que pudessem. Sua estrela política começou a brilhar muito. Mas em 1994, depois de 24 anos juntos, ela se separou do Senhor Araújo, aparentemente de maneira amigável. Ao mesmo tempo ela se voltou à vida acadêmica e política, mas sua tentativa de concluir o doutorado em ciências sociais fracassou em 1998.
Em 2000 ela adquiriu seu espaço com Lula e seu Partido dos Trabalhadores, que se volta sucessivamente para a combinação de crescimento econômico com o ataque à pobreza. Os dois se deram bem imediatamente e ela se tornou sua primeira ministra de energia em 2003. Dois anos depois ele a tornou chefe da casa civil e desde então passou a apostar nela para a sua sucessão. Ela estava ao lado de Lula quando o Brasil encontrou uma vasta camada de petróleo, ajudando o líder que muitos da mídia européia e estadunidense denunciaram uma década atrás como um militante da extrema esquerda a retirar 24 milhões de brasileiros da pobreza. Lula estava com ela em abril do ano passado quando foi diagnosticada com um câncer linfático, uma condição declarada sob controle há um ano. Denúncias recentes de irregularidades financeiras entre membros de sua equipe quando estava no governo não parecem ter abalado a popularidade da candidata.
A Senhora Rousseff provavelmente convidará o Presidente Mujica do Uruguai para sua posse no Ano Novo. O Presidente Evo Morales, da Bolívia, o Presidente Hugo Chávez, da Venezuela e o Presidente Lugo, do Paraguai – outros líderes bem sucedidos da América do Sul que, como ela, têm sofrido ataques de campanhas impiedosas de degradação na mídia ocidental – certamente também estarão lá. Será uma celebração da decência política – e do feminismo.
Tradução: Katarina Peixoto

Corvo versus Tucorvo: a disputa ensandecida pelo distante segundo lugar



Esse Blog há décadas fala que Marina e Serra trocam votos entre si, não com Dilma. Mas as campanhas oposicionistas, principalmente a de Serra, sonhavam com a possibilidade de Marina, por ser ex-petista, tirar votos de Dilma, e com isso levar a eleição para segundo turno. Marina também parecia (ou parece, ainda) pensar assim. Verde ilusão. O perfil eleitoral tanto de Marina quanto de Serra é principalmente de classe média conservadora do Sul e do Sudeste, enquanto o de Dilma é popular, povão, sintonizado escancaradamente com Lula. Foi por esse motivo que as denúncias de Serra tornaram-se vazias, elas não ecoavam junto ao eleitorado dilmista. Marina, espertamente, preferiu pegar carona nas denúncias tucanas com uma linguagem de “santa”, colocando-se acima do bem e do mal. Teve sucesso junto ao eleitor serrista menos truculento e junto aos indecisos/nulos/brancos. Resultado: Marina oscilou pra cima, Serra oscilou pra lá e pra cá, o não-voto caiu ligeiramente e Dilma queimou um pouco da gordura. A menos de uma semana da eleição, há pouco o que alterar nas táticas que possam determinar segundo turno. Marina deve manter o seu trololó, que pode – quem sabe – levá-la a ultrapassar José Serra. Dilma deve manter sua íntima relação com o Governo Lula e provavelmente deve aumentar o clima vitorioso. A Serra só resta o desespero.
Mesmo sem o segundo turno, conquistar o segundo lugar é muito importante, tanto para Marina quanto para Serra. Como segundo colocada, Marina poderá apresentar-se a partir de 2011 como alternativa a Aécio (centro-direita) no campo da oposição, ocupando um bom espaço centrista. Para Serra, o segundo lugar poderá significar o último colete salva-vidas de sua sobrevivência política. Para os próximos dias, espera-se um salve-se quem puder.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Oposição agora busca na abstenção sua tábua de salvação


A Oposição, no seu pânico eterno, volta a jogar suas esperanças de participar de um segundo turno eleitoral na hipótese de uma abstenção maior entre o eleitorado de baixa renda, particularmente o nordestino. Esse ano, seria ainda pior, com o fato de serem necessários dois documentos para votar. Mônica Bergamo escreve hoje na Folha (e Cesar Mais replica) que “abstenção é maior no eleitorado de baixa renda e nas regiões Norte e Nordeste”. Já em 2006 disse aqui no Blog ("O sofisma de Lavareda" e "Nordestino prova...") que isso se baseava em números pré-Lula. O nordestino agora – bem ao contrário do que acontecia antigamente – tem o seu próprio candidato, o seu candidato in pectore, e por isso faz questão de comparecer e votar. As diferenças para o Sudeste, por exemplo, são cada vez menores, diria até que são mínimas. Veja nos quadros abaixo as evoluções (1998/2002/2006) das abstenções no Nordeste e no Sudeste e também dos votos válidos. A queda das abstenções e o crescimento dos votos válidos são muito mais significativos no Nordeste do que no Sudeste. Garanto que agora em 2010 a participação nordestina será ainda maior, para votar em Dilma, a candidata de Lula, e poder garantir as suas conquistas. O resto é desespero de perdedor.
Veja também o texto de Mônica Bergamo:
MAIS É MENOS
As estatísticas de eleições anteriores mostram que a abstenção é maior no eleitorado de baixa renda e nas regiões Norte e Nordeste. Entre outros fatores que levaram a eleição de 2006 para o segundo turno, de acordo com especialistas, está a alta abstenção em regiões em que Lula abria dianteira sobre Geraldo Alckmin (PSDB), e onde Dilma Rousseff (PT) repete o fenômeno. No Norte, a abstenção foi de 19%. No Nordeste, de 18%. No Sul, de 15% e no Sudeste, de 16%.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O dia-a-dia da Oposição é de desespero em busca de um segundo turno

É engraçado observar os movimentos diários dos oposicionistas à cata de um pontinho nas pesquisas que possa sinalizar segundo turno na eleição presidencial. Estão certos, esse é o papel deles. Mas devem tentar evitar um papel ridículo, quando colocam o desejo bem à frente da realidade.
O Cesar Maia de hoje, por exemplo, dá dó com o contorcionismo numérico que faz. Ele começa o Ex-Blog dizendo “O Datafolha mostrou o que este Ex-Blog vem dizendo desde início de setembro: haverá um afunilamento, e a probabilidade de segundo turno aumentará a cada dia”. Baseado em quê? Desde o ano passado ele passa dia e noite dizendo que haverá segundo turno, e essa possibilidade, de lá para cá, reduziu muito. O que ele tem de concreto é apenas o desejo, claro.
Em seguida ele diz: “A cabeça do eleitor aponta para quatro caminhos. a) voltar a escolher o Serra, como uns 4 meses atrás; b) optar pela Marina, como era mais provável, numa espécie de voto higiênico; c) anular o voto, o que tem um efeito de 50% para a ida ao segundo turno em relação a escolher outro candidato; d) e escolher entre os candidatos com pequena intenção de voto, como protesto, 'tiriricando' o voto, o que dá no mesmo que escolher Serra, para a ida ao segundo turno”. Ok, ele quer dizer que todo mundo ganha, menos a Dilma. Mas faltou dizer de onde saem esses eleitores. Aparentemente, estão saindo principalmente do não-voto (branco, nulo, não sabe, não responde), que caiu 3% entre as duas últimas pesquisas Datafolha. Essa deve ser a principal fonte de Marina.
O que a cabeça do eleitor revela claramente é que não se deixa levar por essas baixarias feitas na calada da noite, e segue firme rumo à vitória no primeiro turno. Nada é impossível em política, mas a cada dia está mais difícil Serra chegar ao segundo turno. No Paraná é ainda pior: cada Dias que passa, fica mais difícil para a Oposição ver o sol raiar...

Ray, 80

Quando morei na Oca 1 da Universidade de Brasília, tínhamos 2 discos no ap, um deles era de Ray Charles. Sempre colocava antes de dormir. E como a vitrola estava com defeito, repetindo sem parar, era o que ouvia quando acordava. Homenagem aos 80 anos do nascimento de Ray Charles, I can´t stop loving you, para ouvir sem parar.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

HEM?!?!


O Horário Eleitoral da Mídia (HEM) é bem diferente do Horário Eleitoral Gratuito. Foi regulamentado pela Lei nº 0171/02 e não aceita nenhuma proporcionalidade. Ou melhor, só existe uma “proporcionalidade”: 100% dos candidatos, partidos políticos e caluniadores em geral que façam oposição a Lula têm espaço e tempo garantido, a qualquer hora do dia ou da noite, sete dias na semana, trinta dias no mês, 365 dias no ano, para atacar o Governo Lula, a candidata Dilma, o PT e quem mais estiver pela frente. Não há direito de resposta.
Felizmente existe o Horário Eleitoral Gratuito, onde a campanha de Dilma faz um bom trabalho. Ou melhor, fazia. Porque o Programa tem ficado repetitivo, meio que imobilizado pela guerra sem tréguas da Mídia. O Programa de Serra (que ontem foi bem superior), sabiamente, tem deixado a baixaria por conta da Mídia. Foi um Programa propositivo (demagógico, claro), com mais emoção e um Serra entusiasmado, interagindo com o eleitor.
O Programa da Dilma tem que sair da inércia e preparar uma resposta à altura, em termos de emoção e motivação do eleitorado, principalmente da faixa popular. Não tem quali que me convença do contrário.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Dilma usa reportagem da Folha para dar aula de indignação a Serra


O Serra precisa assistir essa entrevista da Dilma para aprender o que realmente significa indignação. Notem a expressão, é completamente diferente daquela falsa indignação apresentada por Serra quando fala do "vazamento da Receita da filha" (ou algo assim), sempre com um sorrisinho "trapaceiro". Sugiro à Folha que envie esse vídeo da Dilma para a análise do David Matsumoto, em Los Angeles, para a seção "Está na cara" do próximo domingo.


Serra realmente é o máximo quando fala do Mínimo


Serra anunciando Salário Mínimo de 600 reais leva a indignação de qualquer um às alturas. Como pode ser tão cara de pau para dizer uma coisa dessas! Por que não aconteceu assim na época do governo dele e do FHC? Peguei a maquininha e fui calcular os valores na época deles, transformando-os em dólar, apenas para ter a referência mais à mão.
Quando chegaram ao poder, encontraram o Salário Mínimo a R$ 70,00. Em dólar da época, isso era US$79,55. Com a inflação do dólar corrigida, era US$ 113,95. Saíram com o Salário Mínimo em R$ 200,00. Em dólar da época, isso era US$ 86,21. Com a inflação do dólar corrigida, era US$ 123,50. Em real, parece até que foi muito, mas em dólar foi muito pouco.
Quando Lula e Dilma chegaram ao poder, encontraram o Salário Mínimo de R$ 200,00. Em dólar da época, como já vimos acima, isso era US$ 86,21. Com a inflação do dólar corrigida, era US$ 123,50. Eles estão concluindo 8 anos de Governo com o Salário Mínimo em R$ 510,00. Com o dólar a R$ 1,72, isso corresponde a US$ 296,51.
Por essa comparação, constatamos que, em 8 anos, FHC e Serra não chegaram a dar 10 dólares de aumento no Salário Mínimo. Enquanto isso, os 8 anos do Governo Lula/Dilma, se encerram com um Salário Mínimo de quase 300 dólares, um aumento de 140% em dólares corrigidos.
Esse Serra não é mesmo o máximo? No fundo, no fundo, acho que ele pretende “serrar” o Mínimo...

domingo, 19 de setembro de 2010

André Singer: "A história e seus ardis - O lulismo posto à prova em 2010"

Esse artigo de André Singer, publicado na Folha, é mais um daqueles que dá prazer ler.

"A história e seus ardis - O lulismo posto à prova em 2010"
Conta-se que certa vez o engenheiro Leonel Brizola teria levado o metalúrgico Lula ao túmulo de Getúlio Vargas  em São Borja (RS). Lá chegando, o gaúcho pôs-se a conversar com o ex-presidente. Depois de algumas palavras introdutórias, apresentou o líder do PT ao homem que liderou a Revolução de 1930: "Doutor Getúlio, este é o Lula", disse, ou algo parecido. Em seguida, pediu que Lula cumprimentasse o morto. Não se sabe a reação do petista.
Será que algum dos personagens do encontro pressentiu que, naquela hora, estavam sendo reatados fios interrompidos da história brasileira? Desconfio que não.
Os tempos eram de furiosa desmontagem neoliberal da herança populista dos anos 1940/50. Mesmo aliados, em 1998 PT e PDT - praticamente tudo o que restava de esquerda eleitoralmente relevante - perderiam para Fernando Henrique Cardoso no primeiro turno. O consulado tucano parecia destinado a durar pelo menos 20 anos e trazer em definitivo o neoliberalismo para o Brasil.
BRECHA
Foi por uma brecha imprevista, aberta pelo aumento do desemprego no segundo mandato de FHC, que Lula encontrou o caminho para a Presidência da República. Para aproveitá-la, fez substanciais concessões ao capital, pois a ameaça de radicalização teria afastado o eleitorado de baixíssima renda, o qual deseja que as mudanças se deem sem ameaça à ordem.(1)
Apesar da pacificação conquistada com a "Carta ao Povo Brasileiro" ter sido suficiente para vencer, o subproletariado não aderiu em bloco. Havia mais apoio entre os que tinham renda familiar acima de cinco salários mínimos do que entre os que ganhavam menos do que isso, como, aliás, sempre acontecera desde 1989. Ainda que as diferenças pudessem ser pequenas, elas expressavam a persistente desconfiança do "povão" em relação ao radicalismo do PT.
Depois de 2002, tudo iria mudar. A vitória levaria ao poder talvez o mais varguista dos sucessores do dr. Getúlio. Não em aspectos superficiais, pois nestes são expressivas as diferenças entre o latifundiário do Sul e o retirante do Nordeste. Tampouco no sentido de arbitrar, desde o alto, o interesse de inúmeras frações de classe, fazendo um governo que atende do banqueiro ao morador de rua. Dadas as condições, todos os presidentes tentam o mesmo milagre.
O que há de especificamente varguista é a ligação com setores populares antes desarticulados. Ao constituir, desde o alto, o povo em ator político, o lulismo retoma a combinação de autoridade e proteção aos pobres que Getúlio encarnou.
BURGUESIA EM CALMA
Mas em 1º de janeiro de 2003 ninguém poderia prever o enredo urdido pela história. Para manter em calma a burguesia, o mandato inicial de Lula, como se recorda, foi marcado pela condução conservadora nos três principais itens da macroeconomia: altos superavits primários, juros elevados e câmbio flutuante. Na aparência, o governo seguia o rumo de FHC e seria levado à impopularidade pelas mesmas boas razões.
De fato, 2003 foi um ano recessivo e causou desconforto nos setores progressistas. Ao final, parte da esquerda deixou o PT para formar o PSOL. Mesmo com a retomada econômica no horizonte de 2004, Brizola deve ter morrido em desacordo com Lula, por ter transigido com o adversário.
Ocorre que, de maneira discreta, outro tripé de medidas punha em marcha um aumento do consumo popular, na contramão da ortodoxia. No final de 2003, dois programas, aparentemente marginais, foram lançados sem estardalhaço: o Bolsa Família e o crédito consignado. Um era visto como mera junção das iniciativas de FHC. O segundo, como paliativo para os altíssimos juros praticados pelo Banco Central.
Em 2004, o salário mínimo começa a se recuperar, movimento acelerado em 2005. Comendo o mingau pela borda, os três aportes juntos começaram a surtir um efeito tão poderoso quanto subestimado: o mercado interno de massa se mexia, apesar do conservadorismo macroeconômico.
Nas pequenas localidades do interior nordestino, na vasta região amazônica, nos lugares onde a aposentadoria representava o único meio de vida, havia um verdadeiro espetáculo de crescimento, o qual passava despercebido para os "formadores de opinião".
PASSO DECISIVO
Quando sobrevém a tempestade do "mensalão" em 2005 - e, despertado do sono eterno pela reedição do cerco midiático de que fora vítima meio século antes no Catete, o espectro do dr. Getúlio começa a rondar o Planalto -, já estavam dadas as condições para o passo decisivo.
Em 3 de agosto - sempre agosto -, em Garanhuns (PE), perante milhares de camponeses pobres da região em que nascera, Lula desafiou os que lhe moviam a guerra de notícias: "Se eu for [candidato], com ódio ou sem ódio, eles vão ter que me engolir outra vez".
Até então, a ligação entre Lula e os setores populares era virtual. Chegara ao topo cavalgando uma onda de insatisfação puxada pela classe média. Optou por não confrontar os donos do dinheiro. Perdeu parte da esquerda. Na margem, acionou mecanismos quase invisíveis de ajuda aos mais necessitados, cujo efeito ninguém conhecia bem.
Foi só então que, empurrados pelas circunstâncias, o líder e sua base se encontraram: um presidente que precisava do povo e um povo que identificou nele o propósito de redistribuir a renda sem confronto.
PLACAS TECTÔNICAS
Os setores mais sensíveis da oposição perceberam que fora dada a ignição a uma fagulha de alta potência e decidiram recuar. A hipótese de impedimento foi arquivada, para decepção dos que não haviam entendido que placas tectônicas do Brasil profundo estavam em movimento.
Em 25 de agosto, um dia depois do aniversário do suicídio de Vargas, Lula podia declarar perante o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social que a página fora virada: "Nem farei o que fez o Getúlio Vargas, nem farei o que fez o Jânio Quadros, nem farei o que fez o João Goulart. O meu comportamento será o comportamento que teve o Juscelino Kubitschek: paciência, paciência e paciência". Uma onda vinda de baixo sustentava a bonomia presidencial.
O Lula que emerge nos braços do povo, depois da crise, depende menos do beneplácito do capital. Daí a entrada de Dilma Rousseff e Guido Mantega em postos estratégicos, o que mudou aspectos relevantes da política macroeconômica. Os investimentos públicos, contidos por uma execução orçamentária contracionista, foram descongelados no final de 2005. O salário mínimo tem um aumento real de 14% em 2006.
POLARIZAÇÃO
Para o público informado, a constatação do que ocorrera ainda demoraria a chegar. Foi preciso atingir o segundo turno de 2006 para que ficasse claro que o povo tinha tomado partido, ainda que em certos ambientes de classe média "ninguém" votasse em Lula.
A distribuição dos votos por renda mostra a intensa polarização social por ocasião do pleito de 2006. Pela primeira vez, o andar de baixo tinha fechado com o PT, antes forte na classe média, numa inversão que define o realinhamento iniciado quatro anos antes.
Embora, do ponto de vista quantitativo, a mudança relevante tenha se dado em 2002, o que define o período é o duplo movimento de afastamento da classe média e aproximação dos mais pobres. Por isso, o mais correto é pensar que o realinhamento começa em 2002, mas só adquire a feição definitiva em 2006. Como, por sinal, aconteceu com Roosevelt entre 1932 e 1936.
SEGUNDO MANDATO
Assentado sobre uma correlação de forças com menor pendência para o capital, o segundo mandato permitirá a Lula maior desenvoltura. Com o lançamento do PAC, fruto de um orçamento menos engessado, aumentam as obras públicas, as quais vão absorver mão de obra, além de induzir ao investimento privado.
Em 2007, foi gerado 1,6 milhão de empregos, 30% a mais do que no ano anterior. A recuperação do salário mínimo é acelerada, com aumento real de 31% de 2007 a 2010, contra 19% no primeiro mandato, conforme estimativa de um dos diretores do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)2. A geração de emprego e renda explica os 70% de aprovação do governo desde então.
Nem mesmo a derrubada da CPMF, com a qual a burguesia mostrou os dentes no final de 2007, reduziu o ritmo dos projetos governamentais. A transferência de renda continuou a crescer. Foi só ao encontrar a parede do tsunami financeiro, no último trimestre de 2008, que se interrompeu o ciclo ascendente de produção e consumo. Teria chegado, então, segundo alguns, a hora da verdade. Com as exportações em baixa, o lulismo iria definhar.
COMPRAR SEM MEDO
Mas o lulismo já contava com um mercado interno de massa ativado, capaz de contrabalançar o impacto da crise no comércio exterior. A ideia, difundida pelo presidente, de que a população podia comprar sem medo de quebrar, ajudou a conter o que poderia ser um choque recessivo e a relançar a economia em tempo curto e velocidade alta.
Além da desoneração fiscal estratégica, como a do IPI sobre os automóveis e os eletrodomésticos da linha branca, o papel dos bancos públicos -em particular o do BNDES - na sustentação das empresas aumentou a capacidade do Estado para conduzir a economia. Numa manobra que lembra a de Vargas na Segunda Guerra, Lula utilizou a situação externa para impulsionar a produção local.
Surge uma camada de empresários - Eike Batista parece ser figura emblemática, como notava dias atrás um economista -, dispostos a seguir as orientações do governo. A principal delas é puxar o crescimento por meio de grandes obras, como as de Itaboraí - o novel polo petroquímico no Estado do Rio -, as de Suape (PE) e de Belo Monte, na Amazônia. Cada uma delas alavancará regiões inteiras.
Por fim, a aliança entre a burguesia e o povo, relíquia de tempos passados que ninguém mais achava que pudesse funcionar, se materializa diante dos olhos. Que o estádio do Corinthians em Itaquera não nos deixe mentir.
PROJETO PLURICLASSISTA
A candidatura Dilma representa o arco que o lulismo construiu. A ex-ministra, por sua biografia, é talhada para levar adiante um projeto nacional pluriclassista. O fato de ter sido do PDT até pouco tempo atrás não é casual. A mãe do PAC tem uma visão dos setores estratégicos em que a burguesia terá que investir, com o BNDES.
O povo lulista, que deseja distribuição da renda sem radicalização política, já dá sinais de que o alinhamento fechado em 2006 está em vigor. Em duas semanas de propaganda eleitoral na TV, Dilma subiu 9 pontos percentuais e Serra caiu 5. À medida que os mais pobres adquirem a informação de que ela é a candidata de Lula, o perfil do seu eleitorado se aproxima do que foi o de Lula em 2006. Ou seja, o voto em Dilma cresce conforme cai a renda, a escolaridade e a prosperidade regional.
A classe média tradicional, em que pese aprovar o governo, continuará a votar na oposição, como demonstram a dianteira de Serra em Curitiba e o virtual empate em São Paulo, municípios em que o peso numérico das camadas intermediárias é significativo.
Parte delas, sobretudo entre os jovens universitários, deverá optar por Marina Silva. Isso explica por que os que têm renda familiar mensal acima de cinco salários mínimos dão 12 pontos percentuais de vantagem para a soma de Serra e Marina sobre Dilma na pesquisa Datafolha concluída em 3/9.
O problema da oposição é que esse segmento reúne apenas 14% do eleitorado, de acordo com a amostra utilizada pelo Datafolha, enquanto os mais pobres (até dois salários mínimos de renda familiar mensal) são 48% do eleitorado. Nesse segmento, Dilma possui uma diferença de 22 pontos percentuais sobre Serra e Marina somados! Se vier a ganhar no primeiro turno, será graças ao apoio, sobretudo, dos eleitores de baixíssima renda, como ocorreu com Lula na eleição passada.
REALINHAMENTO
A feição popular da provável vitória de Dilma confirma, assim, a hipótese que sugerimos no ano passado a respeito da novidade que emergiu em 2006. Se estivermos certos, por um bom tempo o PSDB precisará aprender a falar a linguagem do lulismo para ter chances eleitorais. Não se trata de mexicanização, mas de realinhamento, o qual significa menos a vitória reiterada de um mesmo grupo e mais a definição de uma agenda que decorre do vínculo entre certas camadas e partidos ou candidatos.
Quando um governo põe em marcha mecanismos de ascensão social como os que se deram no New Deal, e como estamos a assistir hoje no Brasil, determina o andamento da política por um longo período. Num primeiro momento, trata-se da adesão dos setores beneficiados aos partidos envolvidos na mudança - o Partido Democrata nos EUA, o PT no Brasil.
Com o passar do tempo e as oscilações da conjuntura, os aderentes menos entusiastas podem votar em outro partido, mesmo sem romper o alinhamento inicial. Foi o que aconteceu com as vitórias do republicano Eisenhower (1952 e 1956) e dos democratas Kennedy (1960) e Johnson (1964).
Mas para isso a oposição não pode ser extremada, como bem o percebeu a hábil Marina Silva. Até certa altura da sua campanha, José Serra igualmente trilhou esse caminho. Foi a fase em que propôs cortar juros e duplicar a abrangência do Bolsa Família.
Depois, tragado pela lógica do escândalo, retornou ao caminho udenista da denúncia moral, que só garante os votos de classe média - o que, no Brasil, não ganha eleição. Convém lembrar que no ciclo dominado pelo alinhamento varguista, a UDN só conseguiu vencer com um candidato: Jânio Quadros, que falava a linguagem populista. Fora disso, resta o golpe, sombra da qual estamos livres.
DURAÇÃO
Qual será a duração do ciclo aberto em 2002, completado em 2006, e, aparentemente, a ser confirmado em 2010? O realinhamento abrange, por definição, um período longo. O último que vivemos, dominado pelo oposicionismo do MDB/PMDB, durou 12 anos (1974-86) e foi sepultado, quem sabe antes do tempo, pelo fracasso em controlar a inflação. A resposta para o atual momento também deve contemplar a economia.
Por isso, as condições de manter, pelo menos, o ritmo de crescimento médio alcançado no segundo mandato de Lula, algo como 4,5% de elevação anual do PIB, estarão no centro das preocupações do novo presidente. Sem ele, as premissas do lulismo ficam ameaçadas. Recados criptografados sobre a necessidade de reduzir a rapidez do crescimento e de fazer um ajuste fiscal duro já apareceram na imprensa, dirigidos a Dilma, provável vencedora.
O capital financeiro -apelidado na mídia de "os mercados"- vai lhe cobrar o tradicional pedágio de quem ainda não "provou" ser confiável. Caso os reclamos de pisar no freio não sejam atendidos, sempre haverá o recurso de o BC - cuja direção deverá continuar com alguém como Henrique Meirelles, senão o próprio - aumentar os juros. O aumento real do salário mínimo no primeiro ano de governo, que dependerá da presidente, pois o PIB ficou estagnado em 2009, será outro teste relevante.
CABO DE GUERRA
Convém notar que, no segundo mandato de Lula, ainda que de modo relutante, o BC foi obrigado a trabalhar com juros mais baixos. Mas o cabo de guerra será reiniciado no dia 3 de janeiro de 2011. Com os jogadores em posse de um estoque de fichas renovados pela eleição, uns apostarão em uma recuperação do espaço perdido, outros numa aceleração do caminho trilhado no segundo mandato.
O PMDB, elevado à posição de sócio importante da vitória, atribuiu-se, na campanha, o papel de interlocutor com o empresariado. O PT, possivelmente fortalecido por uma bancada maior, deverá, pela lógica, fazer-lhe o contraponto do ângulo popular. A escolha dos presidentes da Câmara e do Senado, em fevereiro, servirá de termômetro para o balanço das respectivas forças.
O futuro do lulismo dependerá de continuar incorporando, com salários melhores, os pobres ao mundo do trabalho formal. Em torno desse ponto é que se darão os principais conflitos e se definirá a extensão do ciclo. Alguns analistas da oposição alertam para a proximidade de um índice de emprego que começará a encarecer a mão de obra e gerar inflação. Como mostra Stiglitz,(3) é a conversa habitual dos conservadores para brecar a expansão econômica.
Por fim, não se deve esquecer que uma palavra decisiva sobre esses embates virá de São Bernardo, onde residirá o ex-presidente, bem mais perto da capital do que foi, no passado, São Borja.
Aguardam-se os conselhos de Vargas e Brizola, dos quais poderemos tomar conhecimento naquelas mensagens psicografadas por Elio Gaspari.
Notas:
1. Ver André Singer. "Raízes Sociais e Ideológicas do Lulismo", "Novos Estudos", 85, nov 2009. Link para o artigo em folha.com/ilustríssima
2. Ver João Sicsú. "Dois Projetos em Disputa". "Teoria e Debate", 88, mai/jun 2010.
3. Ver Joseph Stiglitz, "Os Exuberantes Anos 90", Companhia das Letras, 2003.

Retrato falado de um tucano com bico de abutre


David Matsumoto, professor de psicologia da Universidade de San Francisco (EUA) e fundador da Huminell, empresa de serviços para análises de comportamento não-verbal, faz semanalmente, em Los Angeles, depoimento a Fernanda Ezabella (Folha) com análise dos nossos principais políticos a partir de seus discursos gravados em vídeo. A sua seção "Está na cara" deste domingo está particularmente perspicaz. Começa pelo título: Serra tem "prazer do trapaceiro". Matsumoto inicia a análise pelo discurso de Lula no 7 de Setembro, ficando com "uma forte impressão de seus sentimentos, fortes e honestos". Depois passa para Serra, com sua "indignação" declarada com sorrisos inapropriados, para concluir que suas expressões são "exemplos do que chamamos de "dupers delight", algo como "prazer dos trapaceiros", nos quais uma pessoa que não é totalmente franca está curtindo em não ser totalmente franca". Veja o texto completo:
Serra tem "prazer do trapaceiro"
David Matsumoto

Esta semana analisei o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, através de um vídeo que ele gravou para Dilma Rousseff no Dia da Independência.
Ele parece bastante intenso, provavelmente bravo e amargo com a campanha eleitoral. Diversas vezes, tensiona as pálpebras e abaixa suas sobrancelhas não apenas para intensificar o que está falando, mas também para mostrar sua irritação.
Dado o conteúdo do discurso, me pareceu que suas expressões eram apropriadas. Quando ele menciona "nosso adversário", ele passa uma grande repugnância, o que parece demonstrar bem a intensidade de seu sentimento sobre a questão.
Lula também dá um rápido microssorriso para dizer que os "brasileiros saberão repelir" a campanha rival. Foi um sorriso de convicção. Fiquei com uma forte impressão de seus sentimentos, fortes e honestos. O segundo vídeo que analisei trouxe o candidato do PSDB, José Serra. Mais uma vez não fiquei com uma boa impressão do que vi.
Por exemplo, quando ele fala que está "indignado" com o escândalo do sigilo fiscal violado de seu genro, ele está sorrindo. Eu não vejo muita indignação. Suas expressões faciais eram muito inconsistentes com o que ele estava falando.
Ele dá o mesmo microssorriso quando fala que os crimes não são contra ele pessoalmente e sim contra o próprio Brasil. Quando diz que o PT debocha das vítimas, percebi outro microssorriso. Serra amplifica seu discurso de forma apropriada com gestos e expressões faciais, mas sem emoção. Parece que estava tentando muito convencer o espectador de sua sinceridade, mas, com esses exemplos que eu citei, suas expressões foram totalmente inconsistentes com sua fala.
Penso que esses podem ser exemplos do que chamamos de "dupers delight", algo como "prazer dos trapaceiros", nos quais uma pessoa que não é totalmente franca está curtindo em não ser totalmente franca.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Eleição 2010: o tucano Aécio bateu asas e voou

Segundo a reportagem da Carta Capital que saiu hoje, Aécio está se preparando para fazer o que este Blog vem anunciando há meses: largar de vez a plumagem tucana e pousar em uma oposição de novo tipo. Aécio, claro, já negou, em entrevista a Bob Fernandes, do Terra. Mas Maurício Dias, autor da reportagem, reafirma que ouviu do próprio Aécio, em jantar que teria ocorrido há 15 dias, com testemunhas: "eu vou sair do PSDB". Trecho da entrevista de Maurício Dias ao Terra:
Terra - Falei com Aécio há pouco, e ele desmente cabalmente.
Maurício Dias - Claro que a reação do Aécio teria que ser essa de ficar bravo, isso cria algum constrangimento para ele, imagino.
Terra - O que mais você conclui nessa sua matéria?
Maurício Dias - Se a gente fosse se mover pela lógica, não há nenhum a novidade em o Aécio sair do PSDB, e é um jeito parecido com o do avô dele, Tancredo, que um dia disse "o meu MDB não é o MDB de (Miguel) Arraes", e daí ele saiu para fundar o PP.
Em tempo, o jantar teria ocorrido na residência do empresário Alexandre Accioly.

Como disse o próprio Maurício, isso era previsível. Aécio faz tempo não cabe no atual formato tucano. Ele pretende liderar uma oposição de centro-direita ao Governo Dilma e está louco para se ver livre da tucanada paulista. Talvez ele nem precise sair do PDSB, porque o partido necessariamente deixará de ser o que é. As previsões mais recentes deste Blog ocorreram nos últimos 30 dias: Derrotar ou não derrotar Aécio – eis a questão e Está mais do que provado: Aécio apóia Dilma contra Serra.

Eleição 2010: os rumos da disputa


Que a oposição tomaria o rumo da baixaria ninguém poderia duvidar. Pensar diferente (ou ignorar) essa possibilidade significaria, em primeiro lugar, estar alheio a tudo que a oposição tem feito nos últimos anos com apoio integral da grande mídia. Mas significaria também não perceber o que está em jogo. No dia 3 de outubro, não se estará disputando a Prefeitura de Borá (SP), a menor população do país, ou as de São Félix ou São Miguel de Tocantins, com os menores PIBs (com todo o respeito a esses municípios). O Brasil caminha para se tornar a quinta maior economia do planeta e é o poder sobre isso que está em disputa. É um jogo pesado, sujo, um vale-tudo sem limites (se me permitem a redundância). Os perdedores de plantão naturalmente moveriam mundos e fundos, dos quatro cantos da Terra, para conquistar esse poder para o qual jamais estiveram preparados. Baixaria é o mínimo que se pode atribuir a essa campanha tucana. E ela está tendo seus resultados. Não junto ao eleitorado, que não é bobo, sabe muito bem o que é melhor para o país. Os principais efeitos foram junto à campanha petista, que parece que paralisou, ficou na defensiva. Isso dá para notar claramente no Horário Eleitoral Gratuito, com um Programa que não cansa de repetir que Dilma é candidata de Lula e que o Governo tem um mundo de realizações maravilhosas. Tudo bem, isso tem mesmo que ser feito e é garantia de sucesso da candidatura. Mas já pode ir além. Falta povo na campanha. Falta a emoção das ruas, falta o contato mais direto e entusiasmado da candidata com seus eleitores. Quem está fazendo isso razoavelmente bem (quem diria!) é o Serra. Conseguiram colocar no Programa a rua que ele jamais teve. E certamente foi por isso que ele estancou a queda. A partir da próxima semana começa a fase de mais audiência do Rádio e da Televisão – é momento de aumentar a vibração da vitória que se aproxima.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

A mídia e a oposição com seus partidos em pedaços

Excelente esse artigo de Maria Inês Nassif, publicado hoje no Valor. Mostra de forma concisa (e exata) o erro primário cometido pelos partidos de oposição na sua estratégia de comunicação com o eleitorado de perfil popular. É um bom retrato do que ocorre nessa corrida eleitoral.

Um modelo partidário trazido do atraso
Maria Inês Nassif (Valor)

A "mexicanização" do quadro partidário brasileiro é um debate a ser colocado em devidos termos. A ameaça de que o PT, depois das eleições de outubro, se transforme num Partido Revolucionário Institucional (PRI), que governou o México de 1929 a 2000, é apresentada como "denúncia". Isso é, no mínimo, um equívoco. A questão merece ser tratada criticamente por todos os atores do cenário político, sob pena de a eleição consolidar, de fato, e por um bom tempo, um único partido com condições de acesso ao poder pelo voto. Essa perspectiva está colocada não porque o PT trapaceou, mas porque a oposição acreditou demais no seu poder de influenciar massas via convencimento das elites. É uma estratégia medíocre de ação política, num mundo onde o acesso à informação tem aumentado e ao mesmo tempo saído da órbita exclusiva da influência dos grandes grupos, e num Brasil onde um grande número de cidadãos-eleitores deixou a pobreza absoluta, outro tanto ascendeu à classe média, a escolaridade aumentou, o acesso à internet é maior e a influência das elites sobre os mais pobres tornou-se muito, muito relativa.
Oposição não mobilizou militância nem formou quadros. Dos partidos na oposição, apenas o P-SOL, em passado recente, e o PPS, quando remotamente era PCB, conseguiram pelo menos formular idealmente um conceito de partido de massas. O P-SOL fracassou porque foi criado na contramão de um crescimento espantoso do PT, partido do qual se originou, e do recuo de setores que, durante o mensalão, ensaiaram abandonar o partido de Lula. Amedrontados com a retórica pré-64 da oposição, esses setores acabaram lentamente retornando à órbita do petismo. O PCB conseguiu a façanha de ser um partido de massas apenas quando tinha um líder carismático, Luiz Carlos Prestes. Como viveu boa parte de sua existência na clandestinidade, é difícil saber se teria vocação para sair da política de vanguarda e ganhar substância em setores mais amplos. O PPS, que o sucedeu, certamente não mostra essa capacidade. O PT continua a exceção no quadro partidário. A estrutura montada pelo partido nacionalmente, quando começava a se perder na burocratização da máquina, foi salva pelo lado popular do governo Lula e pela ofensiva oposicionista. O partido não é mais o que era quando foi fundado, mas é certo que tem uma representação social. As demais legendas, em especial as de oposição, não conseguiram sair da camisa de força dos partidos de quadros. O PSDB, que catalisou a oposição a Lula, e o DEM, com o qual é mais identificado, terceirizaram a ação partidária para uma mídia excessivamente simpática a um projeto que, mais do que de classes, é antipetista. Todo trabalho de organização partidária, de formulação ideológica e de articulação orgânica foi substituído por uma única estratégia de cooptação, a propaganda política assumida pelos meios de comunicação tradicionais. A vanguarda oposicionista tem sido a mídia. Esta, espelhando-se na velha estrutura social do país, tem praticado uma conversa exclusiva com os seus: assumiu um discurso para agradar a elite, que por sua vez perdeu quase totalmente seu poder de influência sobre os menos ricos e escolarizados. Os partidos de oposição e a mídia falam um para o outro. Pouco têm agregado em apoio popular, que significaria voto na urna e, portanto, vitória eleitoral. A ideia de propaganda política via mídia, que para a esquerda pré-Muro de Berlim era uma parte da estratégia de tomada do poder, e para os social-democratas a estratégia de conquista do poder pelo voto, tornou-se a única ação efetiva da oposição brasileira, exercida, porém, de fora dos partidos. Teoricamente, a mídia tradicional brasileira não é partidária. Na prática, exerce essa função no hiato deixado pela deficiente organização dos partidos que hoje estão na oposição ao presidente Lula. E o produto final não é exatamente a agregação de adeptos, mas uma conversa entre iguais, que se autoalimenta de um discurso trazido do udenismo, pouco propenso a conduzir um debate propriamente ideológico. Esse não é um fenômeno pós-Lula simplesmente, embora os dois governos do presidente petista tenham dado grande contribuição a esse descolamento entre a "opinião pública" e a "opinião dos pobres". Logo no início da redemocratização, foi instituído o voto do analfabeto. Ao longo dos dois últimos governos - portanto, nos últimos 15 anos - ocorreram ganhos de cidadania via aumento de escolaridade e renda que, por si só, incentivam a autonomia do voto. Nos últimos sete anos, os programas de transferência de renda reforçaram essa tendência. Esse contingente de novos eleitores ganhou autonomia de voto e se descolou da mídia tradicional. Nesse universo, os formadores de opinião pública - por sua vez formados pela mídia - não têm o mesmo acesso que tinham antigamente. O ingresso dos antigos desletrados na era da informação tem se dado pela televisão - e aí o horário eleitoral gratuito é neutralizador - e um pouco pela internet, mas a decisão política ocorre por ganhos de cidadania. Como a mídia tradicional é a única a operar como "propagandista" dos partidos de centro e de direita que nunca acharam necessário incorporar militância, formar quadros ou mesmo publicizar ideário, é de se supor que a capacidade de formação de consensos da mídia tradicional seja pouco significativa numa parcela do eleitorado que ascendeu recentemente ao mercado consumidor. O bloco oposicionista, que inclui não apenas os partidos, mas a mídia tradicional, não entendeu as mudanças que ocorreram no país. O modelo partidário que trazem na cabeça é um que pressupõe alinhamento automático de parcelas da população com líderes distantes ou donos de votos locais, ou a submissão da "ignorância" popular à opinião formada por iluminados. O novo Brasil não comporta mais isso. Esse modelo de política é elitista, porque não parte do princípio que as pessoas são iguais inclusive no direito de formar uma opinião própria.
Maria Inês Nassif é repórter especial de Política. Escreve às quintas-feiras no Valor.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Receita de baixaria não deu certo para Serra – e ele parou de cair por quê?


A campanha tucana percebeu logo que o “esquema Receita” tem muita contra-indicação. A grande massa de eleitores fez ouvido de mercador para a grasnada tucana. Serra fez uma publicidade monumental em torno de vazamentos, mas não impediu que Dilma continuasse sua tendência de alta em todas as pesquisas. Serra conseguiu apenas segurar parte da classe média do Sudeste, que estava decepcionada com o seu frouxismo eleitoral e já tinha as malas prontas para voar para Marina. Mas o que Serra fez de mais importante foi mostrar em seu programa eleitoral grandes realizações e propostas mais concretas. Sua fala de “indignação” ficou disfarçada e deixou a baixaria para a voz de um apresentador qualquer. Graças a essa sabedoria marqueteira ele garantiu sobrevida – para ele e para o tucanato paulista.
Aliás é a mesma sabedoria do Grupo Globo. Vejam o exemplo de hoje: o jornal O Globo, preferido da classe média carioca e um dos mais importantes do mundo político, trata das baixarias de modo inteiramente oposto ao modo do jornal Extra – que é do mesmo grupo, mas tem perfil popular, é lido por quem faz parte da maioria do eleitorado. O Globo faz manchetona repercutindo o “escândalo Veja”, associando-o a Dilma e mostrando foto do debate de ontem na RedeTV!, enquanto o Extra, sem destaque algum, apenas diz que “Debate morno reúne Dilma e Serra na TV”.


O povo não é bobo. Sabe que esse lero-lero eleitoreiro não vai substituir as conquistas do Governo Lula que terão continuidade com Dilma. O Grupo Globo também não é bobo, mostrou que sabe disso. Os tucanos, se não sabiam, ficaram sabendo.

sábado, 11 de setembro de 2010

11 de setembro, um ano de "otimismo"


(clique no gráfico para ampliar)

Há exatamente um ano a mídia e a oposição em geral comemoravam ligeira queda de Dilma nas pesquisas eleitorais. Era a primeira (e última) vez que ela apresentava evolução algo negativa de seus índices. Merval Pereira, em sua coluna de 11 de setembro de 2009, no Globo, chegou a dizer que o PMDB se mostrava “sensível à tese de que deveria ter um candidato próprio no primeiro turno”, por causa da ”performance nada animadora de Dilma”.
Dois dias antes, contra tudo e contra todos, fiz aqui a postagem “CNT/SENSUS: Serra em queda, Dilma parada e eleição continua plebiscitária”. Peguei o histórico das intenções de voto nos dois principais candidatos e mostrei que, na verdade, Serra é que mantinha a tendência de queda, enquanto Dilma, apesar de ter caído um pouco, mantinha estável a sua tendência de alta. Graças a essa análise, Merval, na mesma coluna, considerou-me “otimista”: “Uma visão mais otimista com relação à candidatura da ministra Dilma Rousseff, como a do marqueteiro e publicitário Hayle Gadelha, vai buscar os números de março passado para mostrar que quem está em queda é o governador Serra, que naquela ocasião chegou a marcar 45,7%, enquanto Dilma tinha 16,3%”. Mais adiante, jogando pra escanteio minha análise, ele escreveu: “Como com as estatísticas pode-se fazer qualquer malabarismo, o melhor é se ater à tendência, que mostra uma sólida diferença a favor de Serra”.
Um ano depois, nesse 11 de setembro que tem se caracterizado por fatos marcantemente negativos (golpe no Chile e morte de Allende em 1973; ataque às torres gêmeas em 2001), fico feliz por meu “otimismo”. Mais feliz ainda por provar que não era eu quem fazia malabarismo com as estatísticas.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

O triste fim de um discurso diplomático


Excelente esse artigo (O triste fim de um discurso diplomático) de Marco Aurélio Garcia. Clareza, precisão, interessantíssimo, excelente leitura:

Não é fácil poder dar, em um período relativamente curto, duas entrevistas às páginas amarelas da revista Veja. É preciso estar muito afinado com o conservadorismo raivoso dessa publicação para merecer tal distinção.
Sei disso por experiência própria. Há muitos anos, um colunista-fujão de Veja dedicou-me um artigo cheio de acusações e insultos. Ingenuamente, enviei minha resposta a esta publicação, que se proclama paladina da liberdade de expressão. Meu texto não foi publicado e, para minha surpresa, li uma semana mais tarde uma resposta à minha resposta não publicada.
O embaixador-aposentado Roberto Abdenur teve mais sorte que eu. Emplacou uma segunda entrevista à Veja, talvez para retificar o tiro da primeira que concedeu (7 de fevereiro de 2007). Ou quem sabe para "compensar" o excelente depoimento do Presidente Juan Manuel Santos, na semana anterior, que não sucumbiu às tentativas da revista de opor o Brasil à Colômbia na América do Sul. Em sua primeira entrevista o diplomata destilava ressentimento contra o Ministro Celso Amorim que, num passado distante, o havia convidado para ser Secretário-Geral do Itamaraty e, mais recentemente, o havia enviado para uma de nossas mais importantes embaixadas – a de Washington. Abdenur preservava, no entanto, a política externa brasileira e, sobretudo, o Presidente Lula, que o havia designado como seu representante nos Estados Unidos.
Agora, tudo mudou. A crítica é global e dela não escapa nem mesmo o Presidente da República. Em matéria de política externa Lula não passa de um "palanqueiro", a quem o Itamaraty "não sabe dizer não". Faltando à verdade, o intrépito embaixador diz que nosso Presidente "começou a bater em Obama antes de eleito e não cansa de dar canelada no americano". Abdenur desconhece, ou finge desconhecer, as inúmeras manifestações de simpatia – e de esperança – que a eleição do atual Presidente norte-americano provocou em seu colega brasileiro. Ao invés disso, o ex-embaixador escorrega em rasteiro psicologismo ao detectar no Presidente Lula "um elemento de ciúme" em relação a Obama, pois este último lhe teria subtraído "a posição privilegiada no palanque global"...
Abdenur fez vinte anos de sua carreira diplomática durante o regime militar e não sofreu nenhum constrangimento. Até aí tudo bem. Muitos outros de seus contemporâneos tampouco foram perseguidos. Mas essa experiência profissional não lhe autoriza fazer analogias entre a política externa atual e aquela levada adiante nos primeiros anos da ditadura, quando chanceleres proclamavam que o que "é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil" ou patrocinavam o envio de tropas brasileiras para esmagar as mobilizações populares na República Dominicana.
É claro que aquelas inflexões da política externa brasileira foram tomadas por "razões ideológicas" (de direita). Mas a pergunta que não quer calar é: quando não temos motivações ideológicas na política, em particular na política externa?
Durante o Governo Geisel, quando Abdenur integrou o grupo dos "barbudinhos" do Itamaraty, foram resgatados princípios da Política Externa Independente de Santiago Dantas, Afonso Arinos e Araújo Castro, apresentados para a ocasião sob a eufemística denominação de "pragmatismo responsável". Mas aquela política – que tinha conteúdos progressistas, diga-se de passagem – também era expressão do projeto autoritário de "Brasil Potência" propugnado pelos militares. Tanto ela, como a Política Externa Independente do período Goulart-Jânio, tinham fortes componentes "ideológicos", como é normal em qualquer sociedade, democrática ou não.
É igualmente "ideológica" a reivindicação do ex-embaixador de que nossa diplomacia se alimente de "valores ocidentais". Mais do que ideológica, é ultrapassada e perigosa.
Ultrapassada, pois traz à memória os tempos da "guerra fria", quando se falava em "civilização ocidental e cristã" para esconder propósito profundamente conservadores.
Perigosa porque traz à tona e legitima a idéia de choque de civilizações (entre "oriente" e "ocidente") que os neo-conservadores têm defendido com tanta insistência nos últimos anos para justificar suas aventuras belicistas, queima de livros ou interdição de templos religiosos.
O ex-embaixador se alinha com as críticas da oposição brasileira contra a política externa atual. Seletivamente, ataca nosso bom relacionamento com Venezuela, Bolívia e Equador, supostamente motivado por afinidades ideológicas, esquecendo-se de mencionar nosso igualmente bom relacionamento com Argentina, Chile, Peru e Colômbia. Motivado por que?
Escondendo-se detrás de "boa fonte boliviana bem informada", desconhece ou deliberadamente omite, a cooperação militar e policial que se desenvolve com a Bolívia e com outros países para fazer frente ao flagelo do narcotráfico na região.
É próprio do pensamento conservador tentar apropriar-se de valores universais para encobrir interesses particulares – de classe, estamento, grupo ou etnia. A história do Brasil está cheia de exemplos. Nosso liberalismo conviveu alegremente com a escravidão. Nossa República proclamou retoricamente, durante décadas, a cidadania plena e praticou a mais brutal exclusão econômica, social e política. Tudo isso à sombra o Iluminismo, dos ideais da Renascença, do Humanismo ou da Revolução Americana que o embaixador invoca em seu vago projeto diplomático.
O Presidente Lula, assim como quase todos governantes, manteve e mantém relações com Chefes de Estado e de Governo dos mais distintos países: de democráticos, de regimes teocráticos, de partido único ou de responsáveis por graves violações de direitos humanos em nível local ou global. Não será difícil encontrar os nomes dos países na tipologia antes aludida.
Esses relacionamentos não se devem a idiossincrasias presidenciais como, de forma desrespeitosa, pretende Abdenur. Eles se inserem no difícil esforço de construção de um mundo multilateral e, sobretudo, de um mundo de paz.
São muitos os caminhos para atingir esse objetivo. Vão do uso da força militar ao emprego das sanções que golpeiam mais ao povo do que aos governantes dos países atingidos. Mas há também o caminho da negociação, da diplomacia que não renuncia valores, mas que não faz deles biombo por traz do qual se ocultam inconfessáveis opções políticas e ideológicas, particularmente quando a sociedade brasileira é chamada a decidir seus destinos pelos próximos quatro anos.
P.S.: há algum tempo a imprensa noticiou que Roberto Abdenur estava dando cursos de política externa para os Democratas (ex-PFL). Não acreditei. Agora passei a acreditar.
Marco Aurélio Garcia é assessor para assuntos internacionais da Presidência da República.

Receita de baixaria faz mal à saúde dos tucanos


Os tucanos, pelo jeito, não sabem ler as bulas de marketing eleitoral. Está lá escrito em letras garrafais: não existe cura para uma campanha eleitoral “natimorta”. O uso de baixarias com associação ao marketing é contraindicado. No desespero, o impaciente confunde “baixaria” com “bruxaria”, mas as reações são diferentes. Principalmente se a baixaria está com seu prazo de validade vencido (no caso, esgotou-se no ano passado). Quando a dosagem é exagerada, como aconteceu no tratamento da candidatura tucana, os efeitos colaterais são arrasadores e aumentam os riscos de contaminação. Não tem chá levanta-defunto que dê jeito...

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Serra, o clone de FHC, encontrou a Receita para disputar com Marina


Depois que Serra e seus tucanos lançaram a história dos sigilos da Receita, Dilma tem se distanciado cada vez mais na liderança das intenções de voto. No tracking de ontem (Vox/IG/Band, margem de erro de 2,2 pontos percentuais), a diferença alcançou 35 pontos: Dilma 56% e Serra 21%. Marina, estável nos seus 8%, até agora não fez nada para alcançar Serra – mas Serra fez de tudo para descer até os índices de Marina! É verdade que a candidata verde tem começado a bater em Serra, e é verdade também que no programa de ontem Serra não falou da Receita, o que altera um pouco as estratégias.
Aliás, no programa de ontem, pela primeira vez, Serra tentou se apresentar altamente qualificado para o cargo que disputa, revelando grande experiência na Presidência, entre 1995 e 2002. Mostrou longa história onde afirma que já conquistou 80 milhões de votos (corre o risco agora de ter menos do que teve em 2002...) e exibiu suas principais realizações como Presidente da República. Epa! Eu disse “Presidente da República”? O Serra é o clone de Fernando Henrique e ninguém sabia!

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Está mais do que provado: Aécio apóia Dilma contra Serra


Já deixei claro inúmeras vezes neste Blog que Aécio não está nem um pouquinho interessado em uma hipotética vitória de Serra, muito ao contrário. Ele quer que Serra e todo o tucanato paulista afunde de vez. Alckmin, ainda passa, desde que se acomode sob suas asas. Essa linha de pensamento casa perfeitamente com o objetivo imediato lulo-petista de derrotar a oposição paulista. Na minha postagem da semana passada, Derrotar ou não derrotar Aécio – eis a questão, escrevi que Aécio “ajuda a minar a liderança paulista” e que, por outro lado, se Lula avançasse contra Aécio, “estaria reaproximando Minas e São Paulo, dando mais fôlego a esse eixo cambaleante” e ainda “estaria matando o voto “dilmasia”, essencial para a vitória consistente de Dilma em Minas”.
Hoje, confirmando minha análise, o Painel da Folha, da jornalista Renata Lo Prete publica três notinhas bem reveladoras:
"Cristianização cruzada"
Não obstante a esperada aparição de Lula amanhã ao lado de Hélio Costa (PMDB), o comando da campanha de José Serra (PSDB) se convenceu de que Minas assiste a uma "cristianização cruzada": o presidente cumpre tabela em relação ao aliado local, que perde terreno para Antonio Anastasia (PSDB), cujo padrinho, Aécio Neves, tampouco se empenha por Serra.
A percepção do QG serrista foi consolidada pela notícia, vinda do entorno de Aécio, de que ele e Lula tiveram longa e recente conversa por telefone. Na avaliação de aliados do candidato presidencial tucano, a contínua expansão do voto "Dilmasia" vale mais para o Planalto que a eleição de Costa.
Sem tela
A campanha de Serra já pediu mais de uma vez aos tucanos de Minas que o incluam na propaganda de TV de Anastasia. Um dos apelos foi feito pelo próprio Serra, sem resultado.
Senha
Ao defender a aproximação do PSDB com o PSB e o PDT em 2011, Aécio teria, na interpretação de petistas, sinalizado a intenção de se integrar ao projeto lulista para 2014. Disso resultaria a relativa indiferença do presidente para com as aflições de Hélio Costa.

sábado, 4 de setembro de 2010

Ibope e Datafolha informam: o povo não é bobo

Saíram novas pesquisas Ibope e Datafolha confirmando as tendências de alta nas intenções de voto em Dilma e de queda em Serra. Dilma tem vantagem de 24 pontos em uma e de 22 pontos em outra. Em ambas, vitória no primeiro turno, e com o crescimento de Mercadante pegando carona. Isso tudo apesar do estardalhaço midiático feito em torno dos vazamentos da Receita. Politizaram o tema com objetivo de conquistar votos, mas não convenceram. O povo não é bobo. Mas o que me intriga é que não houve nenhum estardalhaço em torno do agente a serviço do governo tucano de Yeda Crusius (PSDB, RS), que foi preso acessando dados sigilosos de poíticos petistas. É ou não é intrigante? Ou sou eu que sou bobo?

Pezão na estrada


Falei há pouco com Pezão, Vice Governador do Rio de Janeiro, em campanha pela reeleição. Foi logo me dizendo: "Estou completando 63 cidades que visitei na campanha, mas vou visitar todas até o final (são 92). Acho que vamos ter 80% dos votos válidos n Interior". Não duvido. Nas suas campanhas para Prefeito de Piraí (RJ), visitava todos os domicílios do município (são mais de 6.000). Não é à toa que é chamado de Pezão!

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Serra partiu pro desespero, mas Gonzales aliviou


Serra e seus tucanos tinham tudo para afundar de vez a campanha oposicionista com essa história da Receita Federal. Poderiam ter transformado o Horário Eleitoral numa espécie de valsa fúnebre de Hermengarda, e teriam acabado definitivamente com o programa, principalmente comparado com o programa de Dilma veiculado ontem. Sorte deles que o Luiz Gonzales preferiu amenizar um pouco, e agora dá para disfarçar e sair pela tangente. Aliás, com aquela “indignação” que Serra declara não dá mesmo para acreditar em muita coisa. Pode ser que o programa contribua um pouco para segurar alguns votos em São Paulo. Mas a verdade verdadeira é que a apelação da Receita já deu o que tinha que dar, é melhor vazar dessa e partir pra outra.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Mais uma vez, o tapetão entra em campo: golpe a prazo ou à vista?


Quem gosta de tapetão é o perna-de-pau, incapaz de praticar um jogo bonito e eficiente. Desesperado com a derrota, o perna-de-pau busca no tapetão a mãozinha de Deus que lhe faltou dentro de campo.
No campo eleitoral, é exatamente assim que acontece. O candidato sem propostas, sem realizações contundentes, sem charme pessoal e sem apoio expressivo, reconhecendo que, portanto, não tem chances de conquistar votos, procura auxílio extracampo. Às vezes tem razão, às vezes não tem, mas isso não importa. O que importa para o perna-de-pau é criar uma quizumba fenomenal capaz de melar um jogo que estava perdido. E é isso que está tentando a Oposição, com essa Receita tirada da cartola. Tucanos (et caterva) querem porque querem transformar vazamentos da Receita Federal em seus cabos eleitorais. Claro que esses vazamentos têm que ser investigados e banidos. Mas não podem ser usados para alterar o resultado de um jogo do qual nem ao menos fazem parte. Esse desespero oposicionista, apesar de aparentemente inócuo, pode levar a consequências nefastas.
Não acredito que tenham sucesso nessa jogada, nem em campo nem extracampo. Mas a ameaça maior seria caminhar na direção de um golpe jurídico. Como diz um amigo, as leis não são verdades absolutas, são verdades interpretadas. E faz tempo que a Oposição dá sinais de querer avançar pela extrema-direita. Posicionamentos estranhos de membros da Alta Corte... aparelhamento da mídia... factoides... tudo isso leva a crer que o supertapetão pode ser utilizado para tentativa de inviabilizar o jogo democrático. Está na hora de Lula trazer para campo a vibração da camisa 12 (e camisa 13, 15, 40, 50, todas as torcidas unidas) para contrapor a pressão que os camisas pretas estão fazendo sobre o juiz. O povo já pôs a mão nessa taça eleitoral, e o que é do povo ninguém tasca. Tapetão nunca mais!

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Receita do fracasso, na estratégia tucana


Sempre digo que, em campanha eleitoral, “quem está na frente não olha pra trás”. Quero dizer com isso que bater nos adversários não interessa a quem está liderando a disputa. É exatamente essa a fórmula administrada em toda a campanha de Dilma. A ela não interessa trazer para primeiro plano quem está perdendo, só interessa divulgar que é a candidata de Lula, divulgar as conquistas desse governo e garantir que vai dar continuidade a essa proposta vencedora. Até aqui mostrou-se um santo remédio para fortalecer os índices das pesquisas.
Para quem está correndo atrás, existem várias fórmulas para avançar na corrida eleitoral, mas nenhuma necessariamente milagreira. Se você está em terceiro e pretende ter saúde para chegar a um segundo turno, por exemplo, tem que considerar que, em princípio, seu principal adversário é o que está em segundo. Pode então ignorá-lo e procurar mostrar-se como maior adversário do líder ou pode partir para uma disputa direta com (e pelo) segundo lugar. Marina até agora não sabe o que fazer da vida. Talvez não tenha mesmo nada a fazer.
Para um segundo lugar como o do Serra, que enfrenta Dilma e a sombra do Lula, a sutileza deve ser maior. Ele tem que bater, sem parecer que está fazendo isso. Aparentemente era sua tática inicial, que foi atropelada pelos números da pesquisa. Ele esperava que desse certo em doses homeopáticas, mas os índices negativos fizeram um estrago muito grande e a capacidade de reação complicou-se. Partiu em busca de outros remédios, buscou ajuda charlatã e acabou errando inteiramente na dosagem. No afã de cura milagrosa para sua campanha, deixou transparecer claramente sinais de desespero. O tom raivoso começou a aflorar – e esse é o pior dos sintomas de uma campanha moribunda. Essa história de acusa pra lá e pra cá, sem provas contundentes, não serve pra nada, é apenas um placebo para iludir (e motivar) seus próprios eleitores. O que a campanha Serra fez de bom até agora foi mostrar suas realizações como Governador e algumas desconstruções da campanha Dilma. Isso pode lhe garantir um sopro de vida em São Paulo e outros nichos bem menores do Sul-maravilha, mas dificilmente poderá tirá-lo do estado terminal em que se encontra.
Quem diria que um ex-Ministro da Saúde, querendo vitaminar sua campanha, acabaria se atrapalhando com o uso da Receita...